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Reposição hormonal não afeta jovens com falência ovariana (1 notícias)

Publicado em 02 de abril de 2014

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O termo menopausa precoce cedeu lugar à falência ovariana prematura (POF) ou insuficiência ovariana, denominações mais adequadas com os dias de hoje e que representam a perda da função do ovário [de produzir hormônios e de regular a menstruação] antes dos 40 anos de idade. Para essas mulheres (muitas na casa dos 20), o fenômeno é anunciado por irregularidade menstrual, menstruações mais ou menos frequentes. Não sabem o que fazer e o que pensar. E, ao procurarem ajuda médica, têm indicação de terapia de reposição hormonal (TRH). Elas se assustam.

 

A reposição hormonal nestes casos é hoje mandatória, mas muitas a evitam por medo do câncer de mama, embora não havendo nenhuma evidência científica para essa faixa de idade. Teoricamente, quanto maior o tempo que o ovário deixa de funcionar, diminui a glândula mamária e aumenta o percentual de gordura.

 

O receio na comunidade científica era que a reposição nas jovens mudasse este processo. Não foi o que mostrou um estudo da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). A TRH em jovens mulheres com perda da função dos ovários não aumentou a densidade mamária com o avançar do tempo.

 

Tal descoberta foi vista com animação pelo conselho editorial da revista norte-americana Menopause, um dos periódicos de maior circulação e prestígio na área de menopausa, que recomendou ampla divulgação do artigo “Mammographic breast density in women with premature ovarian failure: a prospective analysis”, da aluna de iniciação científica Luísa Helena Assis.

 

A pesquisa, orientada pela docente Cristina Laguna Benetti Pinto, teve apoio da Fapesp e foi veiculada na edição on-line da Menopause em janeiro último e está prevista sua publicação na versão em papel em setembro deste ano. Assinam o texto, além de Luisa e da ginecologista Cristina, Maria Fernanda Brancalion, Eduardo Tinois, Helena Giraldo, Cesar Cabello e Daniela Yela.

 

O trabalho foi premiado pela Sociedade Europeia de Ginecologia Endócrina e foi apresentado neste mês de março no 16º Congresso Mundial de Ginecologia Endócrina, em Florença, Itália. O evento se constitui o mais destacado da área.

 

Luisa avaliou 56 pacientes com falência ovariana precoce, antes dos 40 anos, atendidas no Ambulatório de Ginecologia Endócrina do Hospital da Mulher “Prof. Dr. José A. Pinotti” Caism. Elas foram submetidas à TRH pelo período mínimo de três anos, para verificar se a reposição influenciaria a densidade mamária.

 

Segundo a orientadora, o artigo certamente é relevante porque fornece substrato para que o médico mostre à paciente que a TRH nesta faixa etária não aumenta esse fator considerado de risco para câncer de mama – a densidade mamária.

 

A perda da função do ovário nesta idade não é esperada, e pode ser comparável a uma mulher cuja tireoide deixou de funcionar e que por isso precisou repor o hormônio da tireoide.

 

Igualmente, nas mulheres com menos de 40 anos, quando o ovário perde sua função, precisam ser repostos os hormônios que deveriam estar em funcionamento: o estrógeno e a progesterona. E essa reposição será feita até a idade em que a glândula entraria na menopausa.

 

Desconstrução

 

As mulheres com falência ovariana precoce necessitam de uma abordagem diferenciada. A intenção é desvincular essas jovens do termo menopausa, pois é justamente essa vinculação que faz com que elas tenham medo do tratamento hormonal, garante Cristina.

 

Isso porque uma pesquisa publicada na imprensa em 2002 acabou relacionando o uso dos hormônios do tipo do premelle ou premarin com o aparecimento do câncer de mama. Este estudo demonstrou risco aumentado para o desenvolvimento desse câncer pelas mulheres que chegavam à menopausa em idade habitual.

 

“Discutível ou não, ele não se aplica à mulher jovem. Até por esse motivo, desenvolvemos a nossa investigação para avaliar a mama de mulheres em que ovário deixou de funcionar abaixo dos 40 anos”, diz.

 

Essas mulheres muitas vezes são desinformadas e o médico também. Além disso, na literatura, há poucos estudos a esse respeito. Por isso o artigo alcançou grande repercussão na revista Menopause, comenta a professora. “Oferecemos respostas iniciais para que o médico dialogue com a paciente e mostre-lhe que deve fazer a TRH.”

 

No Caism, há anos é prescrita a reposição hormonal com estrógeno associado à progesterona, por meio de comprimidos, mas também por meio de gel e de adesivos.

 

Essa indicação é para manter um bom nível estrogênico, que ajuda a diminuir várias doenças em mulheres jovens: melhora a massa óssea e previne-se a osteoporose e sintomas genitais como secura, dor nas relações sexuais e ardor na vulva. Outros estudos ainda sugerem uma melhora cognitiva, dos parâmetros metabólicos (colesterol, triglicérides) e também menor relação com doenças neurológicas.

