Dezenas de soluções criativas e baratas para os problemas da escassez e da baixa qualidade da água estão escondidas em universidades e centros de pesquisa brasileiros, à espera de que prefeituras e empresários as descubram. Algumas já alcançam certa repercussão, como os coletores de esgoto condominiais, adotados pelo governo do Distrito Federal, 40% mais econômicos que os tradicionais. Outras, como um sistema de purificação de água a preços módicos, que está sendo concluído pela Fundação Instituto Tecnológico do Estado de Pernambuco (ITEP), ainda aguardam comunidades dispostas a testá-los.
Hoje, o máximo que um grupo isolado, sem acesso à água encanada, pode fazer é tratá-la com cloro ou fervê-la. O que propõem os pesquisadores do Laboratório de Óptica Aplicada do ITEP, instituição ligada ao governo pernambucano, é o emprego de uma lâmpada que emite raios ultravioleta que quebram o material genético de bactérias e vírus, impedindo sua proliferação. Além de não mudar nem o gosto, nem o cheiro da água, o sistema consome 20.000 vezes menos energia do que se ela fosse fervida.
Em linhas gerais, ocorre o seguinte: a água retirada de um poço ou córrego é canalizada para dentro de uma caixa fechada, onde é submetida às emissões por um minuto, antes de sair do compartimento e ser recolhida pelo usuário.
Na verdade, já existem purificadores similares no mercado brasileiro, mas eles são usados exclusivamente por indústrias, dado seu alto custo. Hoje, pode-se comprar um sistema de purificação por raios ultravioleta com capacidade para 1.500 litros por hora por R$ 2.500 reais. Ao simplificar os sensores utilizados e dar um acabamento com materiais mais em conta, o ITEP já conseguiu produzir um modelo pela metade do preço com uma lâmpada de 40 watts e capacidade para 1.000 litros/hora. A meta agora é chegar a um valor de R$ 500 e de acoplar ao sistema um coletor solar, que eliminará os gastos com energia. "O custo de desinfecção é inferior a R$ 0,02 por hora de uso", explica o pesquisador Antônio Sales, da equipe que desenvolveu o projeto.
A constatação de que uma ótima tecnologia não basta, se não for barata e bem adaptada às necessidades específicas do usuário, também motivou os cientistas do Instituto de Pesquisas sobre Hidráulica (IPH), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Eles encontraram uma forma mais eficiente de descontaminar os efluentes de curtumes, compostos por produtos químicos misturados a um volume de carga orgânica abundante. Na Grande Porto Alegre, onde se concentram mais de 200 curtumes, eles são responsáveis por 40% da carga poluente industrial despejada nos rios.
"Os gastos com o tratamento de efluentes correspondem a 5% do preço final do couro curtido, mas queremos baixar esta porcentagem para 2% ou 3%", explica o engenheiro Luiz Olinto Monteggia, coordenador de uma série de pesquisas sobre o tratamento de efluentes de curtumes no IPH.
A maioria dos curtumes brasileiros usa uma tecnologia de tratamento em duas etapas, que consome muita energia. Na primeira, reagentes químicos são adicionados aos efluentes recém-saídos do curtimento, para a recuperação de cerca de 80% dos sulfetos (gases tóxicos) e sais de cromo (metais pesados), que são reintegrados ao processo industrial. O que não é extraído acaba misturado à carga orgânica, inibindo a ação das bactérias aeróbias e derrubando a eficácia da segunda etapa do processo. Vale dizer que estas bactérias exigem o bombeamento constante de oxigênio - o que custa caro.
A alternativa mais barata para o tratamento de efluentes orgânicos é a anaeróbica - que dispensa o bombeamento de oxigênio e é de fácil manutenção. O problema é que ela foi desenvolvida na Europa, na década passada, com a finalidade específica de atender às indústrias de refrigerantes e de açúcar de beterraba. É imperfeita, portanto, para outros tipos de indústrias, com maior nível de contaminação.
O, que os pesquisadores do IPH propõem é a instalação de reatores anaeróbicos conectados em série, de modo que o efluente seja depurado por etapas. Enquanto as bactérias consomem a matéria orgânica, promovem a conversão de sulfato em sulfeto que, na forma de gás, pode ser separado. O ambiente também é propício à precipitação dos sais de cromo. Por fim, o efluente depurado passa por uma etapa aeróbia, mas rápida, só para completar o serviço.
Em média, os processos habituais têm um custo de R$ 1 por metro cúbico tratado, para a fase físico-química, e entre 20 e 30 centavos por metro quadrado de couro, na fase biológica aeróbia. Monteggia estima que a nova, tecnologia, que começa a ser testada em curtumes da Grande Porto Alegre, poderá reduzir o primeiro custo para 20 centavos. A segunda etapa também teria uma pequena economia, ainda não contabilizada. "Muitos curtumes que contatamos aprovaram esta técnica mas só deverão adotá-la em suas novas fábricas ou na expansão da atual, dados os custos de substituição", explica Monteggia.
Notícia
Gazeta Mercantil