O Governo Federal anunciou em 2013 o lançamento de um pacote de R$ 32,9 bilhões para a inovação no País, o Inova Empresa, que terá duração de dois anos. Pelo plano lançado, a gestão dos recursos federais para inovação passa a se dividir em editais por setores: petróleo e gás; etanol; energias renováveis; defesa e aeroespacial; saúde; tecnologia da informação e comunicações. Segundo o especialista Rafael Levy, consultor em inovação pela Allagi e diretor do Wenovate - Open Innovation Center - Brasil, "o Inova Empresa acerta na medida em que se propõe a integrar os mecanismos para simplificar o acesso da empresa à inovação e descentralizar a demanda das pequenas empresas, facilitando a operação da Finep. Porém, ao optar por manter as mesmas estruturas de programas anteriores (crédito, parceria com universidades e subvenção para a contratação de pesquisadores), apenas agrupando-os em chamadas setoriais, acaba não criando mudanças substanciais".
O especialista destaca que o mercado é cada vez mais marcado pela oferta de serviços. Por isso, é necessário também incentivar o desenvolvimento inovador em serviços e em novos modelos de negócios. Porém, os investimentos públicos em inovação têm focado prioritariamente nas atividades de pesquisa nas universidades e no aumento da P&D industrial, ainda que esteja cada vez mais claro a necessidade de ampliar o espectro. "Hoje em dia, já se sabe que algumas das mais importantes inovações não ocorrem pela criação de novos produtos, mas pelo surgimento de modelos de negócios inovadores", exemplifica.
Para entender melhor o cenário e como funcionam os meandros para a conquista de aportes públicos - como saber quais as linhas de crédito disponíveis para as pequenas empresas - a Meu Próprio Negócio conversou com o Rafael Levy. Na entrevista a seguir, ele fala sobre a política pública de incentivo à inovação no Brasil e como o empreendedor deve se preparar para alcançar esses incentivos, entre outros pontos relevantes para quem empreende.
Meu Próprio Negócio - Quais projetos podem ser considerados inovadores e aptos a conseguir verba do governo?
Rafael Levy - Existem vários programas do governo para financiar projetos inovadores, sendo que cada um tem critérios específicos. Porém, normalmente, a maioria voltada apenas à inovação tecnológica, ou seja, precisam envolver desenvolvimento de tecnologia nova no País.
MPN - Apesar de reconhecer que o Brasil hoje concentra sólida produção científica, e que a indústria tem realizado mais pesquisa e desenvolvimento, você questiona os resultados dos programas por eles não contemplarem outras frentes. Quais seriam?
RL - As novas frentes de investimento em inovação seriam justamente as inovações que não reportam necessariamente novas tecnologias, a exemplo de novos modelos de negócios e de serviços. Tipicamente, o governo incentiva a inovação industrial, como pesquisa e criação de novos produtos. Porém, o mercado é cada vez mais marcado pela oferta de serviços. Por isso, é necessário também desenvolver a inovação em serviços e em modelos de negócios. Um viés importante, que deve receber incentivos, é a prática de gestão da inovação, e abertas, feita em parceria e envolvendo empresas e universidades, além da criação de redes de inovação.
MPN - Quais seriam os ganhos dessa nova conduta?
RL - Inovação significa levar novos produtos ou serviços ao mercado. Entretanto, quando é dado um foco muito grande apenas ao desenvolvimento da tecnologia, criam-se novos produtos, mas nem sempre eles chegam ao mercado e impactam a vida das pessoas, importante diversificar o foco dos incentivos justamente para que se possam aproveitar de oportunidades que estão em outros tipos de inovação. Incentivar, por exemplo, o empreendedorismo inovador é importante para a criação de inovação em modelos de negócios. Alguns programas públicos já existem nessa linha, e outros estão sendo criados agora (como o Startup Brasil, na área de TI), mas o Brasil ainda tem muito a percorrer.
MPN - Qual a relevância da inovação nos modelos de negócios?
