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Saúde: Estudo da UFSCar evidencia necessidade de mudança na forma de diagnosticar sarcopenia em idosos (2 notícias)

Publicado em 21 de setembro de 2022

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Pesquisadores dos Departamentos de Gerontologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e de Epidemiologia e Saúde Pública da University College London (UCL) descobriram que nenhuma das notas de corte propostas na literatura para identificar baixa força muscular, incluindo as recomendadas pelo Grupo de Trabalho Europeu sobre Sarcopenia em Pessoas Idosas (European Working Group on Sarcopenia in Older People – EWGSOP), é capaz de identificar com precisão o risco de morte em idosos. Em artigo publicado recentemente, eles constataram que apenas com o uso de notas de corte mais elevadas é possível prever o risco de forma mais precisa.

A sarcopenia é uma doença muscular diagnosticada pela combinação da baixa força muscular e da baixa massa muscular, sendo sua gravidade determinada pelo comprometimento do desempenho físico, medido pela velocidade de caminhada. Para encontrar indivíduos com risco de sarcopenia, o consenso europeu recomenda utilizar um questionário simples de rastreamento, denominado SARC-F, ou basear-se na suspeita clínica por meio de sintomas referidos pelo indivíduo como a fraqueza muscular, assistência à caminhada, dificuldade para levantar uma cadeira, dificuldade para subir lances de escada e quedas. Uma vez identificado o risco de sarcopenia, o mesmo consenso recomenda avaliar a Força de Preensão Manual (FPM), por meio de um dinamômetro ou utilizar o teste de sentar e levantar de uma cadeira. O indivíduo identificado com baixa força muscular tem sua quantidade de massa muscular avaliada com o uso de diferentes exames. Identificada a baixa massa muscular por um desses métodos dá-se a confirmação do diagnóstico de sarcopenia. Então, o teste da velocidade de caminhada é recomendado para estabelecer a gravidade da doença. A recomendação revisada e vigente do EWGSOP é utilizar notas de corte para FPM <27 kg para homens e <16 kg para mulheres para identificar fraqueza muscular.

É exatamente no âmbito dessas notas de corte que o estudo da UFSCar e da UCL apontou para a necessidade de mudança. A pesquisa, que foi realizada durante o pós-doutorado da nutricionista Maria Claudia Bernardes Spexoto na UFSCar, acompanhou por 14 anos mais de seis mil idosos britânicos. Por meio do English Longitudinal Study of Ageing (Estudo ELSA), conduzido pela UCL, e com dados analisados na UFSCar, os voluntários tiveram a sarcopenia avaliada pela força muscular através de um dinamômetro que mede a FPM, pela massa muscular dos membros superiores e inferiores e pela velocidade de caminhada percorrida em metros/segundo numa distância de 2,4 metros.

Com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e supervisão do professor Tiago da Silva Alexandre, docente do Departamento de Gerontologia da UFSCar, o estudo mostrou que, “utilizando as notas de corte para FPM <36 kg para homens e < 23 kg para mulheres, os idosos com sarcopenia provável (condição que antecede a sarcopenia), sarcopenia e sarcopenia grave apresentaram respectivamente 30%, 48% e 78% mais risco de morte do que os não sarcopênicos”, afirma o docente que, atualmente, é professor visitante do Departamento de Epidemiologia e Saúde Pública da UCL, com apoio do CAPES PrInt UFSCar.

Diante da descoberta, os pesquisadores alertam para a necessidade de mudança das notas de corte recomendadas pelo consenso. “Há a necessidade de se utilizar notas de corte mais altas da FPM na primeira etapa do diagnóstico de sarcopenia em detrimento das recomendadas pelo consenso”, pontua Spexoto, docente da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).

Os pesquisadores demonstraram também que, usando qualquer das notas de corte mais baixas existentes na literatura para diagnosticar sarcopenia, a prevalência da doença em idosos é subestimada. Além disso, usando tais notas de corte, pôde-se perceber que a velocidade de caminhada, quando ≤ 0,8 m/s, uma medida mais barata, rápida e fácil de ser utilizada, foi melhor preditora do risco de morte do que a avaliação da sarcopenia. De acordo com os pesquisadores, esse achado, por si só, já era um indicador de que o diagnóstico da sarcopenia, da forma como está proposto, poderia ser tardio e de mais difícil tratamento. “Contudo, usando notas de corte de FPM mais altas para identificar fraqueza muscular, o diagnóstico precoce evita que a sarcopenia cause a lentidão da velocidade da marcha, sendo muito melhor na prática clínica”, relatam.

De acordo com Spexoto e Alexandre, estudos anteriores já vinham indicando baixa prevalência de sarcopenia com o uso das notas de corte <27 kg para homens e <16 kg para mulheres para identificar fraqueza, bem como resultados conflitantes acerca da capacidade de identificar o risco de morte. “O fato de demonstrarmos através de análises comparativas de todos os pontos de corte da literatura ajudou a elucidar um problema que muitos de nossos colegas já enfrentavam nos consultórios e serviços de saúde. Percebia-se que o idoso estava em risco, mas a definição de sarcopenia recomendada impedia confirmar o diagnóstico e iniciar precocemente o tratamento. Acreditamos que nossos achados só foram possíveis porque a amostra do Estudo ELSA é ampla, composta por pessoas que vivem na comunidade e porque pudemos acompanhar esses indivíduos por 14 anos. Estudos que propuseram notas mais baixas não avaliaram o risco de morte ou tinham períodos de acompanhamento curtos dos idosos, o que enviesava os resultados encontrados. Obviamente, indivíduos com força mais baixa morrem mais rápido, impedindo que aqueles que estavam em risco a médio e longo prazo também fossem identificados com precisão”, confirma o professor da UFSCar.

O estudo anglo-brasileiro é o primeiro a comparar a associação da sarcopenia com o risco de morte definida pelos dois consensos publicados pelo Grupo de Trabalho Europeu sobre Sarcopenia em Pessoas Idosas – o antigo e o revisado -, utilizando diferentes notas de corte para FPM.

Prevenção Embora a sarcopenia seja uma doença muscular reconhecida, com código de diagnóstico no CID-10, e enraizada em alterações musculares acumuladas ao longo da vida, ela pode ser prevenida com a prática de exercícios físicos aeróbios e de resistência e com a adoção de uma alimentação saudável com aportes adequados de energia – caloria – e de proteínas. “A ingestão adequada de proteínas na dieta mantém o equilíbrio entre a degradação e a síntese proteica, portanto, recomenda-se aos idosos saudáveis a quantidade de 1 a 1,2 gramas por quilo de peso por dia. Para melhor aproveitamento, o total de proteína deve ser distribuído em três principais refeições ao longo do dia. Ademais, a recomendação de caloria para pessoas idosas com o peso saudável é de 30 kcal por quilo de peso por dia, podendo chegar a 38 kcal por quilo de peso para aqueles identificados com baixo peso”, elucida a pesquisadora.

Um artigo sobre a pesquisa foi publicado na revista Age and Ageing e pode ser acessado na íntegra neste link (