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Diário do Povo

Santo Remédio

Publicado em 19 novembro 2002

Por MARIA TERESA COSTA — Agência Anhanguera
Pelo menos duas substâncias químicas encontradas na própolis conseguiram, em laboratório, inibir o crescimento e cataram células tumorais. Uma dessas substâncias, que se mostrou promissora para interromper a proliferação e matar células de câncer de ovário, rins e melanoma, foi tostada em relação à toxicidade, com resultados também interessantes. Ela tem toxicidade mais baixa, por exemplo, que a doxorrubicina, a principal droga utilizaria nos tratamentos de quimioterapia. O outro composto passará agora por testes de toxicidade. Esses resultados animam os pesquisadores José Agustin Quincoces Suárez, da Universidade Bandeirante de São Paulo (Uniban), e João Ernesto de Carvalho, coordenador da Divisão de Farmacologia o Toxicologia do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Eles se uniram nesse projeto, em que o químico Quincoces sintetiza em laboratório as moléculas que considera ter potenciais interessantes e o farmacologista Carvalho faz os testes em células tumorais e em camundongos. Mais de 10 substâncias da própolis foram testadas e duas delas mostraram bom potencial antitumoral. "Uma molécula, para ser boa, tem que ter os efeitos que queremos em células tumorais e não provocar danos em células sadias", explica Quincoces, professor cubano que vive no Brasil e integra um grupo de pesquisa da Uniban. Elevai patentear a substância, batizada provisoriamente de EBHI - ele não revela a composição dessa substância que ele sintetizou em laboratório. O que anima o grupo é principalmente a forma seletiva de câncer em que ela é eficaz e a baixa toxicidade. Os testes feitos com camundongos mostraram, por exemplo, que a dose letal para um camundongo é de 8,54 gramas da substância para cada quilo de camundongo. A doxorrubicina mata com a dose de 20 mg/kg. "Nosso composto é praticamente sem toxicidade", afirma Quincoces. As células tumorais de humanos utilizadas nessa pesquisa são parte do banco de cultura de células do CPQBA, que tem 25 linhagens disponíveis para testes. Em função da atual infra-estrutura (que será ampliada), o laboratório tem feito testes em apenas novo linhagens de células de câncer: leucemia, pulmão, rim, mama, mama resistente a múltiplas drogas, ovário, próstata, melanoma e cólon. A própolis, lembra Carvalho, é bastante pesquisada atualmente, especialmente por sua capacidade em funcionar como um antibiótico natural. A substância resinosa que as abelhas coletam de vegetais e com a qual vedam suas colméias tem muitas propriedades. Uma delas é o efeito anticariogênico, investigado pelos pesquisadores Jaime Cury e Pedro Rosalen, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP/Unicamp). Ele observou que a própolis reduz a placa bacteriana nos dentes. ANTIBIÓTICO NATURAL A própolis é uma substância resinosa, recolhida pelas abelhas (Apis mellifera) dos brotos e ramos de árvores e transformada, pela ação enzimática, em uma substância marrom ou esverdeada e de odor balsâmico característico. Ela é um antibiótico natural, devido a substâncias antibacterianas existentes em sua composição, tais como a galangina e a pinocembrina. Pesquisas mostram que a própolis não produz sobre o organismo os efeitos nocivos dos antibióticos químicos sintetizados, pois não destrói a flora intestinal. Suas propriedades cicatrizante, antiinflamatória e anestésica também são conhecidas. A palavra própolis (ou própole) é de origem grega e significa "em prol da cidade". Designa uma substância que as abelhas produzem a partir de resinas vegetais, cera, pólen, ácidos e gorduras, e que serve como impermeabilizante, desinfetante e também como material de construção. SUBSTÂNCIA VAI SER TESTADA PELOS RATOS As substâncias sintetizadas da própolis começarão a ser testadas in vivo para observar se os resultados conseguidos até agora se reproduzem no modelo animal. O farmacologista João Ernesto de Carvalho explica que linhagens de células tumorais serão encapsuladas em uma fibra semi-permeável e introduzidas no peritônio e dorso de camundongos para serem submetidos a 15 dias de tratamento com a substância. Segundo ele, a fibra tem porosidade que permite a passagem de nutrientes e da droga, mas que impede a saída das células encapsuladas ou a entrada de células de defesa do animal. Assim, durante 15 dias, as células receberão do animal os nutrientes que necessita para viver o multiplicar e ao mesmo tempo a droga. Depois desse período, a fibra será retirada e as células contadas para ver se houve inibição do crescimento. Para essa fase, será necessária grande quantidade do composto de própolis para ser utilizado em tratamento crônico com pelo menos 30 animais. Será feito também o grupo de controle. Se a droga passar nessa fase do teste (inibir o crescimento e matar as células encapsuladas), entrará então a fase do avaliar os efeitos da substância em animal com câncer. Para isso, serão implantadas células de linhagem de câncer de pulmão em camundongos imunodeficientes para que eles desenvolvam câncer humano. É uma das mais caras partes da pesquisa, porque os animais viverão em bolhas para evitar qualquer contaminação. Essa fase ainda não tem financiamento, mas para a fase anterior, o projeto do químico Quincoces foi aprovado nela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).