RL - Em grande parte, as empresas que são cases internacionais de inovação, como o Facebook e o Google, a principal inovação que trouxeram não foi na introdução de uma nova tecnologia no mercado, mas a criação de um modelo de negócios diferente. Se olharmos para a história, nem sempre a empresa que detém a melhor tecnologia é a que obtém maior sucesso nos negócios. Podemos pensar, por exemplo, na origem dos computadores pessoais. Apesar de a Apple ser apontada por muitos como a que possui uma tecnologia superior, foi a Microsoft que conquistou a maior parte dos consumidores, com o Windows, pois encontrou um modelo de atuação que se provou mais viável e interessante para o mercado em determinado período.
MPN - Explique um pouco mais o que seria um modelo de negócio inovador.
RL - O modelo de negócio é a forma através da qual a empresa cria, entrega e captura valor. Ou seja, o modelo de negócio define como a empresa atua e como ganha dinheiro com isso. Por exemplo: o modelo de negócio principal do Google é oferecer o serviço de busca de graça, enquanto cobra das empresas para publicar seus anúncios direcionados no site. Inovar em um modelo de negócio significa não pensar apenas em como fazer um produto melhor para o cliente, mas em reinventar toda a cadeia daquele setor. Outro exemplo é a Amazon.com, que criou um negócio de venda de livros on-line que não precisava das lojas físicas para vender. A empresa Zynga (criadora do Farmville) inovou ao criar jogos sociais gratuitos usando o Facebook, mas ganhando dinheiro vendendo "bens virtuais".
Você pode inovar no modelo de negócio pensando na proposta de valor, no relacionamento com o cliente, nos canais de distribuição, nos segmentos de mercado, na forma de receita, nos recursos ou atividades-chave da empresa, nos parceiros ou na estrutura de custo.
MPN - Como se pode alcançar investimentos para esse tipo de inovação?
RL - O modelo de investimento conhecido como venture capital se provou muito bem sucedido para explorar esse tipo de inovação. Os fundos de investimento de venture capital buscam investir dinheiro, como acionistas de pequenas empresas, esperando (e contribuindo para) um grande crescimento em virtude da tentativa de explorar um novo modelo de negócios (os investidores ganham dinheiro ao vender essas organizações no futuro, e esse é o "modelo de negócio" das empresas de venture capital). Essa é uma excelente forma de explorar inovações radicais.
MPN - Existem modelos de negócios inovadores nas pequenas empresas? Poderia citar algum?
RL - As pequenas empresas têm um excelente ambiente para se explorar novos modelos de negócios, já que possuem grande flexibilidade e capacidade de adaptação. Normalmente, as grandes empresas têm dificuldades para fugir dos modelos padrão, pois isso pode implicar em perdas de receita. Já uma pequena empresa pode se dar a chance de explorar um modelo totalmente novo, não limitada às amarras a que as grandes estão sujeitas. Por exemplo, uma grande empresa de telefonia dificilmente seria a primeira a tentar explorar um serviço de VolP gratuito pela internet, pois isso implicaria em abrir para os consumidores a possibilidade de ter, gratuitamente ou por muito baixo custo, benefícios similares ao serviços pré-existentes e pagos. Representaria a possibilidade de perder muito dinheiro. Já uma pequena empresa, como era o Skype quando foi criado, que tinha nada ou pouco a perder, viabilizou um modelo de negócio baseado justamente nessa lógica e acabou, inclusive, pressionando os players de telefonia já estabelecidos.
MPN - Quais são as verbas públicas existentes destinadas à inovação e acessíveis às pequenas empresas?
RL - Um dos principais programas existentes hoje para empresas do setor de TI é o Startup Brasil, que procura "acelerar" pequenas empresas inovadoras com mentoria, incubação e financiamento público não -reembolsável. Atém disso, existem os fundos de investimento de venture capital do governo, como o Criatec 2, do BNDES, que estão abertos à procura de empresas inovadoras para investir. Para projetos de inovação tecnológica, as pequenas empresas também têm acesso às linhas de subvenção econômica da Finep, através dos editais nacionais ou de programas estaduais como o Pipe, da Fapesp. As novas linhas Tecnova e Inova Cred, da Finep, também oferecem respectivamente recursos não reembolsáveis e reembolsáveis para pequenas empresas, e estão em fase inicial de operação.
