Em seminário recente sobre a questão tecnológica e a retomada do desenvolvimento, iniciativa da Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico do Ministério da Ciência e Tecnologia, chegou-se a um conjunto importante de conclusões. Considerando, de início, que a economia brasileira passa por profundas transformações estruturais, em grande parte como conseqüência dos processos de estabilização e abertura, têm sido marcantes os aumentos dos níveis de produtividade e a melhoria de qualidade dos nossos produtos industriais. Nesse sentido, a estabilização e, principalmente, a abertura têm sido fatores decisivos na promoção do desenvolvimento tecnológico nas empresas.
Está ocorrendo, sem dúvida, um processo de aumento de gastos privados em pesquisa e desenvolvimento, muito embora não se tenha uma idéia muito clara da extensão e profundidade do mesmo. Na verdade, o "output" tecnológico ainda é muito baixo no Brasil, mesmo quando comparado ao de países de desenvolvimento industrial mais recente. Historicamente, a tradição brasileira tem sido a de investir mais em tecnologia de produção e muito menos em inovações, o que explica a posição desfavorável do Brasil em matéria de patentes. Note-se que está ocorrendo uma mudança profunda no processo de produção e comercialização da tecnologia. Nos anos 90, já não é mais interessante a simples compra de tecnologias disponíveis (em especial as inovadoras) por pacotes, uma vez que se abrem maiores oportunidades para as parcerias e associações visando ao desenvolvimento conjunto. Nesse sentido, a capacitação tecnológica do País é vital para participar desse processo em escala mundial.
Por outro lado, torna-se essencial a explicitação de estratégias de desenvolvimento tecnológico na formulação de políticas industriais. Os movimentos de incorporação de tecnologias externas deverão ser considerados no quadro de globalização e abertura comercial. Mas como implementar as estratégias e políticas públicas? Na medida em que se descentraliza o desenvolvimento, aumentam as oportunidades de descoberta de vocações regionais, as possibilidades de financiamento de longo prazo e a atração de "venture capital". Ainda sofremos, porém, a ausência de um sólido elo financeiro entre os centros de pesquisa e o setor produtivo.
A globalização é decorrência das aproximações dos mercados financeiros e da intensificação dos fluxos de recursos para investimentos diretos ou "offshore", das novas cadeias de produção e das logísticas de abastecimento e escoamento, mas, sobretudo, do desenvolvimento tecnológico, principalmente nas tecnologias de informação. Na verdade, o avanço da ciência e da tecnologia transformou radicalmente o mercado mundial em termos de produção e consumo, uma vez que o desenvolvimento tecnológico vem determinando, as vantagens competitivas no comércio mundial. O diferencial de conhecimento, portanto, é decisivo e nisso o Brasil ainda investe pouco e mal, por uma série de razões: i) o isolamento dos centros de pesquisas; ii) a desarticulação e a inconsistência de objetivos e políticas; iii) o baixo rendimento dos recursos aplicados; iv) a falta de coordenação das fontes de recursos; v) a ausência de uma estratégia abrangente e de um modelo regulador.
Diante da globalização, é preocupante a exportação crescente de básicos e a redução dos semimanufaturados e manufaturados. Nossas exportações representam 6,4% do PIB e as importações, 7,2%, e participamos em apenas 0,91 % das exportações e 0,98% das importações mundiais. Perdemos nas tecnologias de marketing, métodos, produtos e desenho industrial. Num mundo que não é mais o das vantagens comparativas, mas o das vantagens competitivas, corremos o risco de ficar à margem das grandes correntes do comércio internacional. Mesmo considerando a posição destacada que temos na produção agrícola mundial, como exportadores temos pouca expressão. Deficiências nas infra-estruturas e inadequação das políticas públicas dificultam a transformação de vantagens comparativas em vantagens competitivas para os produtos agrícolas. Há necessidade de investimentos maciços em ciência e tecnologia na agricultura e no agribusiness.
Considerando-se o interesse e a disposição do empresariado em investir em ciência e, sobretudo, em tecnologia, deve-se atentar, todavia, para a nossa realidade. A Lei 8.661/93 para todos os setores industriais e agrícolas com abatimento de até 8% do Imposto de Renda líquido devido (quase R$ 2 bilhões de investimentos acumulados) ainda concentra as aplicações no Sudeste e, principalmente, em São Paulo. Favorece, ainda, as grandes empresas, não atingindo as pequenas e médias. E importante, portanto, disseminar o progresso tecnológico, criando novas formas de incentivo e financiamento. É também necessário induzir as empresas multinacionais a fazer parte do seu trabalho de pesquisa e desenvolvimento no Brasil.
Apesar das dificuldades apontadas, houve um grande avanço institucional com a reestruturação do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, comandado diretamente pelo presidente da República. Os objetivos do governo federal tornaram-se mais ambiciosos, pretendendo-se aumentar as aplicações no setor em até 1,8% do PIB, com maior participação privada e aplicações mais seletivas. Projetos como o dos centros de excelência na produção e exportação de software (Softex) com apoio do BNDES e de geração, difusão e utilização do conhecimento, com financiamento da Finep, são importantes na estratégia governamental. Constitui, também, um avanço a mudança de paradigma no III PADCT, em negociação com o Banco Mundial, que dará maior ênfase à tecnologia.
Auspiciosa, também, é a busca de novas formas de gestão e regionalização do esforço de desenvolvimento tecnológico. O modelo do Rio Grande do Sul, por exemplo, implica o gerenciamento e a articulação da política estadual em dezesseis pólos tecnológicos. Por outro lado, a experiência do Sebrae na formação de jovens empresários e a criação de Empresas de Participação Comunitária representam um passo importante para a mudança cultural. O importante daqui para a frente é a ênfase na capacitação da população, a criação de estímulos e incentivos de caráter mais permanente e a ampliação dos mecanismos de financiamento para a ciência e a tecnologia.
Doutor e livre-docente pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-secretário de Transportes do Estado do Rio de Janeiro.
Notícia
Gazeta Mercantil