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Superexploração de águas subterrâneas ameaça fluxo dos rios brasileiros, aponta estudo da USP (83 notícias)

Publicado em 10 de fevereiro de 2025

A superexploração das águas subterrâneas já ameaça o fluxo da maioria dos rios brasileiros. De acordo com um novo estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com colegas americanos, mais da metade dos rios do país está em risco de redução do nível das águas.

A pesquisa, publicada na revista científica “Nature Communications” , analisou quase 18 mil poços em todo o território nacional e descobriu que a maioria deles, 55%, está abaixo das superfícies dos riachos próximos. Isso indica que esses riachos estão provavelmente se infiltrando no subsolo e podem acabar perdendo fluxo.

Segundo os pesquisadores, a exploração excessiva desses riachos causa a percolação do rio para o subsolo, o que compromete o fluxo de água. A percolação é o movimento da água através do solo. À medida que a água se infiltra nas camadas mais profundas da terra, ela atinge a água subterrânea, conhecida também como lençol freático. Para um rio ganhar ou perder água, depende principalmente da diferença entre o seu nível e o do poço mais próximo.

Além de comprometer a vazão dos rios, o que pode afetar a disponibilidade de água para consumo humano, os ecossistemas aquáticos e até a paisagem, o uso excessivo de água subterrânea pode favorecer o afundamento do solo ou até o colapso da superfície.

“Esse cenário já foi observado na Índia e na Califórnia, e o Brasil pode enfrentar problemas semelhantes se não houver planejamento e controle adequados” , alerta Paulo Tarso Sanches de Oliveira, um dos autores do estudo, em entrevista à Agência FAPESP. É uma advertência de que é preciso agir de forma proativa para evitar que esses problemas também ocorram no Brasil.

Áreas Mais Afetadas

O estudo também mapeou as áreas do país que correm mais risco de perder fluxo de água para a reserva subterrânea. Os resultados mostram que a maioria dos “rios perdedores” no país (69%) está localizada em áreas áridas ou com uso agrícola intensivo.

Na bacia do São Francisco, por exemplo, 61% dos rios analisados têm potencial de perda de fluxo de água. Nessa região, a utilização frequente das águas subterrâneas para irrigação pode comprometer a disponibilidade de água nos rios. Já na bacia do rio Verde Grande, um afluente do São Francisco que se estende pelo norte de Minas Gerais e sudoeste da Bahia, a situação é ainda mais preocupante. No local, até 74% dos rios podem ser impactados pela diminuição do fluxo. “Essas duas bacias são cruciais para a agricultura e geração de energia hidrelétrica no Brasil. O que está acontecendo põe em risco não apenas a sustentabilidade local, mas também a segurança hídrica, alimentar e energética em grande escala”, comenta Oliveira.

Os pesquisadores alertam que a perfuração indiscriminada de poços para irrigação agrícola ou consumo privado é um dos fatores de maior impacto nesse cenário. Um estudo brasileiro, publicado em 2021, mostrou que cerca de 88% dos poços no Brasil eram ilegais.

Necessidade de Monitoramento

Para evitar que o prejuízo aos rios se agrave, o estudo destaca a necessidade de integrar a gestão de águas superficiais e subterrâneas. Além disso, é necessário investir no monitoramento hidrológico.

“O Brasil tem potencial para ampliar a irrigação de forma sustentável, mas é necessário planejar melhor o uso integrado das águas subterrâneas e superficiais para evitar impactos negativos” , afirma José Gescilam Uchôa, autor principal do estudo. Se mapeamentos de campo não forem realizados para orientar políticas públicas, a situação pode piorar nos próximos anos. Um planejamento integrado e bem estruturado é essencial para que a expansão da irrigação no Brasil possa ocorrer de forma sustentável, atendendo às necessidades agrícolas sem comprometer a disponibilidade e a qualidade da água a longo prazo.

“O alerta é ainda mais relevante diante das projeções que indicam um aumento superior a 50% nas áreas irrigadas no país nos próximos 20 anos, o que pressionará ainda mais os recursos hídricos superficiais e subterrâneos” , prevê Oliveira.

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