Notícia

Gazeta Mercantil

Reação firme da exportação depende de nova pauta

Publicado em 07 abril 1997

Por Rodrigo Mesquita e Lívia Ferrari do Rio
O Brasil vive hoje uma verdadeira encruzilhada comercial e dificilmente conseguirá equilibrar as contas de sua balança de comércio exterior aumentando as vendas dos produtos de sua pauta de exportações. O comércio mundial corre por outros trilhos, como mostra um estudo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), obtido com exclusividade por este jornal. A demanda que mais cresce é a de produtos com alto valor agregado, principalmente eletrônicos, componentes de informática e de telecomunicações. O Brasil não tem em sua pauta de exportação nenhum desses produtos. E o pior: importa-os cada vez mais. Esse paradoxo deixa claro que a única saída é atrair essas empresas para o País, reconhece Lídia Goldenstein, assessora da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). E é esse, na verdade, o objetivo final do estudo que foi coordenado por Marcus Vinícius Pratini de Moraes, presidente da AEB, a pedido do ministro da Fazenda, Pedro Malan. Identificar o que mais se compra no mundo e quem fabrica para, no passo seguinte, ir atrás dessas empresas e convencê-las a investir no Brasil. Discretamente, o governo já começou a se mover nessa direção. Técnicos do Ministério da Fazenda têm visitado empresas e mantido contatos nesse sentido. Entre os produtos líderes de crescimento na exportação mundial estão unidades digitais centrais de memória, equipamentos para processamento de dados off-line, ou microcircuitos eletrônicos. Os primeiros apresentaram, nos últimos dez anos, incremento médio de exportações de 73,24% anual. Enquanto isso, o comércio mundial de soja, onde o País tem presença firme, cresceu apenas 2,8%. "O Brasil não vai conseguir sobreviver exportando mais "commodities" agrícolas e minerais para pagar importações de computadores", constata o presidente da AEB, Marcus Vinícius Pratini e Moraes. O governo sabe disso e, por isso, tenta colocar em prática o que denomina de uma política de competitividade e investimentos. "Isso é política industrial mas sem os ranços do passado", diz Lídia Goldenstein. Para atrair esses investimentos, subsídios e reserva de mercado são palavras inexistentes. O principal mecanismo, em funcionamento, são as linhas de crédito do BNDES. "Pessoalmente, gostaria de dispor de mecanismos como os da índia, mas é difícil, no Brasil", explica ela. O governo indiano possui uma agência para atração de investimentos onde o cardápio é montado de acordo com as necessidades específicas de cada empresa. E isso é diferencial que conta. Funciona, no mundo, um verdadeiro mercado de países que buscam atrair as empresas. Algo parecido como a guerra fiscal entre os estados brasileiros na disputa por investimentos. Ganha quem oferecer mais. Foi o que sentiu um dirigente da Motorola brasileira que, recentemente, esteve nos Estados Unidos para tentar convencer seus fornecedores a virem para o Brasil. Dos três com os quais conversou, conseguiu o compromisso de dois. No terceiro, chegou tarde. A empresa já havia fechado com o governo indiano. As comparações do poder de compra das exportações brasileiras são preocupantes e chegam, até mesmo, a minimizar a importância do conceito de vantagens comparativas. Para importar um computador Pentium Multimídia, por exemplo, o Brasil precisa exportar 200 toneladas de minério de ferro, 30 toneladas de soja ou quatro toneladas de carne de frango. Para Pratini de Moraes, o pouco dinamismo das exportações brasileiras não vai se alterar a curto prazo. Em seu entender, as causas são estruturais. O mesmo levantamento da AEB revela, também, que nos 33 grupos de produtos mais dinâmicos no comércio internacional, o Brasil não tem presença, à exceção do setor automotivo. Ainda assim, as exportações mundiais de automóveis, que movimentam negócios da ordem de US$ 300 bilhões por ano, têm uma taxa anual média de crescimento de 9,2%. Ou seja, estão entre as quatro últimas em dinamismo. Numa outra comparação, é possível constatar que entre os produtos com taxa média de crescimento no comércio mundial acima de 18% ao ano, o Brasil participa apenas com papel, papelão e artefatos de madeira. O documento preparado por Pratini de Moraes com base em dados United Nations Trade and Commerce Development (UNCTAD), o organismo das Nações Unidas responsável pelo desenvolvimento do comércio mundial, mostra, de forma dramática, um quadro que o governo conhece. "O padrão industrial do mundo mudou e nós temos que nos adequar a ele. A política que estamos formulando é uma maneira de se adequar aos dados dessa tabela", explica Lídia Goldenstein. "Nós já temos uma escala de mercado que justifica esses investimentos", acrescenta. Em dois setores, as condições são especialmente favoráveis: telecomunicações e bens de capital. Ambos alavancados pelos pesados investimentos que o Programa Nacional de Desestatização (PND) já está propiciando. Pratini de Moraes revela que vem realizando reuniões periódicas com o ministro Malan e com o diretor da Área Externa do Banco Central (BC), Gustavo Franco. Franco defende uma política horizontal de atração de investimentos nos mesmos moldes da apoiada por Malan e sua equipe. Franco usa a imagem de um trem para definir o lugar do Brasil na corrida tecnológica. Na locomotiva vão os países das economias centrais que produzem as inovações de fato. Nos vagões seguintes, as economias que, em ordem decrescente, conseguem absorver tecnologia e implantar parques industriais modernos. O Brasil, atualmente, está no meio do trem mas, diz ele, tem condições de ocupar os carros imediatamente atrás dos líderes. A perda de participação do Brasil no mercado mundial acelerou-se em 1996 quando as vendas externas do País cresceram apenas 2,67%. Enquanto isso, o comércio internacional expandiu-se à taxa média de 8%. Os produtos básicos lideraram o crescimento brasileiro. Além disso, o aumento das exportações deveu-se, essencialmente, ao volume físico embarcado enquanto os preços sofreram ligeira queda de 0,11%.