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Uso do zikavírus contra câncer de próstata pode ter efeitos colaterais (30 notícias)

Publicado em 03 de março de 2023

Em estudos pré-clínicos, o vírus zika se mostrou capaz de inibir a proliferação do câncer de próstata, o que sugere um potencial uso no tratamento da doença. Contudo, uma nova pesquisa feita na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) mostrou que o vírus pode levar a um processo inflamatório persistente em células epiteliais saudáveis, impondo efeitos danosos ao sistema reprodutor masculino.

O trabalho analisou os efeitos do patógeno em dois tipos de células (tumorais e sadias). Os resultados foram divulgados no Journal of Proteome Research.

Os primeiros estudos se deram depois do surto de infecção pelo vírus zika no Brasil, em 2015. Na época, pesquisadores da Unicamp, liderados pelo professor Rodrigo Ramos Catharino, passaram a estudar seus efeitos em diversos tipos de fluidos do corpo, como saliva.

Além disso, também investigaram o potencial das células da próstata como reservatório viral. Em 2019, descobriram que o vírus inativo tem ação direta não só no tratamento de tumores neurais, como o glioblastoma, mas também do câncer de próstata.

Outros estudo já haviam apontado que células da próstata eram favoráveis à replicação do zika. No entanto, era necessário avaliar os mecanismos e as consequências da infecção persistente causada pelo vírus no metabolismo celular.

“Precisávamos realmente saber o quão danosa uma infecção poderia ser”, explica Jeany Delafiori, primeira autora do estudo e atualmente assistente de pesquisa no European Laboratory of Molecular Biology (EMBL), na Alemanha.

Com apoio da FAPESP, o estudo foi o primeiro a utilizar modelos in vitro com células da próstata para analisar os efeitos da infecção pelo zika no metabolismo. Esse aparelho permite que se conheça a estrutura dessas células. Os dados foram analisados em três tempos diferentes de exposição (cinco, dez e 15 dias pós-infecção), por meio de análise estatística.

“Observamos os efeitos nas células PC-3 já nos primeiros cinco dias, corroborando com achados anteriores que indicavam caráter anticâncer”, diz Delafiori , que destaca as alterações lipídicas antiproliferativas. A morte dessas células foi progressiva nos três tempos de exposição.

“Os resultados obtidos confirmam a viabilidade de um possível tratamento do câncer de próstata”, reforça Catharino.

Já nas células PNT1a, a infecção levou a alterações marcantes no metabolismo, especialmente em glicerolipídios, ácidos graxos e acilcarnitinas ao longo da infecção prolongada.

De acordo com os pesquisadores, o tratamento do câncer de próstata com o vírus zika no longo prazo poderia ocasionar o próprio câncer de próstata novamente. E, com a persistência da infecção, as células passariam por ainda mais estresse, o que poderia contribuir para a malignidade.

Estudos adicionais

Com a comprovação da ação do vírus nas células do câncer de próstata, é importante agora realizar estudos adicionais para investigar melhor os efeitos da infecção em células semelhantes. Isso servirá para confirmar as descobertas e analisar mais detalhes de seu metabolismo e replicação.

Conhecer os efeitos possivelmente carcinogênicos do zika nas células saudáveis da próstata, algo que à primeira vista poderia indicar um revés, também foi considerado positivo pelos cientistas.

“Todas essas questões devem ser e foram fundamentalmente levantadas nessa fase de testes para que futuros pacientes que optem por tratamentos desse tipo no futuro possam ter todas as informações necessárias”, diz Catharino.

Julia Moióli da Agência Fapesp com Orbi