Notícia

Jornal 140

Tilápia: além de comida, uma biotecnologia

Publicado em 17 março 2021

Pele de tilápia-do-nilo é utilizada como tratamento de queimaduras.

Todas as pessoas que já sofreram de queimadura sabem que é doloroso e o quão trabalhoso é cuidar de algo tão sensível quanto uma pele queimada. Queimadura é uma lesão superficial ou profunda na pele, podendo chegar em músculos e ossos, que pode ser provocada pelo excesso de calor ou frio, contato com compostos químicos como ácidos, radiações, eletricidade e fricções. Os graus das queimaduras estão relacionados com a profundidade chega na pele e com as reações como presença ou não de bolhas e perda da sensibilidade à dor.

Para cuidar bem de uma pele queimada é necessário a utilização de cremes, lavar com água e trocar o curativo constantemente sendo um cuidado cansativo, desgastante sem falar na dor quando a pessoa a sente. Hoje esse processo trabalhoso não é mais necessário graças a uma biotecnologia descoberta por cientistas do Ceará – BR. Pesquisadores descobriram que a pele de tilápia-do-nilo (Oreochromis niloticus) é excelente para tratamento de queimaduras. Detalhe importante: é a pele e não as escamas do peixe.

Por que pele de tilápia?

As pesquisas mostram que existe uma grande compatibilidade em relação à estrutura e composição dos tecidos da pele humana com a pele de tilápia e também é um animal com pouca chance de transmitir outras doenças. Além disso, há uma aderência ótima e mantém a umidade nos machucados, ambos processos que ajudam na cicatrização e que impedem a contaminação de microrganismos estranhos.

Como são produzidas?

A pele de tilápia passa por vários processos até ser utilizada no tratamento de queimaduras. Primeiramente a pele do peixe sofre uma higienização, na qual as escamas, os músculos, as toxinas e o cheiro característico do peixe são removidos. Em seguida, a pele é esticada por uma prensa e dividida em vários pedaços, como se fossem pedaços de ataduras flexíveis com uma estampa de escama de peixe. Assim que pronta é armazenada a uma temperatura de 2°C a 4°C com vencimento de dois anos. Hoje desenvolveu-se um método de liofilização da pele do peixe na qual são armazenadas a vácuo não necessitando refrigerá-las, porém possui a mesma validade. Isso tem facilitado o transporte do produto para outras regiões.

Aplicações

Hoje a ciência está usando a pele de tilápia-do-nilo para outras áreas de tratamento medicinal e veterinário. Utilizam-na no procedimento de reconstrução do canal vaginal em pacientes que tiveram uma cirurgia de redesignação sexual e apresentaram complicações.

De acordo com Leonardo Bezerra, do Departamento de Saúde Materno-Infantil da Universidade Federal do Ceará em entrevista para a Revista FAPESP , a alternativa a ser seguida para esse caso tradicionalmente seria um autoenxerto sendo um processo longo e agressivo além de gerar problemas futuros, mas com a pele de tilápia permite que a cirurgia seja mais prática e menos agressiva auxiliando no processo de formação do epitélio vaginal. Usar a pele de tilápia permitiu que a operação fosse menos invasiva, porque a pele fica no canal vaginal e não dentro do corpo da paciente. Portanto, a paciente não sofrerá rejeição do material não necessitando de medicamentos imunossupressores. Outra aplicação foi nos animais silvestres que sofreram com as queimadas no Pantanal e estão em fases de testes a pele como tratamento de úlcera varicosa.