Notícia

Jornal do Brasil

Salvar a ciência no Rio de Janeiro*

Publicado em 11 abril 1996

Os signatários, professores e cientistas da UFRJ, vêm a púbico em defesa do patrimônio científico instalado no Rio de Janeiro - o segundo maior do país, é flagrante o contraste entre o discurso do governo e a realidade, que é ditada por sua área econômica, ao determinar os montantes de dotações orçamentárias e da liberação de recursos. São exemplos: - Caso prevaleça a proposta orçamentária para 1996 que está em tramitação no Congresso Nacional, caberá à UFRJ menos da metade dos recursos indispensáveis para a simples sobrevivência de suas atividades. Nossos laboratórios poderão ser fechados por corte de energia elétrica! - O MEC ainda não pode completar o repasse à UFRJ de verbas substanciais, que lhe são devidas desde 1995. No MCT, as agências federais de fomento à pesquisa, a despeito dos esforços de seus dirigentes, ainda não receberam verbas para pagar auxílios já aprovados há um ano ou mais. Taxas de bancada estão com um atraso de quatro meses. Essa grande irregularidade nos repasses financeiros agrava ainda mais o Impacto de orçamentos já de inicio insuficientes. - O orçamento para 1996 do Programa de Núcleos de Excelência, em cuja implantação imediata os pesquisadores depositam grandes esperanças, foi cortado em 25% pelo relator da proposta orçamentária do MCT. Outros cortes poderão afetar os montantes, já há anos inadequados, de verbas para auxílios e bolsas de pesquisa. - Instituições de pesquisa são tratadas como se fossem organizações comerciais na importação de materiais e equipamentos científicos, ocasionando grandes atrasos na liberação e conseqüentes prejuízos para as pesquisas. - O governo estadual, apesar dos apelos da comunidade científica e do Conselho da FAPERJ (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro), repassa à Fundação apenas uma fração irrisória dos recursos determinados pela Constituição do Estado. Enquanto a FAPESP distribuiu a nossos colegas paulistas, em 1995, cerca de R$ 200 milhões em auxílios diretos à pesquisa (excluindo bolsas), a FAPERJ não chegou a distribuir nem a centésima parte desse valor! - O governo paulista tem mantido a regularidade dos repasses devidos, conforme ressalta o presidente da FAPESP, "independentemente de conjunturas econômicas mais delicadas". Ciência e tecnologia são prioridade em São Paulo, porém não no Rio de Janeiro, cujo governo promove assim o êxodo de cérebros para o estado vizinho. O governo federal não pode se omitir diante desta situação: o patrimônio científico espezinhado foi construído ao longo de meio século, e pertence à nação. As universidades públicas, como quase tudo em nosso país, são afetadas por grandes desigualdades regionais e há muito a corrigir para melhorar seu desempenho, embora isto seja grandemente dificultado pela legislação vigente e por ingerências políticas. Entretanto, a campanha de descrédito lançada contra elas desinforma a opinião pública ao omitir os serviços essenciais que prestam ao país. É nas instituições públicas que se faz a quase totalidade da pesquisa científica e tecnológica desenvolvida no Brasil, e que ainda está muito aquém das suas necessidades. A contribuição do Rio de Janeiro, em particular da UFRJ, à produção científica nacional é das mais vigorosas. O maior prêmio nacional de ciência e tecnologia coube em 1995 a cientistas da UFRJ. Em parceria com a Petrobrás, a UFRJ vem contribuindo para o desenvolvimento da mais avançada tecnologia do mundo para exploração de petróleo em águas profundas, como tal reconhecida por um prêmio internacional. O país vem economizando em divisas vários bilhões de dólares por ano (muito mais do que o total dos dispêndios em ciência e tecnologia) graças a essa contribuição. Atividades essenciais para a saúde da população, como o controle da poluição por metais pesados nas Baias de Guanabara e de Sepetiba, estão a cargo da UFRJ. Nos seus hospitais universitários e laboratórios biomédicos, são desenvolvidas pesquisas de ponta, que se refletem no atendimento aos usuários e na manutenção do programa de assistência às vítimas da AIDS. Pareceres abalizados - infelizmente nem sempre seguidos - sobre nossos problemas urbanos mais prementes, como o da contenção de encostas, são dados por nossos pesquisadores. Esta é apenas uma pequena amostra dos serviços prestados pela UFRJ, além do maior de todos, que é a formação de pessoas qualificadas, em todas as áreas do conhecimento. Como fórum de livre debate, ela desempenha um papel importante na construção da democracia. Defendemos a autonomia da universidade, que deve ter como contrapartida a cobrança de sua maior eficiência: racionalizando os gastos, via legislação que permita fazê-lo. Ela deve prestar contas à sociedade, submetendo-se a uma avaliação externa permanente. Os recursos devem ser distribuídos segundo critérios que premiem a qualidade. É indispensável que se garanta a sobrevivência dos melhores grupos, estimulando seu efeito multiplicador, através de programas como o dos Núcleos de Excelência, cuja implantação, várias vezes anunciada, tem sido protelada há anos. O orçamento previsto para este programa não pode ser cortado. Ao mesmo tempo, devem ser incentivados grupos emergentes promissores, procurando reduzir as desigualdades regionais, em parceria com os governos estaduais. Não basta a liquidez dos bancos. A falência que mais nos ameaça é a que diz respeito à moeda mais valiosa no século 21: o conhecimento. Um país que não prioriza a educação, a ciência e a tecnologia não terá autonomia para decidir sobre seus destinos, e estará condenado a posições cada vez mais subalternas na comunidade das nações. É esta a visão do futuro do Brasil na mente dos nossos governantes? Dada a gravidade da situação, consideramos indispensável a intervenção imediata do Presidente da República em defesa do nosso patrimônio científico. Signatários: Alberto Luiz Coimbra, Fundador da COPPE (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia)/UFRJ, Ordem Nacional do Mento Científico. Carlos Chagas Filho, Criador do Instituto de Biofísica/UFRJ e Pesquisador Honorário do Instituto Oswaldo Cruz. Clementino Fraga Filho, Ex-Reitor da UFRJ, Fundador do Hospital Universitário/UFRJ. Gilberto Velho, Presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais, Ordem Nacional do Mérito Científico. Leopoldo de Meis, Prêmio de Química da Third World Academy of Sciences, Ordem Nacional do Mérito Científico. Moysés Nussenzveig, Prêmio Max Born da Optical Society of America, Ordem Nacional do Mérito Científico. Em apoio Sérgio Henrique Ferreira, Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Ordem Nacional do Mérito Científico. Jacob Palis, Vice-Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Ordem Nacional do Mérito Científico. Eduardo Krieger, Presidente da Academia Brasileira de Ciências, Ordem Nacional do Mérito Científico. Carlos Eduardo Rocha Miranda, Vice-Presidente da Academia Brasileira de Ciências, Ordem Nacional do Mérito Científico. *Publicação subvencionada por professores e cientistas da UFRJ