A população de animais no Brasil, seja em domicílio ou que vive na rua, ainda é incerta. E a falta de determinação demográfica dos cães e gatos no país dificulta o controle de doenças, sobretudo de zoonoses, aquelas que podem ser transmitidas de animais para pessoas. Somente a raiva e a leishmaniose visceral causam 55 mil mortes e fazem 500 mil casos no mundo. E para mudar esse quadro, um grupo de pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária (FMVZ) da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista, criou um software capaz de estimar quantos cães e gatos vivem nas cidades brasileiras.
Batizado de "CAPM", iniciais em inglês de "Companion Animal Population Management", o nome significa "Manejo Populacional de Cães e Gatos" e foi desenvolvido pelo doutorando Oswaldo Santos Baquero, bolsista da FAPESP. "No meu estudo avalio a validade de um desenho amostral complexo para estimar o tamanho populacional de cães domiciliados em municípios brasileiros. Também elaborei um modelo matemático de dinâmica populacional para simular cenários e definir prioridades de intervenção", explica Baquero.
A partir da modelagem matemática é possível compreender com mais facilidade que o principal efeito esperado da esterilização é o aumento da população infértil e não a diminuição do tamanho de uma população inteira, como exemplifica o estudante. "Modelos matemáticos da transmissão da raiva na China sugerem que a melhor forma de controlar a doença é reduzir a taxa de natalidade canina e aumentar a imunização. Essas duas ações combinadas mostraram-se mais efetivas do que o sacrifício de animais".
"Conhecer a população de rua é essencial. Ela é resultado do abandono de animais", diz o médico veterinário Fernando Ferreira, professor e coordenador do programa de pós-graduação da FMVZ. Apesar de não confirmar um prazo, Ferreira afirma que em breve prefeituras e o Ministério da Saúde terão acesso ao programa. O objetivo é que órgãos públicos empreguem o software, de uso livre, para o controle de doenças.
Além do sistema, Baquero explica que existem outras formas de influenciar de forma positiva na dinâmica populacional dos animais. Algumas delas são prevenção do abandono, adoção e controle reprodutivo. O primeiro passo para utilizar o programa é alimentar o CAPM com dados demográficos da cidade de interesse, obtidos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e definir o número e a localização dos domicílios que serão pesquisados. Depois um questionário será aplicado sobre a quantidade de cães e gatos na residência, o sexo e a idade dos animais, a forma de aquisição e se são ou não castrados. "Os resultados permitem modelar diferentes cenários de dinâmica populacional e definir prioridades de intervenção", explica Ferreira.
O CAPM tem código aberto e pode ser usado gratuitamente para ver detalhes da programação. "O software já foi testado no município paulista de Votorantim e está pronto para uso. Mas ainda existem complexidades que podem resultar numa barreira de acesso para alguns usuários. Estamos trabalhando para aperfeiçoar o programa", conta Baquero.