Notícia

Gazeta Mercantil

Universidades aprendem com o mercado

Publicado em 27 outubro 1998

Por Daniele Madureira - de São Paulo
A faculdade já não é mais a mesma. O tradicional local de transmissão de conhecimentos ultrapassou o espaço das salas de aula e está se transformando em verdadeiro centro de convivência, com bares, restaurantes e mini-shoppings - tudo para garantir a "fidelização" do aluno (e agregar nova renda às mensalidades). Ao mesmo tempo, as instituições investem pesado em equipamentos, tecnologia e corpo docente, de olho na concorrência, conscientes da realidade de mercado. Nesse processo de expansão e modernização dos campi, devem ser aplicados cerca de R$ 700 milhões só no estado de São Paulo, que atende hoje 491,3 mil alunos, ou 43% dos estudantes da rede privada do País. "Além de aumentar o número de unidades para atender a demanda crescente, a estratégia do ensino superior no momento e agregar novos valores ao currículo", afirma Gabriel Mário Rodrigues, presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior do Estado de São Paulo (Semesp). Entre estes novos valores estão o fortalecimento da relação entre escola e empresas, assegurando a colocação profissional dos alunos, além de fomentar o intercâmbio junto a universidades estrangeiras. Estas, aliás, podem se tornar grandes concorrentes: de acordo com Rodrigues, a globalização já chegou ao mercado brasileiro de ensino superior. "As instituições estrangeiras estão oferecendo cursos aos alunos brasileiros, acompanhados, inclusive, de bolsas de estudo". Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), o número de alunos concluintes do ensino médio em 1996 era de quase 1,2 milhão. No entanto, a quantidade de vagas oferecidas no mesmo ano foi pouco - mais de 630 mil. Para este ano, a estimativa é de que 1,5 milhão de alunos terminem o ano letivo prontos para ingressar no 3o grau. "O governo já não cria mais universidades ou as estadualiza, pois sua prioridade é o ensino médio e fundamental. Não é a rede pública que vai atender a nova demanda", afirma Gilmar Piolla, assessor de imprensa do INEP. As universidades particulares já sabem disso. No que se refere à infra-estrutura, as 213 instituições paulistas da rede privada devem investir juntas R$ 684 milhões até 2002, segundo cálculos do Semesp. A maior parte desse capital destina-se à expansão dos campi. Entre as maiores apostas do mercado está a Universidade Anhembi Morumbi, que até 2001 vai desembolsar cerca de R$ 40 milhões na construção de uma nova unidade no bairro do Brás, zona leste de São Paulo. O investimento é superior à receita da instituição, que fechou o último ano com R$ 35 milhões. O novo campus, que irá ocupar uma área de 60 mil metros quadrados, terá capacidade para atender 12 mil alunos (hoje, 8 mil alunos fazem parte do corpo discente). A área foi escolhida a dedo: a nova unidade terá como carro-chefe cursos ligados a negócios, o forte do Brás. "O bairro é o maior centro comercial da América Latina, concentrando empresas médias do setor de vestuário", afirma Rodrigues, que também é reitor da Anhembi Morumbi. Segundo ele, o futuro campus deverá desenvolver projetos em conjunto com a associação comercial da região, principalmente, no que se refere a estágios profissionalizantes. Além de negócios, as duas outras linhas de pesquisa da futura unidade estarão ligadas à Comunicação e Turismo, áreas responsáveis por boa parte da demanda. Alunos dos dois cursos foram contemplados, ano passado, com estágios na Disney World, oportunidade antes só conferida a alunos de universidades norte-americanas. O grupo que dirige as Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) está apostando firme no aumento da demanda. No próximo ano, deve ser inaugurado um prédio de 11 andares no Real Parque, zona sul de São Paulo, para atender 1,6 mil alunos. Entre os, principais cursos estão Engenharia de