Durante as quatro horas de exposição e debates na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, ontem de manhã, os ministros Luiz Felipe Lampreia (Relações Exteriores) e Israel Vargas (Ciência e Tecnologia) enfrentaram situações embaraçosas ao defender a inclusão no projeto de lei sobre propriedade industrial de pontos polêmicos, como o "pipeline" (garantia de patente a produtos ainda em fase de testes de laboratório), o prazo de transição de um ano para a entrada em vigor da nova legislação e a proteção à biotecnologia.
O senador Roberto Requião (PMDB-PR), que mais tem criticado a adoção de patentes para produtos farmacêuticos, químicos e da área de biotecnologia, perguntou a Lampreia se o Brasil assinou um acordo com os Estados Unidos comprometendo-se a fazer concessões na área de propriedade intelectual para evitar retaliações. O chanceler negou a existência de um acordo ou protocolo secreto entre os dois países, que teria sido firmado no começo do ano passado, mas admitiu intensa negociação e troca de informações sobre o assunto com o representante de Comércio dos EUA (USTR), Mickey Kantor. "Se eles consideram isso um acordo, o problema é deles", afirmou.
Em sua exposição, quando falou sobre os aspectos internacionais da propriedade intelectual, como o acordo assinado pelo Brasil na Organização Mundial de Comércio (OMC), o relacionamento com o Mercosul e com os Estados Unidos, Lampreia alertou os senadores para a iminência de sanções comerciais contra produtos brasileiros (papel e celulose, aço e suco de laranja) no mercado norte-americano se o Congresso não aprovar uma nova legislação até outubro. "Haverá uma revisão extraordinária ('out-of-cycle') sobre o Brasil, sem data marcada, mas que deverá ocorrer até outubro do corrente ano. Se durante a revisão o governo dos Estados Unidos entender que não ocorrem progressos concretos na tramitação dos projetos de propriedade intelectual, o Brasil provavelmente estará sujeito a medidas comerciais", disse. O País está na lista das nações em observação prioritária.
O ministro descreveu as duas formas de sanções possíveis: imposição de sobretaxas "proibitivas", que poderiam ser contestadas na OMC por meio do mecanismo de solução de controvérsias, processo que pode durar um ano e meio até uma solução definitiva, com prejuízos para os produtos brasileiros, e a exclusão do Brasil do Sistema Geral de Preferências (SGP). Lampreia informou que, em 1992, de um total de exportações de US$ 7 bilhões para o mercado norte-americano, US$ 1,6 bilhão, ou cerca de 22,8%, corresponderam a vendas beneficiadas pelas preferências.
O chanceler afirmou que o País não deve imitar a lei argentina, que prevê um prazo de transição de oito anos, mas adotar uma legislação o mais breve possível para atrair investimentos destinados ao Mercosul.
O senador Fernando Bezerra (PMDB-RN), relator do projeto de lei na Comissão de Assuntos Econômicos, anunciou que no máximo em dez dias apresentará seu parecer, que deverá incorporar o "pipeline" defendido pelo governo. Se o relatório for aprovado,será submetido ao plenário juntamente com o do senador Ney Suassuna, que relatou o assunto na Comissão de Constituição e Justiça. O plenário pode optar por um dos dois relatórios ou pelo PLC 115/93, aprovado na Câmara dos Deputados.
A proposta do governo assegura ao "pipeline" - produtos ainda em fase de desenvolvimento - uma proteção pelo prazo que restar da patente no país onde foi depositado o primeiro pedido. Pela emenda do Executivo, a patente "pipeline" não se estende aos produtos já comercializados no Brasil e no exterior. Não será concedido o "pipeline" se empresários estiverem realizando no Brasil "sérios e efetivos preparativos para a produção do objeto da patente". A Interfarma, associação que reúne os laboratórios farmacêuticos estrangeiros, quer um "pipeline" que proteja também os produtos não lançados no mercado brasileiro. A Associação dos Laboratórios Nacionais (Alanac) rejeita esse mecanismo.
Israel Vargas esclareceu que a emenda do Executivo propõe o patenteamento de microorganismos engenheirados, isto é, aqueles que foram manipulados pela engenharia genética. Segundo o ministro, o conceito de microorganismo deve ser definido na regulamentação da lei. Ele propõe que se incluam nessa categoria bactérias, fungos, vírus, algas, protozoários e agentes patogênicos importantes de doenças tropicais.
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Gazeta Mercantil