Editora de Humanidades da revista Pesquisa Fapesp
Com abordagem multidisciplinar, livro “Amazônia exótica: Curiosidades da floresta” resgata lendas e registros de naturalistas para revelar aspectos pouco conhecidos da Amazônia.
A despeito de a primeira expedição “científica” à maior floresta tropical do mundo ter sido registrada no Século XVIII, a Amazônia segue cercada de mistérios. Não poderia ser diferente se considerarmos, por exemplo, sua dimensão. São cerca de 7 milhões de quilômetros quadrados cobrindo territórios localizados em nove países. Com 60% da floresta em áreas brasileiras, o bioma está presente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Embora a ciência ainda não consiga descrever ou explicar boa parte do que lá existe, não é pouco o conhecimento acumulado sobre a floresta, como atesta o acervo da biblioteca do Museu Paraense Emílio Goeldi. Foi lá que a biblioteconomista Olímpia Reis Resque garimpou as preciosidades que compõem Amazônia exótica: Curiosidades da floresta (Empíreo), que permitem conhecer um pouco melhor a região, considerada desde 2000 Patrimônio Natural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Segundo volume de uma trilogia iniciada em 2011, os 57 verbetes que compõem o livro são resultado do empenho da pesquisadora da história da Amazônia em revelar detalhes de espécies muito utilizadas pela população local. “Foi a forma que encontrei de divulgar não apenas nossa fauna e flora, mas também nosso acervo”, conta. Bibliotecária da instituição durante 35 anos, Resque iniciou sua trajetória profissional no próprio museu, como estagiária, quando ainda cursava a Universidade Federal do Pará. Não demorou a perceber que ali não lhe faltaria informação. Com 300 mil volumes, entre revistas e livros disponíveis ao público, e mais 3 mil obras raras, a biblioteca Domingo Soares Ferreira Penna, fundada no século XIX, reúne o maior acervo sobre a Amazônia do país. “Depois de 40 anos frequentando diariamente o museu, ainda me surpreendo com a coleção, que é riquíssima. Entro no acervo para procurar um livro e encontro outro, que nunca tinha visto”, conta.
Múltiplos olhares
Como indicam os breves registros que exemplificam esta reportagem, no livro livro “Amazônia
exótica: Curiosidades da floresta” há informações de distintas perspectivas. Organizadas em ordem alfabética das espécies selecionadas, revelam a etimologia das palavras, priorizam relatos de naturalistas e reproduzem lendas e curiosidades dos habitantes da floresta. Além da bibliografia consultada, que inclui raridades como Pátria selvagem, a floresta e a vida, mythos amazônicos: Os escravos vermelhos, publicado no início do século XIX por Alexandre de Mello Moraes Filho (1844-1919), o livro apresenta um glossário de termos regionais, como caruana (gênio do bem) e paul (pântano), e breve biografia de meia centena de viajantes que passaram pela região, com destaque para uma única mulher. Lendo a obra, descobre-se que a artista botânica inglesa Margaret Mee (1909-1988) iniciou sua primeira expedição à Amazônia aos 47 anos de idade e manteve contato com a população local durante as três décadas seguintes.
Parte das imagens que ilustram o livro foi extraída do acervo do museu e de sua coleção de obras raras. Algumas aquarelas foram pintadas por artistas locais contemporâneos e há ilustrações de sites como o Plant Illustrations. Encantada com o espaço reservado ao feminino no imaginário de povos indígenas e comunidades ribeirinhas, no último volume da trilogia Resque pretende explorar a figura da mãe. “Na Amazônia, para tudo existe uma mãe”, diz. “Jaci é mãe da lua, Coaraci, a mãe do sol. Para os povos da floresta, a mata é a mãe dos bichos e não pode ser desrespeitada.”