"Se o governo de São Paulo cortar ainda mais despesas de custeio e investimentos, a máquina pára. Nas atuais condições, o governo já não está mais governando", afirma o secretário estadual da Fazenda, Yoshiaki Nakano.
"Nenhum estado fez um ajuste tão grande quanto São Paulo", diz, exibindo um gráfico que mostra a abrupta queda de R$ 4 bilhões do déficit orçamentário, de 18% da despesa em 1994 para 2,79% no último ano. Assim mesmo, o estado deixou de pagar serviços da dívida bancária, enfrenta um explosivo crescimento de seu endividamento global, que chega à casa dos R$ 68 bilhões, e a cada dia é surpreendido por novas cobranças judiciais, que engordam mais esses números.
O estado não tem muito mais onde cortar nem poderá passar mais um ano sem urgentes investimentos de manutenção, reconhece Nakano. No último ano, a despesa de custeio da administração direta caiu 30%, limitando-se a R$ 2,481 bilhões, em valores de dezembro de 1995. Os gastos com investimentos, reduzidos em 80% em relação ao ano anterior, representaram apenas 1% do total das despesas do estado, ou R$ 291 milhões.
SÃO PAULO JÁ DEVE R$68 DIZ NAKANO
Para um estado cujo PIB é de US$ 280 bilhões e a renda per capita é de US$ 8 mil, esse investimento é um grão de areia no oceano.
A tesoura, agora, teria que se aprofundar mais e mais no tecido das empresas estatais, fundações e autarquias, que não vão sangrar sem reagir. Nakano, no entanto, parece estar pronto para enfrentar a reação.
Quer acabar com empresas como a Dersa, que, diz, foram criadas para captar recursos e construir estradas. Hoje, a Dersa administra pedágios e contratos de manutenção das rodovias. Mas quando o estado, por meio de contratos de concessão, está passando essas atribuições à iniciativa privada, a Dersa não tem mais razão de existir. O DER pode se incumbir de fiscalizar essas concessões.
Outras estatais que não estiverem no programa de privatização, como a Codasp, também terão que ser fechadas. E não está a salvo nem mesmo o reduto da "intelligentsia" paulista, como as três universidades públicas do estado ou as fundações, que, por reunirem a elite intelectual, têm fácil acesso à mídia e alto poder de fogo para contra-atacar.
Nakano está convencido de que a universidade gratuita é uma grave distorção. "Se o estacionamento nessas universidades fosse pago, a receita obtida provavelmente seria superior à de muitas secretarias de estado", diz ele, numa referência ao alto padrão aquisitivo dos estudantes, que em boa parte dispõem de carro próprio para chegar ao campus. Os subsídios gastos com as três universidades chegam a R$ 1,5 bilhão por ano.
O argumento que a universidade é gratuita é garantia do acesso à educação paradas camadas mais pobres da população é rebatido pelo secretário. Um programa de bolsas de estudos para estudante que comprovadamente viesse de família de baixa renda resolveria de forma mais eficaz o problema. Diz ele.
"O que não dá é um estado que não tem recursos para atender à crescente população de menores carentes nas ruas continuar subsidiando até a alimentação da alta classe média nos campus universitários", diz ele.
Ás baterias da Fazenda paulista estão igualmente assestadas contra as fundações, uma extensão dessas mesmas universidades. As fundações representam interesses privados e corporativistas dentro do estado. As funções públicas importantes que deveriam executar não estão sendo cumpridas. Se eu quisesse, por exemplo, um trabalho da Fundap sobre reforma administrativa, ela me mandaria um orçamento para contratar pessoas para a pesquisa e ainda colocaria em cima um 'overhead' de 30%. O problema é que essas fundações são sustentadas pelo estado, porque geram receita própria insuficiente para cobrir despesas definidas de forma autônoma afirma.
O estado, por exemplo, tem uma dívida a pagar de R$ 320 milhões de INSS devido por suas autarquias, empresas e fundações. O dinheiro para que elas recolhessem o INSS foi repassado pelo estado, na conta das transferências intragovernamentais. Só que, diz Nakano, como elas têm autonomia para definir suas prioridades, não recolheram a contribuição, inclusive a parte descontada em folha de seus funcionários. Agora, cabe ao estado honrar esse compromisso.
A saída, diz Nakano, é mudar a legislação, para criar uma outra figura jurídica para as fundações. O ideal seria que elas gerassem sua própria receita e o estado, quando precisasse de seus serviços, as contrataria, com opção de comparar seu orçamento com o de outras instituições privadas.
No ano passado as chamadas transferências intragovernamentais - recursos repassados para empresas, fundações e autarquias já foram cortadas em 15%, caindo para R$ 6,28 bilhões. Nakano sabe que será difícil cortar mais, mas acha que este é o único espaço para enxugar as despesas. "Estou transferindo recursos públicos, de impostos indiretos - a receita do estado vem principalmente do ICMS -, para um grupo de pessoas com forte lobby para seus interesses corporativistas e salários e benefícios altos. Eles têm assistência médica superior à assegurada pela maior parte das empresas privadas. Chegam a gastar em plano de saúde o equivalente a R$ 400 por funcionário, que é mais que a média dos salários dos funcionários da Secretaria da Fazenda, de R$ 150, se excluídos os fiscais", disse.
Os salários dos empregados da administração direta, reconhece Nakano, são baixos, e por enquanto essa situação não deverá mudar. Os funcionários públicos podem se preparar para enfrentar mais um ano sem reajuste de seus vencimentos. No ano passado, as despesas com pessoal cresceram 30%, basicamente em razão de aumentos obtidos na Justiça do Trabalho pelos funcionários da administração indireta e pelos reajustes concedidos pelo ex-governador Luiz Antônio -Fleury Filho em seus últimos -dias no Palácio dos Bandeirantes - de índices de até 118%, como os autorizados para a Polícia Militar. Por decisão do governo Covas, na administração direta só os professores da rede pública de ensino de 1º e 2° grau tiveram reajustes em 1995.
A reforma administrativa, se aprovada, deverá dar uma contribuição muito pequena para conter a folha de pagamento. O item mais importante da reforma é o que limita os vencimentos a R$ 8,5 mil. Esse item traria uma economia da ordem de R$ 170 milhões, facilmente consumida por qualquer percentual mínimo de reajuste da massa de funcionários públicos, que tem um piso salarial de R$ 150.
"Não posso demitir funcionários que têm estabilidade, não posso parar a máquina, tenho que aumentar investimentos e é difícil deixar de repassar dinheiro para as autarquias", diz o secretario. É por isso que ele se diz preparado para receber a artilharia pesada de interesses contrariados, principalmente na comunidade acadêmica.
Notícia
Gazeta Mercantil