Protetores respiratórios são muito requisitados por profissionais da saúde durante o enfrentamento do coronavírus
Pesquisadores do Departamento de Física da Universidade de São Paulo (USP), campus de São Carlos, interior de São Paulo, criaram uma câmara de ozônio capaz de eliminar os vírus presentes em máscaras hospitalares. A proposta é utilizar o sistema para desinfetar esses protetores respiratórios muito requisitados por profissionais da saúde durante o enfrentamento do coronavírus. O equipamento, inédito, tem capacidade para esterilizar até 10 mil máscaras a cada duas horas. Após a desinfecção, esses materiais podem ser reutilizados. Atualmente, em razão da escassez, a mesma máscara chega a ser utilizada por até sete dias ou mais, com risco de contaminação. Depois disso, é descartada.
Os pesquisadores chegaram à conclusão de que as máscaras de uso mais comuns nos hospitais, como equipamentos de proteção individual, são as chamadas TNT e PFF, com e sem filtros, inclusive a KN95, uma das mais requisitadas. Esses produtos estão em falta no mercado mundial e a previsão é de que a demanda cresça muito, em função do avanço da pandemia. "A repetição do uso sem esterilizar é um problema que coloca em risco os profissionais da saúde, que neste momento são os que mais devem ser preservados", informou o instituto, por meio da assessoria.
Os pesquisadores concluíram que os métodos convencionais de autoclave não são apropriados, por destruírem a estrutura das máscaras. "O uso do UV (raio ultravioleta) pode não ser o mais indicado neste momento, pois os micro-organismos estão emaranhados na estrutura das malhas ou no filtro da máscara e o UV não penetra nestas regiões. O melhor, no momento, é o uso de ozônio, que é um gás de grande penetrabilidade e eficaz contra o vírus", informou. O ozônio, que é molécula reativa de oxigênio, é conhecido como um dos microbicidas de ação mais rápida contra bactérias e vírus.
Sua ação oxidante destrói principalmente lipídios, proteínas e aminoácidos, sendo também bastante agressivo para material genético. "Especialmente no vírus, o ozônio age oxidando a camada proteica que o protege como um envelope, modificando sua estrutura e destruindo completamente sua funcionalidade. Bactérias e fungos também não resistem ao ozônio", dizem os autores do estudo. O inconveniente desse gás é que ele pode trazer problemas aos brônquios, se respirado em alta concentração.
O produto, no entanto, tem a vantagem de ser amigável ao meio ambiente, já que se transforma em oxigênio 30 minutos depois de ser liberado. A solução encontrada pelo Instituto de Física foi desenvolver uma câmara compacta para fazer a descontaminação das máscaras a seco, sem risco para a estrutura do material. As máscaras são colocadas em um saco de poliéster trançado e colocadas no interior do equipamento. Com a tampa hermeticamente fechada, o material passa por sete ciclos sucessivos de vácuos e atmosfera saturada de ozônio durante duas horas, até a descontaminação total. Em seguida, um sistema de exaustão retira o ozônio da câmara.
O processo é automatizado. O trabalho do operador é apenas de apertar o botão de liga e desliga. A câmara tem capacidade para desinfetar de 800 a 1 mil máscaras por ciclo. Outros equipamentos de proteção, como alguns tipos de luva, também podem ser descontaminados. De acordo com os pesquisadores, quatro ciclos bastam para eliminar os micro-organismos, mas são feitos outros três como garantia adicional. Se o usuário quiser, pode identificar sua máscara com uma etiqueta de fita antes de iniciar o processo.
O instituto da USP estuda a criação de uma central de descontaminação de máscaras em São Carlos para atender hospitais e unidades de saúde da região. Cada unidade faria a entrega e retirada do material, após a descontaminação. "Nada impede que cada hospital possa ter a sua unidade. Aliás, temos de nos preocupar com o novo coronavírus, mas também com outros vírus e bactérias que continuam por aí, causando a pneumonia, por exemplo. Não devemos continuar colocando em risco os profissionais de saúde", diz a nota da USP.
O equipamento passou pelos últimos testes nesta quarta-feira (8). O Centro de Óptica e Fotônica do Instituto de Física de São Carlos, onde aconteceu o desenvolvimento da câmara de ozônio, recebe financiamento de órgãos de fomento à pesquisa, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e o CNPq, e trabalha há mais de dez anos em processo de descontaminação de alimentos, órgãos para transplantes e infecções do trato respiratório.