Telecomunicações e de Computação, Turismo e Comunicação Social. Com isso, o grupo - que não divulgou o valor do investimento - consolida sua expansão no mercado e agrega nova renda ao seu faturamento anual, que gira em torno de R$ 7 milhões. Outra que está prestes a ampliar sua participação é a Universidade de Mogi das Cruzes. A instituição pretende desembolsar US$ 12 milhões dentro de quatro anos para instalar sua terceira unidade, de 8 mil metros quadrados, na Vila Leopoldina, zona oeste de São Paulo. Antes disso, a universidade teve o cuidado de encomendar uma pesquisa para descobrir as necessidades educacionais da região. O primeiro dos três blocos vai estar pronto no ano que vem, oferecendo cursos de graduação e extensão universitária. O novo campus, que vai consumir o equivalente a 17% da receita da universidade (de US$ 70 milhões) terá capacidade para atender mil alunos por período. Nos últimos dois anos, os investimentos no campus atual - em infra-estrutura, tecnologia, máquinas e equipamentos - chegaram a US$ 1 milhão. Segundo o pró-reitor administrativo Oscar Hipólito, o capital aplicado reflete-se diretamente na qualidade do atendimento. "Há um ano, quando a biblioteca não estava informatizada, o número de consultas era de 20 mil por mês. Hoje somam 80 mil", diz. Os investimentos no hospital universitário, que deve ser concluído ainda este ano, são ainda maiores: cerca de US$ 3 milhões. "Mas a massa cinzenta por trás da infra-estrutura ainda é o investimento mais importante", afirma Hipólito. A universidade investe por ano cerca de US$ 1 milhão em bolsas de mestrado e doutorado para seus 170 professores. "Há um ano, o nível de titulação do corpo docente era de 9%, muito inferior ao verificado hoje, de 35%". O Ministério da Educação e do Desporto (MEC) exige que ao menos um terço dos professores sejam titulados. A Mogi das Cruzes também substituiu 15% do seu corpo docente. "O prestígio dos novos profissionais ajuda a universidade a obter fundos para o financiamento de pesquisas", afirma. Segundo o pró-reitor, só no último ano já foi levantado um capital de US$ 1,3 milhão junto a organizações de fomento e pesquisa. Aplicar recursos na especialização do corpo docente também faz parte da estratégia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Este ano, estão sendo investidos US$ 2 milhões no financiamento de bolsas para mestrado e doutorado, no Brasil e no exterior. Projetos de pesquisa junto à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) devem somar juntos investimentos de US$ 1,5 milhão. No que se refere à infra-estrutura, os recursos estão sendo aplicados nos cursos de medicina (novos equipamentos de R$ 1,1 milhão) e comunicação (reestruturação do laboratório de rádio e TV, no valor de R$ 2 milhões). Mas a PUC pretende concentrar suas forças em um projeto cultural: a reconstrução do teatro Tuca. Para isso, começa na próxima semana a captar recursos junto a iniciativa privada, que devem somar cerca de US$ 10 milhões. Para incrementar a receita da universidade (que este ano deve girar em torno de R$ 100 milhões), a PUC criou a Coordenação Geral de Atendimento à Educação (Cogeae), que oferece cursos de especialização e extensão universitária, além de prestar serviços ao setor empresarial. A receita da Cogeae este ano deve ser de R$ 1,5 milhão. Segundo Antônio Carlos Caruso Ronca, reitor da universidade, o potencial de investimentos este ano pode ficar comprometido devido a um furo de R$ 1 milhão do governo federal no repasse das verbas para o crédito educativo (que atende 1,5 mil alunos). Outra preocupação da universidade é garantir um lugar ao sol aos estudantes depois da conclusão do curso. A PUC/SP mantém convênio com o Centro de Integração Empresa Escola (CIEE), para a colocação de 2 mil alunos, e criou uma assessoria especial para coordenar estágios nas 170 universidades estrangeiras com as quais mantém intercâmbio.