Gostaria de cumprimentar Edgar Morin que se tornou o defensor eloqüente de uma "reforma do pensamento", superando a parcelização dos saberes e integrando os progressos científicos mais recentes no campo da teoria da informação, da cibernética, da teoria dos sistemas, da auto-organização, da incerteza.
O pensamento complexo oferece uma das melhores portas de entrada para o século 21. De permite enfrentar quatro desafios:
- O da complexidade: Einstein dizia com acerto que "Tudo deve ser apresentado tão simplesmente quanto possível. Mas não demasiado simplesmente". Apreender a complexidade é captar os laços íntimos que unem o desenvolvimento e o meio ambiente, a ciência e a ética, o conhecimento e o poder, a educação e a cidadania; é optar pela pluralidade dos enfoques, a interdisciplinaridade, a reciprocidade, o intercâmbio, a tolerância. Com freqüência, os que decidem o fazem mais pela percepção que têm da realidade - ou da imagem desta que lhes é dada - do que pela própria realidade em sua complexidade. "Um conhecimento que isola seu objeto", dizia Morin, "o mutila e o trai. O maior erro é isolar um objeto em relação ao seu ambiente, isolar o indivíduo em relação à sociedade, o crescimento econômico em relação ao seu meio".
- O desafio da irreversibilidade: Irreversibilidade da flecha do tempo, que está no princípio da ciência moderna. Irreversibilidade da ação: amanhã, é sempre demasiado tarde. Antecipar, a fim de melhor prevenir, se tomou pois um imperativo categórico da democracia. Frente à tirania do imediato e da urgência, importa construir uma ética do futuro. Como foi enfatizado pela Conferência Geral da UNESCO de 1997, temos o dever de agir a tempo para permitir a cada ser, a cada criança nascida e por nascer, dominar seu próprio destino e moldar seu próprio futuro.
- O desafio da globalidade: digo, "globalidade", e não "globalização", porque este último termo indica que haveria "globalizadores" e "globalizados". A globalidade é a consciência permanente do mundo em sua totalidade, dessa Terra-Pátria, cara a Morin. A globalidade dos problemas deve nos levar a recusar soluções de curto prazo e de curta visão, a investir na educação e num novo contrato social que pode nos levar ao pleno exercício dessa "solidariedade moral e intelectual da humanidade" que o Ato constitutivo da UNESCO proclama.
- O desafio da incerteza, aquela de que fala o Prêmio Nobel Ilya Prigogine; os novos paradigmas da ciência nos fizeram passar de um mundo finito de certezas a um mundo infinito de questionamento e de dúvidas, o que nos impõe um olhar ético e prospectivo sobre as descobertas científicas. O Congresso Inter-Latino é uma contribuição importante para a Conferência Mundial sobre a Ciência de 1999, da UNESCO.
O interesse da UNESCO pelo Pensamento Complexo a levou a conceder a esse Congresso não apenas sua patronagem, mas também seu apoio intelectual e financeiro. Este apoio se traduzirá também, espero, na criação de uma Cátedra UNESCO itinerante Edgar Morin sobre o pensamento complexo, que permitirá a várias universidades da América Latina prosseguir com o diálogo científico e intelectual inaugurado no Rio.
Federico Mayor é diretor geral da UNESCO
Notícia
Jornal do Brasil