O aplicador segura uma placa com alguns borrões de tinta e pergunta: o que você vê? Poucas técnicas psicológicas penetraram tão fortemente na cultura popular como o teste de Rorschach. “Ao tentarmos organizar uma informação ambígua, sem um significado claro, como manchas, projetamos aspectos da personalidade”, esclarece a psicóloga brasileira Maria Abigail de Souza, coordenadora de um estudo recente que normatizou o teste no estado de São Paulo.
De acordo com a psicóloga, a ferramenta é uma das mais utilizadas entre profissionais de diversas abordagens terapêuticas, tanto na clínica como na pesquisa, por causa de sua precisão diagnóstica.
No entanto, quase um século depois de ter sido desenvolvido pelo psiquiatra suíço Hermann Rorschach (1884-1922), ainda não havia no Brasil normas para o psicodiagnóstico de adolescentes. Atendendo a uma resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP), que determina a adequação de testes estrangeiros com amostras brasileiras, Maria Abigail e sua equipe, do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP), decidiram estabelecer parâmetros e referências para avaliação psicológica e atendimento clínico dessa população.
Com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), os pesquisadores aplicaram o Rorschach em 108 adolescentes paulistas, entre 12 e 17 anos, e classificaram as respostas com a ajuda de um banco de dados digital. Depois, o psicólogo especialista em métodos quantitativos Vinícius Frayze David, do IP-USP, utilizou um programa chamado IBM SPSS para gerar estatísticas descritivas da amostra e avaliar diferenças em relação ao sexo, à faixa etária dos adolescentes e ao nível educacional dos pais.
“Foi um trabalho minucioso de cotação de formas e de estabelecimento de valores normativos dos dados, que serão úteis não só para o conhecimento da dinâmica psicológica do indivíduo, mas também para o avanço no psicodiagnóstico clínico, com o objetivo de melhor orientar o encaminhamento e o tratamento”, diz Maria Abigail.
A pesquisa “Dados normativos brasileiros do Rorschach na adolescência: atlas e dicionário” forneceu parâmetros para que profissionais adotem a técnica. Validado pelo CFP, o trabalho dará origem ao livro O método de Rorschach em adolescentes brasileiros: atlas e dicionário, que guarda as respostas mais frequentes e a localização dos pontos observados nas manchas.
“O teste está bastante presente no imaginário popular, mas, muitas vezes, de forma equivocada, como se o diagnóstico fosse feito de forma meramente subjetiva. De fato, o psicólogo avalia a percepção do indivíduo considerando uma infinidade de fatores, por exemplo, se a mancha foi vista como um todo ou em partes, a que aspectos foi dada maior importância (forma, cor ou impressão de movimento), a natureza do conteúdo descrito (humano, animal, vegetal ou inanimada) e a originalidade ou banalidade da resposta – ou seja, se o que notou é comum ou raro na população”, explica. Com base nisso, o profissional procura obter um quadro amplo da dinâmica psicológica da pessoa, considerando a forma de perceber o estímulo, a atenção, o julgamento crítico, o conteúdo verbal, o simbolismo e a linguagem utilizada.
Com informações da Agência Fapesp
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