Um estudo inédito conduzido no campus de Dracena da Universidade Estadual Paulista (Unesp) comprovou que juvenis de tambaqui ( Colossoma macropomum ) utilizam carboidratos como fonte de energia com alta eficiência. O achado permite reduzir o teor de proteína — ingrediente mais caro da ração — sem prejudicar o crescimento dos peixes, barateando a produção e diminuindo a carga de compostos nitrogenados lançados no ambiente. Esta descoberta tem potencial para revolucionar a piscicultura amazônica, onde o tambaqui é líder de mercado.
Por que mexer na fórmula da ração? A alimentação representa mais de 70% dos custos de uma criação de peixes de cultivo intensivo.
O grande vilão da planilha é a proteína, extraída de farelos vegetais ou farinha de peixe, ambos insumos que sofreram altas no mercado.
Substituir parte dessa proteína por carboidratos — encontrados em abundância no milho ou em resíduos de agroindústrias locais — é uma estratégia promissora para equilibrar a conta do produtor.
Coordenado pelo professor Leonardo Susumu Takahashi, da Faculdade de Ciências Agrárias e Tecnológicas (FCAT Unesp), o time partiu de uma pergunta simples: se o tambaqui na natureza come frutos ricos em açúcares, por que não explorar essa facilidade metabólica no cativeiro?
Estudos anteriores do grupo já haviam revelado que a espécie metaboliza bem glicose e frutose, reforçando a hipótese.
Como o experimento foi montado Foram testadas seis dietas isoenergéticas combinando três níveis de proteína digestível (230, 260 e 290 g kg 1 ) e dois níveis de amido (180 e 280 g kg 1 ). Juvenis com 30 g foram alimentados durante 90 dias.
Ao final, pesquisadores mediram ganho de peso, conversão alimentar, indicadores sanguíneos e reserva energética nos tecidos.
Uma mulher segura um peixe pequeno, enquanto um homem observa na água, ambos usando máscaras.
A combinação 260 g kg 1 de proteína e 180 g kg 1 de amido entregou o melhor equilíbrio entre desempenho zootécnico e custo. Os peixes cresceram tanto quanto os alimentados com rações mais protéicas, mas consumindo insumos mais baratos. Além disso, houve queda significativa na excreção de amônia, indicador vital para a sustentabilidade da piscicultura.
Do tanque ao bolso: economia real para o produtor Reduzir a proteína de 290 g kg 1 para 260 g kg 1 pode cortar de 8% a 12% o preço final da tonelada de ração, segundo simulações preliminares do grupo de pesquisa. Em uma propriedade média que consome 50 toneladas ao ano, a economia chega a R$ 60 mil.
Para quem opera margens apertadas — realidade de pequenos piscicultores — o impacto é decisivo.
O chamado efeito poupador de proteína age em duas frentes: direciona a proteína ingerida para o crescimento muscular, e não para a geração de energia, e diminui a liberação de compostos nitrogenados na água.
Resultado: qualidade de água superior, menor mortalidade e menor frequência de trocas de viveiro.
Potencial para usar resíduos amazônicos A maior parte da ração de tambaqui consumida no Norte ainda chega de caminhão do Sul e Centro Oeste, encarecendo o quilo de alimento. A etapa seguinte do projeto é testar subprodutos abundantes na Amazônia, como bagaço de açaí ou resíduos da indústria de polpa. Essa aposta na economia circular pode reduzir ainda mais custos logísticos e emissões de carbono.
O estudo recebeu apoio da FAPESP e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
A equipe também contou com o know how do Centro de Aquicultura da Unesp (Caunesp), referência nacional em piscicultura. Os dados completos estão no artigo publicado no
Journal of Animal Physiology and Animal Nutrition.