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O Povo online (CE)

Vacina contra a doença de Chagas é testada com sucesso em camundongos (1 notícias)

Publicado em 15 de fevereiro de 2015

Uma vacina brasileira capaz de estimular o sistema imunológico a combater o Trypanosoma cruzi – parasita causador da doença de Chagas – foi testada com sucesso de forma terapêutica em experimentos com camundongos. De acordo com os resultados publicados na revista PLoS Pathogens, no fim de janeiro, o imunizante aumentou de zero para 80% a sobrevivência de animais infectados e ainda diminuiu a carga parasitária e reduziu sintomas como arritmias cardíacas.

Os estudos para o desenvolvimento da vacina vêm sendo coordenados há 20 anos por Maurício Martins Rodrigues, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em diversos projetos de pesquisa.

O novo estudo é resultado de uma parceria com diversas instituições, por meio do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas, envolvendo o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), o Centro de Pesquisa René Rachou (CPqRR/Fiocruz), a Universidade Federal Fluminense (UFF), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a Unifesp e a Universidade de Massachusetts Medical School, nos Estados Unidos.

“Mais de 10 milhões de indivíduos na América Latina convivem com a doença de Chagas já na fase crônica e o tratamento convencional muitas vezes não funciona. A vacinação terapêutica levaria à redução dos sintomas, queda da mortalidade e melhora da qualidade de vida dos doentes”, disse Rodrigues.

Entre as principais complicações crônicas da doença de Chagas estão o alargamento dos ventrículos do coração (condição que afeta cerca de 30% dos pacientes e costuma levar à insuficiência cardíaca) e a dilatação do esôfago ou o alargamento do cólon (que acomete até 10% dos infectados e pode levar à perda dos movimentos peristálticos e à dificuldade de funcionamento dos esfíncteres).

Embora medicamentos como o benzonidazol tenham eficácia razoável contra o parasita na fase aguda da infecção, eles apenas conseguem retardar o progresso da enfermidade quando esta evolui para a fase crônica, o que acontece em 30% dos casos.

Na ausência de um tratamento específico, os médicos recorrem a medicamentos usados para combater outras doenças do coração ou do sistema digestivo, capazes apenas de atenuar os sintomas.

Aplicação da vacina

A vacina desenvolvida na Unifesp também poderá ser usada para promover uma imunidade profilática contra o T. cruzi, mas, na avaliação de Rodrigues, o impacto para a saúde pública seria maior se ela fosse usada de forma terapêutica.

“Para usá-la profilaticamente seria preciso imunizar milhares de pessoas, e os países que ainda possuem altas taxas de transmissão do parasita, como a Bolívia, a Venezuela e o Peru, não têm recursos para esse tipo de campanha”, disse.

O Brasil possui a logística necessária para a imunização em massa. A transmissão do T. cruzi no país, entretanto, foi praticamente eliminada, ocorrendo apenas em casos isolados e geralmente por ingestão de alimentos contaminados pelas fezes do barbeiro.

“Mas ainda há por aqui muitos pacientes sofrendo com as complicações da fase crônica. Tratar apenas as pessoas já infectadas é economicamente mais viável e factível no médio e longo prazo”, disse Rodrigues.

O mecanismo de ação do imunizante promove a indução de linfócitos T do tipo CD8 contra dois antígenos do parasita: uma proteína (rAdASP2) da superfície do amastigoto (parasita em seu estágio intracelular) e a enzima trans-sialidase, presente na forma tripomastigota (fase extracelular, que circula no sangue). Desta forma, a resposta imune é gerada para as duas formas infectantes do parasita, cobrindo todo o seu ciclo de vida dentro do organismo humano.

“Usamos vírus recombinantes com essas duas proteínas importantes para induzir a imunidade contra o parasita. Uma vez injetados no organismo, os vírus não são capazes de se reproduzir, mas entram nas células e produzem as proteínas dentro delas”, explicou Rodrigues.

(Agência Fapesp)