 

Causas

 

O ovário dessas mulheres, conta Luisa, perdeu sua função antes da hora e, em geral, em um grupo em que o ovário nunca funcionou e também em um grupo em que o ovário já funcionou. “Estudamos o grupo em que o ovário funcionou e deixou de funcionar.”

 

Normalmente essa disfunção pode resultar de causa genética, autoimune e pode ocorrer após radio e quimioterapia. “Muitas mulheres com câncer obtêm a cura, contudo seus ovários entram em falência e elas deixam de engravidar.”

 

Mas algumas, sobretudo as que têm causas autoimunes, passam um período em que o ovário ora funciona bem, ora decai. Diante dessa oscilação, elas ainda têm uma chance mínima de conceber. Porém, na maioria das vezes não é possível estabelecer com segurança a causa da falência ovariana.

 

Atualmente, para mulheres que querem engravidar, é possível recorrer a outras formas de tratamento baseadas na reprodução assistida – um conjunto de técnicas que viabilizam a gestação em mulheres com dificuldades de engravidar, mediante a doação de óvulo para aquelas que podem gestar.

 

Avaliação

 

Os achados desse estudo foram avaliados a partir de um software desenvolvido pelo físico Eduardo Tinois e da leitura de mamografias realizadas pelo mastologista Cesar Cabello dos Santos, da Divisão de Oncologia do Caism. A grande vantagem foi que essas mamografias tinham intervalo de pelo menos cinco anos, o que permitiu fazer uma avaliação prospectiva.

 

A densidade da mama, refere Cristina, pode ser avaliada de várias formas. Uma delas envolve o uso de mamografias. Nelas são riscados o que foi visibilizado de glândula mamária e de tecido gorduroso. O software analisa o percentual de glândula mamária em relação ao que há de gordura.

 

Segundo a mestranda Helena Giraldo, da linha de pesquisa coordenada pela professora Cristina, as investigações que se dedicam a avaliar os fatores de risco para o câncer de mama podem fornecer dados que aumentam a prescrição e a aderência ao tratamento.

 

A despeito de existirem conclusões definitivas, alguns estudos da literatura médica sugerem que, quanto mais “cedo” a menopausa, independentemente da reposição, menor é o risco do câncer de mama, porque o ovário parou de funcionar “cedo”.

 

Outras pesquisas

 

As pacientes comumente chegam ao Ambulatório de Ginecologia Endócrina do Caism com queixas menstruais, a fim de investigar o porquê do seu ciclo ter ficado irregular (a cada três a seis meses) ou porque cessou.

 

Os exames, no caso, vão apontar que o ovário está perdendo a sua função. É daí que a mulher fica impactada, ao receber o diagnóstico. Muitas negam e demoram um tempo até que entendam e assumam que têm uma disfunção. Cristina informa que, para elas, o diagnóstico equivale à perda de um ente querido.

 

A professora comenta inclusive que, nas consultas no Caism, as pacientes jovens já não podem e não querem mais ser enquadradas no mesmo grupo de estudo das mulheres na menopausa. Por conta disso, vários projetos, especificamente para esta população, estão em andamento no hospital.

 

Helena agora está estudando as queixas sexuais dessas mulheres, já que a reposição às vezes não consegue melhorar esse quadro. Ela está investigando uma nova forma de terapêutica para esse público.

 

Um estudo já publicado, de mulheres com falência ovariana prematura antes dos 40 anos, revelou que, mesmo com a reposição, elas têm muito mais queixas sexuais do que as mulheres cujo ovário funciona bem.

 

Em estudo anterior, da pós-graduanda Poliana Cordeiro, avaliou-se a função sexual das mulheres com falência ovariana prematura que usavam a TRH. Poliana examinou o seu ambiente vaginal e comprovou ser igual ao de outras mulheres e que, mesmo assim, ainda tinham mais queixas.

 

“Estamos propondo agora um tratamento diferente do que já foi feito em fisioterapia, com estímulos elétricos, para tentar atingir planos mais profundos, teciduais”, relata Helena. “Vimos que estas mulheres precisam de respostas, e os ginecologistas do Ambulatório de Ginecologia Endócrina do Departamento de Tocoginecologia da FCM têm buscado um atendimento diferenciado para elas”, acrescenta Cristina.

 

Publicação

 

Artigo: “Mammographic breast density in women with premature ovarian failure: a prospective analysis”

Revista: Menopause

Autores: Luisa Helena Assis, Cristina Laguna Benetti Pinto (orientadora), Maria Fernanda Brancalion, Eduardo Tinois, Helena Giraldo, Cesar Cabello e Daniela Yela

Financiamento: Fapesp