Brasileira Decoy investirá aporte feito pela Fapesp em tecnologias de combate ao besouro cascudinho da granja e ao ácaro Varroa, que ataca colmeias
A startup Decoy, desenvolvedora de soluções biológicas para controle de pragas na área de saúde animal, recebeu aporte de R$ 810 mil da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para investir em tecnologias para os mercados de avicultura e apicultura.
A Decoy irá direcionar R$ 160 mil ao desenvolvimento de uma solução para controle biológico do besouro cascudinho da granja (), que causa prejuízos estruturais e sanitários à avicultura.
Outros R$ 650 mil serão investidos na fase II da pesquisa de um produto biológico contra o ácaro Varroa (Varroa destructor), que parasita colmeias de abelhas da espécie e contribuem para o distúrbio do colapso das colônias e desaparecimento da espécie.
O cascudinho das granjas é uma das principais pragas que acomete a avicultura intensiva no país e no mundo. Dentre os danos causados, destacam-se a perda de peso das aves, transmissão de vírus, fungos e bactérias causadores de doenças como a salmonela e a influenza, e destruição da infraestrutura das granjas.
Atualmente, os meios de controle da praga empregados se baseiam em inseticidas químicos, que têm agravado problemas de resistência, são ineficientes e altamente tóxicos ao ambiente e ao avicultor.
“Hoje, as moléculas químicas utilizadas para tentar controlar o inseto já sofrem problemas de resistência das pragas. A gente está tentando desenvolver um produto alternativo, que cause menos impacto que o produto químico, mais eficaz, limpo e sustentável para controlar essa praga sem causar esses problemas de intoxicação para quem está aplicando e sem deixar resíduos no meio ambiente”, pontua a bióloga e CTO da startup, Tatiana Magalhães.
Além dos problemas patológicos nas aves, os insetos se escondem em buracos na parede, vigas, sistema elétrico, abrindo galerias e prejudicando o sistema estrutural do aviário. Segundo a bióloga, o projeto para o cascudinho está na fase I, com experimentos para a seleção artificial em laboratório dos fungos que serão os agentes de controle.
Solução biológica para as colmeias
Nos últimos anos, a apicultura brasileira vem sendo afetada pelo fenômeno conhecido como Síndrome de Colapso das Colmeias. Além do uso excessivo de pesticidas, mudanças climáticas e doenças, as infestações do ácaro Varroa têm sido apontadas como um dos responsáveis pelo problema.
“Além do Varroa, o método de controle usado no mundo também é um problema, porque os apicultores usam acaricidas químicos, que acabam sendo incorporados na cera, no mel”, explica a bióloga e pesquisadora da Decoy, Larissa Elias.
De acordo com a pesquisadora, nos Estados Unidos, país que mais sofre com essa praga, os apicultores têm um gasto até quatro vezes maior para tratar o ácaro do que com outras pragas. O financiamento da Fapesp está sendo usado na fase II de desenvolvimento do primeiro controle biológico de mundo contra esse ácaro. “Encontramos os agentes (fungos) que são eficazes para o controle do ácaro e agora estamos testando as formas de levar isso”, afirma Larissa.
Os produtos biológicos que estão em desenvolvimento pela Decoy consistem em esporos (unidades reprodutivas dos fungos) ativos, para que, ao serem pulverizados, se desenvolvam e entrem em contato com os alvos (pragas).
“Quando administrado nas colmeias, pulverizando os esporos dos fungos, essas unidades infectivas dos micro-organismos se aderem ao ácaro”, explica. Por isso, a bióloga ressalta a importância da especificidade, que envolve a participação de proteínas específicas responsáveis por essa aderência, permitindo ao fungo penetrar no ácaro e, assim, provocar a sua morte.
Investimentos no controle biológico
Com um crescimento de 1.560% no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período de 2019, a startup, com sede no campus da USP em Ribeirão Preto (SP) já recebeu R$ 1,8 milhão em investimentos privados desde 2015.
Além de sanar os problemas de pragas, o controle biológico tem impactos sociais, ambientais, econômicos e de segurança alimentar. Por isso, as pesquisadoras salientam a importância de estimular soluções em detrimento aos produtos químicos.
"No Brasil, tivemos um aumento de 70% no uso do controle biológico em 2018, com expectativa de crescimento de 20% ao ano. A gente vê esse cenário positivo, mas, ao mesmo tempo, vê o número de moléculas químicas , com alta toxicidade liberadas pelo governo no ano passado, inclusive de uso proibido em outros países. O país ainda é muito permissivo nesse aspecto"
A bióloga destaca que, na União Europeia, por exemplo, o limite máximo permitido para uma molécula química é de 0,2mg/kg de soja. Na Argentina e nos EUA, esse limite é de 5mg/kg, enquanto, no Brasil, é de 10mg/kg. “Ou seja, a gente consome muito produto químico porque as políticas públicas afetam essa permissividade”, salienta.
O problema, segundo a pesquisadora, é que, apesar de o Brasil ser um dos maiores produtores de alimento do mundo – o que justificaria o alto volume de agrotóxicos na produção –, muitas moléculas usadas perderam a sua eficácia em função do desenvolvimento de resistência pelas pragas e fitopatógenos.
Isso faz com que os produtores usem doses cada vez maiores na tentativa de solucionar o problema. “Então, o impacto que a gente vai ter com o uso do controle biológico é justamente tirar esse efeito negativo causado pelos produtos químicos, como a toxicidade às pessoas, ao meio ambiente. Mas, principalmente, diminuir a quantidade de substâncias prejudiciais à nossa saúde no alimento que estamos consumindo”, justifica Tatiana.
A bióloga Larissa Elias acrescenta que uso de agentes de controle biológico foge desse cenário com o uso de inimigos naturais que já estão presentes na natureza.
“A probabilidade que a praga sofra uma mutação e crie um mecanismo para burlar a ação dessa molécula química é alta. No caso de um controle biológico, é uma interação ecológica complexa, que lida com todo o indivíduo, e burlar isso é extremamente improvável. Isso está muito atrelado à segurança alimentar porque garante o uso de muito menos veneno”, argumenta.