Um artigo científico escrito por pesquisadores do Observatório Covid-19 BR, com participação de cientistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Federal do ABC (UFABC) e USP faz uma análise estatística apurada para dimensionar, em números, o papel fundamental da vacinação em massa contra a covid-19 e a eficácia desta estratégia sanitária implementada em meio a muita desinformação e hesitação ao longo da crise sanitária instalada no Brasil.
A análise feita no trabalho indica que, em estimativas consideradas conservadoras pelos autores, as vacinas contra a doença causada pelo sars-cov-2 salvaram de 54 mil a 63 mil vidas de idosos com 60 anos ou mais de janeiro a agosto de 2021. Neste mesmo período, a imunização também evitou de 158 mil a 178 mil internações de idosos nos hospitais brasileiros. O artigo Estimating the impact of implementation and timing of the COVID-19 vaccination programme in Brazil: a counterfactual analysis, disponível online a partir de 21 de novembro, é um dos destaques da edição do prestigioso periódico The Lancet Regional Health Americas, da Elsevier.
Para chegar a estes números, os pesquisadores se concentraram nos primeiros meses em que as vacinas começaram a ser aplicadas no País e nas faixas etárias dos idosos, os primeiros a completarem o esquema vacinal pelo calendário do programa de imunização. Ao traçarem a curva de mortes e hospitalizações por covid-19 na população brasileira, sobrepondo-a à curva similar nos grupos de idosos que estavam sendo imunizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em 2021, ficou evidente a correlação positiva entre vacinação e prevenção de mortes e casos graves: quanto mais crescia a cobertura vacinal nos idosos, mais se reduzia o impacto da covid-19 nesses grupos com 60 anos ou mais.
Casos de morte e de hospitalização de idosos por covid-19 entre janeiro e setembro de 2021 seriam maiores sem a imunização - Foto: Assessoria de Comunicação e Imprensa da Unesp
Com o modelo de análise contrafactual construído, assumindo que a imunização está diretamente relacionada à queda de casos graves e mortes e que a exposição à infecção pelo sars-cov-2 era a mesma para todas as faixas etárias ao longo do período analisado, foram construídos cenários distintos de forma a compará-los com um suposto cenário de ausência total de imunização. Daí foi possível observar uma redução de aproximadamente 35% nas internações hospitalares de idosos de janeiro a agosto de 2021. Tomando-se por base que cada pessoa hospitalizada teve, durante a pandemia, um custo médio no Brasil de US$ 12 mil, evitar de 158 mil a 178 mil internações representou uma economia estimada em uma faixa de valores de US$ 1,9 bilhão a US$ 2,1 bilhões ao sistema de saúde, impacto comparado pelos pesquisadores no artigo aos US$ 2,2 bilhões investidos em imunizantes pelo País no período analisado, até agosto de 2021.
“Nosso modelo parte do princípio de que o comportamento da epidemia, nas diversas faixas etárias, é o mesmo. Não no sentido que eles tenham o mesmo número de casos, mas que eles têm o mesmo comportamento de subida e descida, mais ou menos no mesmo momento. Se a gente pega uma faixa etária que não está recebendo a vacina naquele momento e compara com uma faixa etária que está recebendo a vacina, há diferença neste comportamento. O número de casos graves em idosos começou a descer, enquanto o número de hospitalizações em pessoas mais jovens continuava a subir. Este comportamento é devido à vacinação naquela população. Esta é a variável explicativa para a diferença entre essas duas faixas etárias”, diz o pesquisador Leonardo Souto Ferreira, primeiro autor do artigo e pesquisador do Instituto de Física Teórica (IFT) da Unesp. “O fato de as vacinas terem feito diferença é algo incontestável.”