O discurso de Lula tem sido, sistematicamente, o da negociação, de juntar todas as partes em torno de problemas e resolver conjuntamente
Luís Nassif é colunista da área de economia da 'Folha de SP', onde este texto foi publicado:
Em diversos pontos da administração, essa prática não funcionará, por exigir decisões rápidas e que jamais serão consensuais - por afetar interesses diversos.
Se existe uma área em que esse modelo poderá ser plenamente eficaz, é na articulação das políticas de desenvolvimento. No plano financeiro, estarão envolvidas instituições públicas, multilaterais e a própria banca privada.
No plano científico-tecnológico, a estrutura dos institutos de pesquisa públicos, privados e militares, Universidades privadas e públicas e institutos de financiamento federais, estaduais e internacionais. No campo da mobilização, entidades empresariais e sindicais, sistema Sebrae, governos estaduais e municipais.
Especialmente as áreas de C&T, Ministério do Desenvolvimento e BNDES dependem de dirigentes que sejam, acima de tudo, bons negociadores e articuladores.
No entanto os porta-vozes do PT para o setor, até agora, são mais conhecidos pelo pensamento corporativista e autoritário do que pela capacidade de negociar e articular ações horizontalmente.
A idéia de criar grandes institutos de pesquisa, centralizados, ou de tentar dirigir essas políticas de forma autocrática será desastrosa. Assim como será arriscado ceder ao corporativismo do meio acadêmico e passar às corporações o controle sobre as verbas de desenvolvimento tecnológico.
No seminário 'Defesa Nacional e Política Industrial', ocorrido nesta semana em SP, com a presença de representantes da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de SP), de institutos de pesquisas militares e de empresas privadas que investem em tecnologia e inovação, houve ampla unanimidade em torno dos modernos paradigmas de políticas de estímulo à inovação e ao desenvolvimento.
O primeiro deles é sobre a importância dos trabalhos de articulação entre os diversos institutos existentes. Tome-se o caso do aparato tecnológico militar.
A Marinha dispõe do Centro de Análise dos Sistemas Navais, o Centro Tecnológico da Marinha, o Instituto de Pesquisas da Marinha e o Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira.
O Exército tem o Centro Tecnológico do Exército, o Instituto Militar de Engenharia e o Centro de Avaliação do Exército.
A Aeronáutica conta com o Centro Tecnológico Aeroespacial, os Centros de Lançamento de Alcântara, Barreira do Inferno e o Campo de Provas Brigadeiro Velloso.
Em geral, seus técnicos são formados nos próprios institutos. Não há razão para tanto. Podem ser estabelecidos convênios que permitam a eles receber formação convencional nas Universidades, assim como selecionar pesquisadores da Universidade para receber formação específica nos institutos militares.
Há poucos casos, porém bastante interessantes, de articulação entre a Força, a Universidade e o setor privado. É o caso da experiência do Centro Tecnológico da Marinha no desenvolvimento do sistema de enriquecimento de urânio e de construção do submarino nuclear brasileiro.
A Marinha instalou-se no campus da USP, contratou pesquisadores da Universidade, ajudou no desenvolvimento de fornecedores privados.
O segundo paradigma é que só está habilitado a fazer inovação quem atua na ponta, com o cliente. A Embrapa é citada, com justiça, como grande geradora de inovação. Mas consegue isso pelo fato de seus centros de pesquisa estarem espalhados pelo país, atuando diretamente com os clientes, atendendo às suas demandas, e não sendo controlado por dois ou três iluminados.
Um dos erros do modelo atual de fundos setoriais é pretender que o processo seja conduzido pelo pesquisador. A Universidade tem vocação clara e fundamental na formação de pessoas e na organização do conhecimento.
Mas é lentíssima para responder às demandas do mercado e cumprir prazos e está longe de trabalhar com indicadores de produtividade e de desempenho. Essa será uma das áreas-chave para o sucesso ou não do governo Lula. (E-mail: LNassif@uol.com.br)
(Folha de SP, 5/12)
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