A Science tem novo editor-chefe. Aliás, nova editora-chefe. Sai Bruce Alberts, entra Marcia McNutt. Bruce Alberts, 75 anos, comandou a editoria da Science desde 2008 - os cinco anos previamente combinados. Diplomado e doutorado pela Universidade Harvard, é um bioquímico que se especializou em política de educação científica - daí sua ida para a Science. A soma de tudo o que ele fez pela ciência até 2005 lhe valeu o título de Professor Emérito da Universidade da Califórnia em San Francisco, EUA.
Falando à Fapesp Pesquisa, edição de setembro de 2012, Alberts disse algo que vale a pena lembrar: "Temos de fazer um trabalho melhor e aprimorar a educação científica. A ideia não é minha, mas eu apoio a proposta de que todo aluno de doutorado tenha de escrever um resumo de duas páginas de sua tese que sua avó possa entender antes de ser aprovado. Essa ideia é sensacional. Os cientistas precisam sair do seu mundo".
Marcia McNutt é uma loura inteligente, de 62 anos. Geofísica, ela dirigiu o United States Geological Survey e foi consultora científica da Secretaria de Estado do Interior dos EUA. Antes, ela fora presidente e executiva-chefe do Monterey Bay Aquarium Research Institute, de pesquisa oceanográfica, bem como professora de geofísica marinha da Escola de Ciências da Terra da Universidade Stanford e também da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz.
Na semana passada, na edição de 7 de junho, Marcia McNutt escreveu seu primeiro editorial como editora-chefe da Science. Título: "Passando o bastão". O bastão do Bruce, pois, como ela escreve, "Bruce deixou um legado importante que espero continuar e construir a partir dele".
Marcia só tem elogios para o seu antecessor:
"Bruce elevou a visibilidade da comunidade da educação científica e sua miríade de desafios". Deve ter crescido o grupo de pesquisadores doublês de educadores de ciências, profundamente preocupados em melhorar o que, em resumo, se passou a chamar de STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) da educação.
"Bruce impulsionou pessoas dentro e fora da comunidade educativa a buscar as reformas essenciais. Ele também globalizou ainda mais a Science, alcançando países em desenvolvimento. Bruce, viajante incansável, estava sempre empenhado em tornar a Science mais acessível aos pesquisadores aspirantes, não importa onde eles pudessem ser encontrados", frisa Marcia, indo direto ao desafio de despertar interesse mais profundo pelo conhecimento científico.
Marcia sabe que está substituindo um craque:
"Ele próprio pesquisador respeitado, Bruce trouxe a perspectiva do cientista individual às discussões sobre o formato editorial, o acesso aberto, o processo de revisão por pares, e outros assuntos relativos à publicação. Esteve na vanguarda da abordagem dessas questões com integridade. Reconheceu de imediato que o acesso às informações fornecidas por artigos científicos não classificados (gripe aviária) H5N1 foi fundamental para as preocupações com a saúde mundial e insistiu em sua libertação controlada, de modo a não comprometer a integridade da publicação, nem a ser uma ameaça potencial à saúde. Na verdade, manter no topo a perspectiva do cientista ajuda a garantir que a Science evolua para servir aos melhores interesses da comunidade científica, que depende da rápida comunicação dos resultados mais importantes."
No final, Marcia fala de seus próprios sonhos:
"Sem recuar de nenhuma das prioridades fixadas por meu predecessor, meu objetivo maior é fazer da Science a principal plataforma de comunicação para acelerar os avanços da ciência, usando a última palavra em tecnologias modernas. Muitas revistas excelentes se dirigem ao público de áreas definidas. Na minha opinião, uma revista como a Science, que lida com pesquisadores de amplo espectro de campos, tem a responsabilidade especial de publicar artigos que precisam ser difundidos entre cientistas de áreas que vão além de uma especialidade estreita, porque as novidades em observações, tecnologias, processos, modelos e resultados têm o potencial de revolucionar outras áreas de pesquisa."
Marcia fala também da necessidade de utilizar a Science para "conectar" os membros da SBPC dos EUA, uma questão que não é exclusiva da entidade norte-americana: "Gostaria de ver a Science publicando cada vez mais os melhores artigos. Gostaria que esses artigos fossem escritos de modo a que seu significado seja amplamente compreendido e que os métodos computacionais, como as máquinas de aprendizagem e os processos de linguagem natural, possam ser aproveitados para conectar os membros da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, na sigla em inglês) - que publica a Science - para estudos de amplo interesse."
Mas, Marcia deixa para examinar por último um tema de suma atualidade no mundo inteiro, inclusive no Brasil, que talvez merecesse ser tratado em primeiro lugar:
"O recém-lançado relatório do Programa ARISE 2* (Advancing Research in Science and Engineering - Pesquisa Avançada em Ciência e Engenharia) da Academia Americana de Artes e Ciências faz recomendações para derrubar barreiras à colaboração entre os setores no sentido de promover avanços fundamentais na ciência e sua conversão em novos produtos e serviços. Sua recomendação nº 1 é de que uma "rede do conhecimento" seja desenvolvida para "capacitar os pesquisadores de diferentes áreas a identificar oportunidades, estabelecer esforços colaborativos e focalizar conhecimentos e abordagens díspares sobre problemas de interesse comum."
Marcia está ligada no presente e no futuro: "Minha esperança é de que a Science possa contribuir para que essa rede do conhecimento, promovendo estilos de comunicação, tecnologias e abordagens que transcendam as disciplinas isoladas. A Science, claro, não pode cumprir sozinha a recomendação nº 1, mas creio que está em excelente posição para ser parte importante da solução.
* ARISE 2: Unleashing Americas Research & Innovation Enterprise (American Academy of Arts and Sciences, Cambridge, MA, 2013), p. xiii; www.amacad.org/arise2.pdf>.
José Monserrat Filho é fundador e ex-editor do Jornal da Ciência e do JC e-mail, atual chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB)