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Tilápia mais forte: seleção genética reduz impacto de doença bacteriana e pode mudar rumos da piscicultura brasileira (25 notícias)

Publicado em 16 de junho de 2025

A franciselose, doença bacteriana que afeta a tilápia-do-nilo (Oreochromis niloticus), vem se consolidando como uma das principais ameaças à piscicultura brasileira, sobretudo durante os meses mais frios. Causada pela bactéria

Francisella orientalis , a enfermidade compromete órgãos vitais como baço, rins e fígado, além de causar lesões nas brânquias dos peixes, podendo levar à morte mais de 60% dos animais em criações comerciais. Mas um avanço científico recente pode transformar esse cenário.

Pesquisadores do Centro de Ciência para o Desenvolvimento em Sanidade na Piscicultura, com apoio da FAPESP, demonstraram que é possível selecionar geneticamente tilápias mais resistentes à franciselose. A pesquisa foi publicada na revista científica Aquaculture e indica que o melhoramento genético pode ser uma estratégia eficaz e sustentável para enfrentar a doença.

O estudo, conduzido pelo Centro de Aquicultura da Unesp de Jaboticabal em parceria com o Instituto de Pesca (IP-APTA), avaliou duas gerações de tilápias em 112 famílias submetidas a desafios bacterianos controlados. Os resultados mostraram que a resistência à F. orientalis tem base genética consistente e herdabilidade moderada, o que permite ganhos rápidos com a seleção dos indivíduos mais resistentes.

“Os dados indicam que os valores genéticos dos animais da geração selecionada foram 80% maiores em termos de sobrevivência, se comparados à média da população inicial”, afirma Baltasar Garcia, pós-doutorando na Unesp e autor principal do artigo.

“Isso é um ganho significativo, principalmente no inverno, quando a franciselose provoca surtos mais agressivos.”

Além da maior resistência, os peixes geneticamente selecionados apresentaram desempenho estável tanto em temperaturas altas quanto baixas — um ponto crítico, já que a doença tende a se intensificar quando a água está abaixo de 24 °C.

Para Diogo Hashimoto, pesquisador do Caunesp e coautor do estudo, os resultados revelam um caminho promissor para a piscicultura nacional.

“Hoje, o controle da franciselose depende quase exclusivamente de antibióticos, que têm eficácia limitada e levantam preocupações ambientais. A seleção genética, por outro lado, oferece uma solução viável, segura e de longo prazo”, defende.

Desde o primeiro surto registrado no Brasil, em 2014, a franciselose se espalhou rapidamente nas criações de tilápia — o peixe mais cultivado no país, que responde por 8,3% da produção mundial segundo a FAO. A infecção atinge principalmente alevinos e juvenis, provocando sintomas como perda de apetite, letargia, acúmulo de líquido abdominal (ascite) e alta mortalidade.

Com o avanço da seleção genética, os pesquisadores pretendem não só consolidar a resistência à franciselose, mas também ampliar o programa para incluir proteção contra outros patógenos, como vírus e bactérias emergentes. A meta é criar linhagens de tilápia com alto desempenho zootécnico e resistência múltipla, facilitando o acesso dos produtores a alevinos certificados.

A iniciativa faz parte de um projeto coordenado pela pesquisadora Maria José Tavares Ranzani de Paiva, do Instituto de Pesca da APTA, que visa oferecer soluções integradas aos desafios sanitários da piscicultura. Além do melhoramento genético, o projeto também investe em ferramentas de diagnóstico rápido e desenvolvimento de vacinas contra diversas doenças de impacto econômico.

“Queremos entregar à cadeia produtiva um pacote tecnológico completo, que promova segurança alimentar, sanidade, qualidade genética e redução do uso de antibióticos”, afirma Paiva. “Esse é o caminho para fortalecer a aquicultura brasileira e garantir competitividade nos mercados nacional e internacional.”