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Quem foi Helio Jaguaribe. E suas ideias para o país

Publicado em 10 setembro 2018

Por Murilo Roncolato

Helio Jaguaribe viveu 95 anos, atravessou diferentes governos e momentos do Brasil – ora influenciando, ora efetivamente participando da vida política –, e ainda assim se manteve confiante sobre o futuro do país.

“Sou bastante otimista em relação ao Brasil. O que nos faz um país eficaz é que ele assim se torna independente de vontades individuais, é um processo coletivo em marcha. O que dá grande estabilidade ao Brasil não é que seja um país com um grande condutor, em que um fenômeno específico esteja favorecendo. Não: somos um país cuja rotina é orientada na direção correta. O desenvolvimento sustentável é aquele que se faz por rotina”, disse o intelectual ainda em 2009.

Jaguaribe morreu neste domingo (9), vítima de falência múltipla dos órgãos, em sua casa no Rio de Janeiro, deixando esposa e cinco filhos. O corpo será velado na quarta-feira, às 10h, na sede da ABL (Academia Brasileiras de Letras), onde ocupava a cadeira de número 11.

Como reconhecimento do valor da sua obra, que inclui mais de 40 livros publicados, Jaguaribe foi nomeado imortal das letras em 2005. A ele, o presidente da ABL, Marco Lucchesi, se referiu como sendo “um dos últimos grandes intérpretes de nosso país”, que “estudou o Brasil para transformá-lo, mediante uma abordagem desenvolvimentista”.

Marco Lucchessi

Em nota da ABL na segunda-feira (10)

Carioca nascido em 1923, Helio dedicou sua vida e carreira a pensar o Brasil pelo viés da sociologia, da história e da política, ao mesmo tempo em que buscava transformar esse conhecimento em propostas de desenvolvimento para o país.

Tal propósito, ele uma vez disse, era mera herança do pai, o general do Exército Francisco Jaguaribe Gomes de Matos. “Ele era um homem de cultura com um profundo espírito cívico e ético. Ele me incutiu as ideias de amor e dedicação ao país, de sentido público”, afirmou.

O posto do pai deu condições a Jaguaribe de estudar e se formar, em 1946, em Direito na PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio. De lá, trabalhou em um escritório de advocacia antes de abrir o seu próprio e passou a escrever para o Jornal do Comércio sobre temas ligados à política no suplemento de cultura do diário.

Em 1959, depois de deixar o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (veja mais abaixo), voltou-se aos negócios da família, dona da Companhia Ferro e Aço de Vitória, buscou recursos públicos e privados e alavancou os negócios da siderúrgica. Jaguaribe abandonou sua posição como executivo e voltou a se dedicar à academia como consequência do golpe militar de 1964.

Aos 29 anos, Helio Jaguaribe fundou com um grupo de colegas das ciências sociais o Ibesp, acrônimo de Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política, com o objetivo de “estudar os problemas que a sociedade brasileira enfrentava para ultrapassar o estágio de subdesenvolvimento”.

Entre outros, faziam parte intelectuais como Cândido Mendes de Almeida, Inácio Rangel, Israel Klabin, Roland Corbisier e Miguel Reale. Com o selo do Ibesp, o grupo passou a publicar ensaios sobre problemas e soluções para o país na revista “Cadernos do Nosso Tempo”. Nela, Jaguaribe assinou os textos “A crise brasileira” e “Para uma política nacional de desenvolvimento”, entre outros.

O Ibesp deu origem ao Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), órgão criado por decreto presidencial e localizado dentro do Ministério da Educação, onde Jaguaribe passou a chefiar o departamento de ciência política.

Em um filme sobre a trajetória e o pensamento de Jaguaribe, intitulado “Tudo é Irrelevante: Helio Jaguaribe”, de 2017, o professor e diplomata Sérgio Paulo Rouanet se refere ao Iseb como sendo a “mais formidável máquina de pensar que o Brasil já teve”.

Arquivo do Cpdoc (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) da FGV sobre Helio Jaguaribe

Em 1959, após discordar dos rumos do Iseb em divergência com o então diretor Roland Corbisier, Jaguaribe deixou o instituto para se dedicar à siderúrgica da família. Com a ditadura militar, em 1964, deixou o Brasil e passou a dar aulas de sociologia em universidades nos Estados Unidos, como Harvard (1964-1966), Stanford (1966-1967) e MIT (1968-1969).

De volta ao Brasil em 1969, assumiu aulas na Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro, onde dirigiu o departamento de assuntos internacionais. Dez anos depois, adentrou como decano o recém-criado Iepes (Instituto de Estudos Políticos e Sociais) e lá ficou até 2003, dando lugar ao cientista político e professor Francisco Weffort.

Jaguaribe tem na conta honrarias como o título de Doutor Honoris Causa da Universidade de Johannes Gutenberg, na Alemanha, da Universidade Federal da Paraíba e da Universidade de Buenos Aires. Além disso, o intelectual já foi laureado pela sua obra, em 1996, com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico e, em 1999, com a Ordem do Mérito Cultural.

Embora tenha baseado sua produção acadêmica no debate intelectual de ideias e propostas para o país, sua passagem pela política de fato foi breve e discreta.

Em seus tempos no Iseb, influenciou o governo de Juscelino Kubitschek, que materializou suas ideias desenvolvimentistas sob a proposta “50 anos em 5”. Em 1985, entregou um plano ao presidente José Sarney com metas para o país chamado “Brasil 2000”, e três anos depois participou da fundação do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira).

Por fim, em sua atuação mais direta na vida política, passou a ocupar o cargo de secretário de Ciência e Tecnologia, em 1992, durante o governo de Fernando Collor de Mello. Com o impeachment sofrido pelo então presidente, Jaguaribe deixou o posto.

Em 2009, em entrevista ao jornalista Carlos Haag, na Revista Fapesp, Jaguaribe comentou sobre suas expectativas em relação ao país e compartilhou algumas de suas ideias sobre problemas e soluções nacionais. Do seu leque de frases, o Nexo destaca algumas:

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