VIABILIZE SUA IDEIA INOVADORA
Você tem uma boa ideia de produto ou serviço, mas precisa de dinheiro para viabilizar o negócio? Se a intenção é pleitear uma verba pública, o consultor Rafael Levy afirma que é importante estar atento aos programas existentes e aos editais lançados.
Um bom começo é monitorar de perto os sites da Finep (www.finep.gov.br) e da fundação de apoio à pesquisa do seu estado - em São Paulo é a Fapesp (www.fapesp.br).
Para todos os programas, a empresa deve apresentar uma proposta, que pode ser voltada à pesquisa, em caso de programas dirigidos à inovação tecnológica, ou ao modelo de negócio, no caso de aceleradoras ou de venture capital. Nesses últimos casos, costuma ser importante a empresa ter uni plano de negócios para apresentar.
Cada programa tem um modelo de proposta específico e também requisitos que a empresa deve cumprir para poder participar. Um exemplo seria um valor mínimo ou máximo de faturamento, um tempo mínimo de existência comprovada com registro na junta comercial, entre outras exigências.
LINHAS DE CRÉDITO
Existem diversas linhas de crédito disponíveis no mercado para auxiliar pequenos negócios ligados à inovação - a nascer ou crescer. A Meu Próprio Negócio aponta algumas linhas de crédito do governo que podem ajudar o seu empreendimento inovador a sair do papel. Vale lembrar, porém, que é preciso estar atento à abertura dos editais específicos de cada linha disponível.
CRIATEC: Esse fundo de capital foi criado em 2007 pelo BNDES e outras instituições e é operado por gestores regionais. A segunda edição do programa, o Criatec II, lançada em agosto de 2012, está selecionando gestores e empresas. O único critério para a participação das startups é ter obtido um faturamento líquido anual de, no máximo, R$ 10 milhões no ano anterior ao da seleção.
Em 2013, o programa chega à sua terceira edição e o BNDES reservou ao menos R$ 170 milhões para investir em startups neste ano. O investimento é de longo prazo, podendo durar até 10 anos. Após elevar o valor de mercado, a empresa poderá ser vendida. O valor de negociação é rateado, e o investimento é devolvido ao banco.
Para o Criatec II, o BNDES escolheu os estados de São Paulo, Minas Gerais. Rio de Janeiro e os conjuntos formados por Paraná e/ou Santa Catarina, Amazonas e/ou Pará e Pernambuco e/ou Paraíba. Mais informações: www.fundocriatec.com.br
TECNOVA: É uma iniciativa do Governo Federal, por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e Consórcio Regional. O foco do programa é o apoio à inovação tecnológica e o suporte aos parceiros estaduais. Ele cria condições financeiras favoráveis e apoia a inovação por meio de recursos de subvenção econômica para o crescimento rápido de um conjunto significativo de empresas de micro e pequeno porte nacional. Mais informações: www.finep.gov.br
PIPE: Criado em 1997 pela FAPESP, tem como objetivo apoiar a execução de pesquisa cientifica e/ou tecnológica em pequenas empresas sediadas no Estado de São Paulo. Os projetos de pesquisa selecionados para apoio no PIPE devem ser desenvolvidos por pesquisadores que tenham vínculo empregatício com pequenas empresas ou que estejam associados a elas para sua realização. O programa está com chamada de propostas abertas até 26 de julho de 2013. Mais informações www.fapesp.br/58
INOVACRED: O objetivo do programa é oferecer financiamento a empresas de receita operacional bruta anual de até R$ 90 milhões. O investimento deve ser aplicado no desenvolvimento de novos produtos, processos e serviços, ou no aprimoramento dos já existentes, ou ainda em inovação em marketing ou inovação organizacional visando aumento de competitividade das empresas no âmbito regional ou nacional. Esse apoio é concedido de forma descentralizada, por meio de agentes financeiros, que atuam em seus respectivos estados ou regiões, assumindo o risco das operações. Mais informações: www.finep.gov.br