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Terapia com células-tronco da placenta reduz progressão da fibrose hepática (1 notícias)

Publicado em 16 de janeiro de 2013

Uma terapia à base de células-tronco da placenta humana reduziu em 50% o desenvolvimento de fibrose hepática em experimento feito com ratos.

Os pesquisadores acreditam que o benefício se deve a substâncias produzidas pelas células da membrana amniótica – parte interna da placenta – capazes de estimular a regeneração do fígado. O próximo passo é identificar e isolar essas moléculas, o que abriria caminho para o desenvolvimento de novos medicamentos.

A fibrose hepática é uma doença resultante de agressões sucessivas ao fígado, como aquelas causadas pelo consumo excessivo de álcool ou por hepatites virais, explicou Luciana Barros Sant’Anna, pesquisadora da Universidade do Vale do Paraíba (Univap), onde a investigação está sendo conduzida com apoio da FAPESP.

“Embora as células do fígado tenham enorme capacidade de se proliferar e de regenerar o órgão, elas acabam morrendo depois de inflamações recorrentes e são substituídas por colágeno”, explicou a pesquisadora.

A cirrose é o estágio terminal da doença e o único tratamento disponível nesse caso é o transplante de fígado. Mas essa opção não é viável para muitos pacientes e, por esse motivo, pesquisadores de todo o mundo buscam meios de impedir o agravamento do problema.

A metodologia desenvolvida pelo grupo da Univap, em parceria com o Centro di Ricerca E.Menni (CREM), na Itália, consiste em envolver o fígado dos ratos com a membrana amniótica humana ainda fresca, ou seja, menos de 48 horas após a coleta no hospital.

“Essa membrana faz parte da placenta e é a responsável pela produção do líquido amniótico durante a gestação. Normalmente, todo esse tecido é descartado após o parto”, disse Sant’Anna.

Após a assinatura de um termo de consentimento pelas gestantes, a membrana – que tem aproximadamente 20 por 30 centímetros de tamanho e entre 2 e 3 milímetros de espessura – foi coletada, destacada da placenta e levada para o laboratório, onde passou por lavagem com uma solução de antibióticos e antifúngicos.

Em seguida, o tecido foi fragmentado em pedaços de 6 por 9 centímetros, tamanho suficiente para envolver completamente o fígado de um rato.

Para induzir o surgimento de fibrose nos animais, os cientistas amarraram em dois pontos o ducto biliar, canal que liga o fígado ao duodeno e serve para o transporte de bile.

“Em muitos casos, a fibrose é causada pelo estreitamento do ducto biliar, que pode ser resultado de um problema congênito ou de um cálculo. Como a bile não consegue passar, a pressão no fígado aumenta e o órgão fica inflamado. O modelo animal usado no experimento simula essa situação”, explicou Sant’Anna.

Quinze dias após a ligadura do ducto, os animais começaram a desenvolver a fibrose. Aos 28 dias, já apresentavam a doença em estágio avançado.

O experimento foi feito com um grupo de 40 ratos. Metade recebeu a membrana logo após a sutura do ducto biliar. Na outra metade, os cientistas apenas simularam a colocação do tecido, para que todas as cobaias fossem submetidas ao estresse da cirurgia.

“A membrana tem uma flexibilidade muito boa e adere facilmente ao fígado. A fixação foi auxiliada por uma cola específica”, disse a pesquisadora.

Após quatro semanas, metade dos animais de cada grupo foi sacrificada e teve o fígado retirado para análise. Na sexta semana após a colocação da membrana, a outra metade teve o órgão removido.

Redução de danos

Os animais que receberam a membrana apresentaram 50% menos fibrose do que os membros do outro grupo. Ao comparar os animais em períodos diferentes, de quatro e de seis semanas, os cientistas verificaram que a terapia não impediu o surgimento da doença, mas reduziu a severidade e inibiu a progressão para o estágio de cirrose.

As análises foram feitas com auxílio de Nilson Sant’ Anna, chefe do Laboratório de Computação Aplicada do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A quantificação da fibrose foi realizada por meio de um sistema digital de imagem que permitiu identificar, isolar e medir precisamente as áreas do fígado ocupadas pelo excesso de colágeno.

“Este sistema de análise quantitativa de imagem opera de maneira automática e possibilitou a análise rápida e simultânea da fibrose em 1.800 imagens histológicas”, explicou Nilson.

Os resultados foram premiados no 3º Tissue Engineeringand Regenerative Medicine World Congress, realizado na Áustria em 2012. Também foram publicados em artigo na revista Cell Transplantation.

“Alguns grupos de pesquisa já isolaram as células-tronco da membrana amniótica e estão trabalhando com elas separadamente. Optamos por usar a membrana amniótica fresca por ser um processo rápido e menos custoso, além de preservar as células em seu habitat, isto é, na matriz extracelular”, disse Sant’Anna.

O objetivo do grupo agora, de acordo com a pesquisadora, é descobrir exatamente quais são as substâncias produzidas pelas células da membrana amniótica e como elas atuam.

“Teremos de isolar as células-tronco e colocá-las em um meio de cultura para depois analisar, por técnicas de biologia molecular, quais moléculas elas estão produzindo. No futuro, isso poderia ser sintetizado em laboratório e virar um medicamento”, disse.

Antes disso, porém, os pesquisadores estão conduzindo um novo experimento com ratos no qual a membrana é aplicada no fígado duas semanas após a ligadura do ducto biliar, quando o processo de fibrose já teve início.

“A ideia é simular uma situação mais parecida com a que acontece com os humanos. Geralmente, quando a doença é diagnosticada, boa parte do órgão já está comprometida”, contou.

O grupo não descarta a possibilidade de fazer o experimento também em humanos. Nesse caso, porém, ainda não poderia ser usada a membrana fresca por causa do risco de infecções.

“Nós apenas coletamos a placenta de mulheres cujos exames sorológicos sejam negativos para doenças como sífilis, HIV, toxoplasmose e hepatite. Mas a gestante pode estar em uma janela imunológica no momento do parto”, afirmou.

Para evitar riscos, a membrana tem de ser congelada a menos 70 graus Celsius após a desinfecção, e a gestante deve ser submetida a novos exames seis meses após o parto. O congelamento, no entanto, parece reduzir em cerca de 40% a viabilidade das células-tronco.

A grande vantagem do método, afirmou a pesquisadora, é que a placenta é uma fonte de células-tronco segura e de fácil acesso. Como elas produzem substâncias imunomoduladoras, que originalmente têm a função de evitar que o bebê seja rejeitado pelo organismo materno, não há risco de causarem rejeição nos receptores, sejam eles humanos ou de outras espécies.

“Além disso, não existem complicações legais, éticas ou religiosas para a coleta e uso dessas células em pesquisas, uma vez que não são células embrionárias e sua obtenção não requer procedimentos invasivos”, acrescentou Sant’Anna.

Fonte: Agência Fapesp