Ricardo Ferreira é professor do Depto. de Química Fundamental da UFPE. Artigo escrito para o 'JC e-mail':
Tudo parece indicar que os indicadores científicos para o país são em geral positivos no atual Governo.
Os investimentos para a Pesquisa devem aumentar, a colaboração dos Governos Estaduais deve subir, e há uma grande atividade na área de Divulgação Científica, conscientizando nosso povo neste sentido, com o cuidado de divulgar sem vulgarizar.
O país, contudo, ainda está longe de ter uma tradição científica de certo porte, uma atitude social que demanda tempo. Esta falta de tradição permeia a interface entre os contribuintes e os cientistas, e aparece de maneiras as mais diversas no imaginário popular.
Uma das melhores faz parte de um episódio narrado por Gilberto Fernandes de Sá, atualmente diretor do MCT em Brasília.
Por volta de 1990 Gilberto desembarcou no Aeroporto de Congonhas e pediu a um motorista de táxi para ir à Fapesp, que tinha se mudado para o Alto da Lapa. O motorista não sabia o que era a Fapesp, nem onde ficava sua sede. Gilberto tentou ajudar:
-É onde os cientistas se reúnem aqui em SP, não ouviu falar?
E o rapaz, meio surpreso:
-Cientista! E o senhor é um cientista?
-Sim, por quê? Perguntou Gilberto com seu sotaque nordestino.
-E tem cientista brasileiro? Uai, para mim só tinha japonês, alemão e americano!
Enquanto isto... há poucos dias nosso ministro da Educação, Cristovam Buarque, que na sua honrada personalidade esconde inquietações de Gravoche, teria comparado a USP, que tem apenas 40.000 estudantes com a UNAM, no México, com seus 120.000. 'Precisamos expandir nossas vagas, acabar com lugares ociosos', afirmou Buarque.
Isto me fez pensar em comentários de Michael Polanyi, grande químico húngaro que se transformou em Filósofo logo após II Guerra Mundial. Filósofo progressista em muitos pontos, mas com um viés auto-centrista europeu.
O comentário de Polanyi fazia justiça à beleza arquitetônica da UNAM, com seus lindos murais e afrescos de Alfaro Siqueiros, José Orozco, Siqueira e outros, e indagava por que seria que o México, com os maiores Muralistas do Mundo Moderno, não tinha ainda uma Ciência de excelência reconhecida.
E eu concordava, lembrando nossa contribuição artística, Oscar Niemeyer, Candido Portinari, Villa Lobos e tantos outros, e, ainda em 1945, quase sem expressão na Ciência.
De uma coisa sempre estive convicto: não seria pela falta de talento nativo que nosso povo não tinha ainda uma grande Ciência. Onde alguns homens pensaram criativamente, como aqueles em torno de Armando de Salles Oliveira, em 1934, e construiu-se algo válido e que crescia em nosso meio.
Os Wataghins, os Occhialinis, os Lévy-Strauss podiam voltar, saudosos, à sua Europa, mas aqui ficavam os Mários, os Lattes e os Marcelos Damy. E, em breve, no RJ, o sonho de Anísio e a determinação de Álvaro Alberto dariam os Josés Leite Lopes, os Costas Ribeiro, a dedicação de um Carlos Chagas Filho. E assim por diante, por este Brasil afora.
E é assim que estamos fazendo, bem-vindo nomes de fora que aqui queiram se fixar, trocando informações sobre técnicas e competências.
Mas também pensando nos interesses do nosso povo, sabendo que somos de longe o maior país tropical do Planeta, incidência de energia solar 8 vezes maior do que o 2º colocado, que a Amazônia é nossa, que o equador distende-se por milhares de quilômetros do nosso território, com a Base de Alcântara no meio.
Tudo para, tendo uma Ciência de Primeira Classe, tenhamos uma Tecnologia que trabalhe pelo nosso Povo. Que façamos esta transformação, de acordo com nossos legítimos interesses, e com o uso da nossa Inteligência e Coração.
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