Talvez devido à crise continuada em que temos vivido, particularmente em relação ao regime inflacionário e às finanças públicas, o Brasil mal acostumou-se a somente ver e destacar as coisas negativas.
Não posso tirar outra conclusão do alarde com que vejo serem comemoradas as iniciativas tardias que, embora ainda não tenham alcançado todos os estados, dão início à chamada Reforma do Estado, visando ao indispensável equilíbrio das contas públicas. Toda a ênfase é posta nas situações que, premidas pelas circunstâncias, começam a ser encaminhadas, deixando-se de lado quem, com muito esforço, persistência e dedicação conseguiu prevenir o pior.
Tenho em vista o caso da Bahia, que, criteriosa e seriamente, contrariando interesse, mas com os olhos ,voltados para o bem-estar da população, vem fazendo o seu ajuste desde 1991, quando teve início um amplo trabalho de recuperação financeira, administrativa e moral do estado.
Os resultados dessa política, empreendida pelo então governador Antonio Carlos Magalhães, já são visíveis a olho nu e estão tendo desdobramentos no atual período governamental, marcado pela continuidade política e administrativa.
Sem traumas, a Bahia soube colocar-se dentro dos limites constitucionais e legais dos gastos com pessoal. Isso depois da reengenharia feita em 1991, quando foram extintas seis secretarias de Estado, treze entidades descentralizadas (empresas, autarquias, fundações) e 1.500 chefias intermediárias no aparelho administrativo, compactando-se a máquina e elevando seu nível de eficiência e produtividade.
O Baneb goza de perfeita saúde financeira, pois foi inteiramente recuperado e não recorre ao redesconto, porque o Estado não saca no vermelho nem lhe toma empréstimos.
Graças a firme e decidido comando político, nenhum novo município foi criado na Bahia, embora somente as disposições transitórias da Constituição Estadual previssem mais de cinco dezenas deles. Outra centena de propostas encontrava-se em tramitação.
O programa Corredores de Transportes, financiado pelo BID, que estimava 1.250 quilômetros de rodovias pavimentadas, fará cerca de 2 mil quilômetros, em face da redução de preços conseguida nas licitações, depois da anulação de concorrências em que se identificou combinação entre os licitantes.
Na área da educação, a rede estadual foi recuperada e ampliada, possibilitando a elevação da matrícula de 1,042 milhão de alunos em 1990 para 1,815 milhão em 1994, com um acréscimo de 773 mil novas matrículas. Ingressa em uma nova etapa a melhoria qualitativa do ensino.
A recuperação do Pelourinho, símbolo do nosso passado colonial e patrimônio da humanidade, tombado pelo Unesco, foi realizada exclusivamente com recursos próprios. Do mesmo modo, a implantação dos parques metropolitanos de Abaeté e Pituaçu.
Sem alardes, a Bahia promoveu a concessão do sistema "ferryboat", que opera a travessia da Baía de Todos os Santos, incorporando embarcações literalmente oriundas do Primeiro Mundo. A mina de ouro de Maria Preta, no município de Santaluz, mais uma área de 36 mil hectares para pesquisa, foi ganha em concorrência por uma empresa canadense e uma outra área está sendo licitada. A venda da companhia de eletricidade, já autorizada, encontra-se em andamento.
Estão sendo implantados o Programa de Saneamento Ambiental de Salvador e Entorno da Baía de Todos os Santos, com financiamento do BID, que vai beneficiar diretamente a mais de 1,7 milhão de pessoas, e o Programa de Modernização do Setor de Saneamento, no qual a participação financiada da Embasa foi elevada, pelo Banco Mundial, de US$ 99,3 milhões para US$ 123,5 milhões, em face do nível de eficiência dos serviços e do seu desempenho econômico-financeiro, beneficiando mais 1,5 milhão de baianos.
O Sistema de Atendimento ao Cidadão (SAC), voltado para a melhoria da qualidade do serviço público, reúne todo um conjunto de atividades oficiais, substituindo dezenas de repartições públicas por um verdadeiro shopping de serviços.
Com o "Sertão Forte", o governador Paulo Souto executa amplo e diversificado programa de infra-estrutura visando à segurança hídrica no vasto Semi-Árido, que abrange 60% do território baiano -mais de um terço de todo o Polígono das Secas - e envolve mais de 6 milhões de habitantes.
Do ponto de vista financeiro, o estado mantém em dia todos os seus compromissos, não tem dívida, em Antecipações de Receita Orçamentária - as recém-famosas ARO - e destina cerca de 15% da sua receita própria para investimentos, o que equivaleu, em 1995, a um montante de US$ 365 milhões. Acrescidos dos recursos externos, os investimentos totalizaram US$ 457 milhões no ano passado.
De conformidade com a orientação vigente, tem a Bahia recorrido às agências internacionais de crédito, mantendo hoje uma carteira de US$ 1,2 bilhão, entre recursos contratados e em negociação. Consciente, no entanto, de que esse é um modelo de alcance limitado pelo tamanho das economias estaduais, impondo-se, no caso do Nordeste, que a União volte a assumir responsabilidades diretas nos investimentos destinados a infra-estrutura, especialmente os de saneamento, irrigação, transportes e energia.
Padece, contudo, a Bahia dos reflexos das dificuldades da União e de políticas federais pouco consistentes e objetivas. Pela sua própria localização geográfica, vê-se atravessada por rodovias tipicamente federais, que interligam o Norte ao Sul do País, ou da capital federal com o Nordeste, que se encontram em precárias condições de tráfego, tornando quase impossível a circulação de bens e pessoas. Os portos, desaparelhados, tornam-se também subutilizados. A hidrovia do São Francisco, que já dispõe da eclusa, precisa de apenas R$ 10 milhões para poder transportar 1 milhão de toneladas por ano - é o projeto de mais baixo custo e mais elevada taxa de retorno no setor de transportes em todo o País.
Os investimentos públicos federais em irrigação são parcos, as contrapartidas a financiamentos não são aplicadas, nem novos projetos estão sendo definidos. A Codevasf estanca suas atividades em dois anos.
O crédito para financiamento dos grãos do Oeste (2,5% da safra nacional) ou da hortifruticultura irrigada nos vales do São Francisco das Contas ou do Paraguaçu é sempre insuficiente, extemporâneo ou inadequado.
Tem sido mais fácil aos brasileiros fazer turismo no exterior do que desfrutar a Bahia como portão de entrada para o Nordeste, apesar da infra-estrutura com que já se conta.
Mas é sobretudo a economia baiana que se ressente da ausência de uma política explícita da União em favor da desconcentração industrial e da correção dos desequilíbrios regionais. Nesse sentido, finanças públicas equilibradas, governo eficiente, diretrizes claras e transparentes, políticas efetivas de ampliação e melhoria, da infra-estrutura, mostram-se todos rigorosamente insuficientes para acelerar o passo da economia, gerando empregos e renda e reduzindo a pobreza, mesmo em se tratando de um estado que é a sexta maior economia estadual do País e representa cerca de um terço da economia nordestina.
Louvo, pois, os que se iniciam no caminho do saneamento administrativo e financeiro, mas já é tempo de aprendermos a valorizar e a premiar os bons exemplos.
* Senador (PFL-BA), foi secretário do Planejamento, Ciência e Tecnologia do Estado da Bahia.
Notícia
Gazeta Mercantil