Estudar as estruturas do olho humano e desenvolver técnicas para contornar e evitar as chamadas doenças que acometem essa área nobre do corpo humano foi o objetivo da pesquisa Reconstrução da superfície ocular: aspectos básicos, clínicos e cirúrgicos. O estudo foi coordenado pelo professor Rubens Belfort Mattos Júnior, do Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O olho é revestido pela superfície mais especializada do corpo humano. Ela é composta pelos epitélios da córnea, limbo e conjuntiva e necessita da lubrificação do filme lacrimal para manter sua função.
No limbo residem células-tronco que regeneram o epitélio compacto e transparente da córnea. O epitélio, por sua vez, é considerado o tecido mais ricamente inervado do ser humano. Na conjuntiva estão células produtoras de mucina e células do sistema imune, fundamentais para a defesa do olho.
Essa superfície altamente diferenciada e complexa pode ser alvo de diferentes tipos de agressões físicas, químicas e biológicas, que repercutem diretamente na função visual e na qualidade de vida. "A superfície ocular é muito importante em inúmeros aspectos. Procuramos abordar nesse projeto os aspectos básicos, clínicos e cirúrgicos dos problemas que afetam esse tecido", disse Rubens Belfort.
Uma das técnicas desenvolvidas no projeto foi o transplante de membrana amniótica para a reparação da superfície ocular. Esse tecido, que é obtido da placenta, possui propriedades cicatrizantes e anti-inflamatórias, além de ser considerado imunologicamente inerte. Pode ser conservado congelada em meio de cultura por meses, o que facilita sua aplicação terapêutica.
A membrana amniótica se mostrou eficaz no tratamento da superfície ocular no caso de queimaduras, na síndrome de Stevens Johnson (forma grave de eritema bolhoso), no pterígio (espessamento vascularizado da conjuntiva) e na reparação dos afinamentos da córnea.
Aplicação de células-tronco
Outro estudo envolveu a aplicação de células-tronco do limbo na regeneração da superfície da córnea. "Não temos a necessidade de uma célula com pluripotendalidade, o que nos interessa são as funções ligadas ao olho nas quais a aplicação das células-tronco adultas do limbo apresentam bons resultados", explicou Rubens Belfort Ele diz que as células-tronco límbicas podem ser transplantadas de um olho saudável para o outro comprometido em um mesmo paciente ou ainda serem recebidas de outra pessoa.
Outra vertente da pesquisa incluiu o cultivo em laboratório e o transplante das células-tronco do limbo para reparar a superfície ocular danificada. Isso que colocou a equipe da Unifesp em pé de igualdade com os grupos mais avançados nessas pesquisas. "No mundo, poucos países estão no mesmo patamar. Itália, Alemanha, Inglaterra, Japão, Cingapura e índia - e agora o Brasil - são os mais importantes", disse Belfort.
Além do limbo, outras possíveis fontes de células-tronco são células da conjuntiva e dentes de leite. Um trabalho feito em parceria entre pesquisadores da Unifesp e do Instituto Butantan está experimentando células-tronco extraídas da polpa desses dentes também na reconstrução da superfície ocular.
A técnica de aplicação sobre a córnea é similar: o novo tecido cultivado em laboratório é aplicado sobre o olho, seguido de enxerto de membrana amniótica para proteger as células transplantadas.
SAIBA +
O projeto foi apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pela modalidade Projeto Temático.
O trabalho sobre Reconstituição Ocular possibilitou a criação do Laboratório de Biologia Celular em Oftalmologia da Unifesp, especializado no cultivo de células-tronco epiteliais da superfície ocular.
A pesquisa ainda recebeu apoio CNPq e do Instituto de Visão, instituição filantrópica ligada ao Departamento de Oftalmologia da Unifesp.