Notícia

O Imparcial (Presidente Prudente, SP)

Sobre a crise do Euro

Publicado em 10 junho 2011

Tornou-se comum ler que a crise do Euro tem por fundamento a baixa flexibilidade imposta pela união monetária à política econômica dos países-membros. O que significa isso? E por que exatamente isso é um problema?

Suponha-se que dois países com moedas nacionais distintas mantenham entre si relações comerciais a uma taxa de câmbio de equilíbrio, de modo que o saldo comercial dos dois tenda a zero. Se um país produz a custos mais baixos que o outro, então ele só não terá superávit - e, portanto, o outro país só não terá déficit - constante na relação comercial, se sua moeda for mais valorizada que a do outro. É plausível supor, porém, que a produtividade dos dois países não varie na mesma velocidade. Neste caso, sob a mesma taxa de câmbio, um dos países tem constantes déficits em sua balança comercial, isto é, vende ao outro menos do que dele compra. O método mais simples de resolução do problema seria a desvalorização de sua moeda. Há, porém, uma outra saída: o país deficitário poderia vender títulos de dívida ao país superavitário, e o comércio entre eles poderia continuar sem a desvalorização monetária. Só que o remédio tem curta validade: diante do crescente déficit, a taxa de juros cobrada por quem empresta tende a aumentar, o que reduz cada vez mais a capacidade de endividamento do país deficitário. A própria elevação dos juros ajudará a reduzir o déficit; mas, se não houver reversão nos custos de produção dos dois países, a desvalorização será inevitável.

Outro é o caso dentro de uma união monetária. A desvalorização se encontra completamente fora do horizonte: a moeda de um país só pode ser desvalorizada em relação à de outro quando os dois têm moedas distintas. A isso se referem os analistas quando dizem que houve perda de flexibilidade na política monetária dos países europeus. Mas será que isso - e apenas isso - seria capaz de levar membros de uma união monetária aos níveis de endividamento, por exemplo, da Grécia atual? Não poderá a elevação dos juros descrita acima reduzir o déficit através da redução de seu financiamento? Pode ser que sim; mas, definitivamente, não foi o que aconteceu na zona do Euro.

O que se viu ali foi uma situação paradoxal em que a produtividade dos países mais prósperos cresceu mais rapidamente que a dos países do sul (mais a Irlanda), mas os juros pagos pelos dois grupos foram quase os mesmos. Aparentemente, bancos e demais poupadores dos países superavitários acreditaram que, por emitirem dívida na mesma moeda, todos os países da zona do Euro poderiam pagar a mesma taxa de juro; "esqueceram-se", contudo, de que, embora seja integrada monetariamente, a zona do Euro não é integrada do ponto de vista fiscal - o que significa que os países deficitários teriam que cobrir seu déficit com renda exclusivamente nacional, e não europeia. Foi isso, em conjunto com o resgate bancário sem precedentes que os países europeus efetuaram no auge da crise econômica atual, que levou alguns países europeus ao nível de endividamento atual. Endividamento que só poderá ser reduzido a níveis aceitáveis através da reestruturação da dívida (algo que o Banco Central Europeu não parece disposto a aceitar) e da redução de custos produtivos (o que, na impossibilidade da desvalorização, só pode significar desemprego em massa e caos social); ou, claro, do abandono do Euro pelos países endividados, o calote de parte da dívida e a passagem a uma moeda nacional mais desvalorizada.

Bruno Höfig é graduado em Economia e mestrando em História Econômica pela Universidade de São Paulo, bolsista da FAPESP e Consultor Econômico da TOR Investimentos. Contato: bhofig@torinvestimentos.com.br.