O uso sistemático da tortura figura na lista das práticas inaceitáveis de uso abusivo da força por parte de agentes públicos ou do poder por parte dos governantes. O livro Tortura na era dos direitos humanos, que será lançado nesta quarta, mostra que esse assunto não saiu das agendas políticas nacional e internacional. A obra organizada por Nancy Cardia e Roberta Astolfi, e publicada pela Edusp com apoio da Fapesp, é resultado do seminário promovido pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV), que reuniu importantes pesquisadores da área, abordando questões conceituais, filosófico-morais e políticas, além de analisar situações históricas demarcadas. O coordenador do NEV, Sergio Adorno, afirma que o que mais surpreende é a atualidade do debate, presente tanto em sociedades com tradição democrática como naquelas em que a transição para o regime democrático persiste como tarefa política a ser completada.
Adorno mostra que os acontecimentos posteriores aa 11 de Setembro, nos Estados Unidos, têm contribuído para relativizar, sob sutis arranjos linguísticos, o que até recentemente não suscitava dúvidas no imaginário político das democracias ocidentais, isto é, a condenação da tortura. “Por outro lado, a globalização do crime, que intensifica o emprego da violência nas relações interpessoais da vida cotidiana, tem favorecido a disseminação de sentimentos de medo e insegurança cuja contrapartida são as demandas, sempre crescentes, por lei e ordem a qualquer custo. Daí o apelo nos mais distintos segmentos sociais para o emprego de tortura como técnica de investigação e de conduta policiais”, afirma.
Com certa preocupação, o coordenador reconhece que a aceitação da tortura ganha cada vez mais consciência pública, mesmo que reações fortes sejam detectadas nos movimentos de defesa dos direitos humanos, em algumas esferas políticas e no mundo acadêmico, e no entanto nesses mesmos espaços também se identificam posições que tentam justificar o emprego moderado da tortura, que tem sido expressa como “tortura light”.
Segundo Jessica Wolfendale, autora do artigo “Tortura Light e a Normalização da Tortura”, os métodos avançados de interrogatório e métodos coercitivos são utilizados para distinguir dois tipos de tortura: a violenta, com mutilação física, cruel e brutal, e a tortura light, que se refere a métodos de interrogatório – como privação do sono por longos períodos, bombardeamento com ruídos, vítimas forçadas a ficar em pé, e manipulação de calor e frio, supostamente menos graves, mais comedidos e menos violentos, do ponto de vista físico, do que a tortura real. O livro Tortura na era dos direitos humanos, organizado (Edusp, 480 págs., R$ 67,00) será lançado nesta quarta, das 18h às 21h30, na Livraria João Alexandre Barbosa, na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (av. Prof. Luciano Gualberto, 78, Cidade Universitária, tel. 3091-4156).