Um estudo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) está investigando o acúmulo de microplásticos nos camarões-de-sete-barbas (Xiphopenaeus kroyeri) do litoral de São Paulo. Os pesquisadores já observaram o detrito no trato gastrointestinal entre 80% e 90% dos crustáceos avaliados até o momento. Veja, mais abaixo, os riscos que ingerir essas partículas podem trazer.
O estudo desses camarões é conduzido pelo campus de Bauru. Conforme divulgado nesta quarta-feira (22) pela Agência FAPESP, o objetivo é avaliar tanto os riscos ecológicos dessa poluição quanto possíveis impactos para a saúde humana, considerando a ingestão desses crustáceos pela população.
A pesquisa, que é apoiada pela FAPESP no âmbito do Programa Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (Biota), está sendo realizada em duas regiões: a Baixada Santista, que abrange áreas industriais, portuárias e pesqueiras com grande impacto ambiental, e Cananéia, região de menor intervenção humana e mais preservada, no litoral sul de São Paulo.
Grande quantidade
De acordo com informações da FAPESP, embora a quantidade de partículas varie entre os locais, o fato de que a contaminação está presente em uma porcentagem tão alta dos animais levanta questões sobre as consequências a longo prazo para os consumidores e o meio ambiente.
“A nossa proposta é comparar como camarões de ecossistemas tão diferentes respondem à exposição a microplásticos”, explicou Daphine Herrera, pós-doutoranda do projeto e bolsista da FAPESP.
Ela acrescentou que camarões, por serem detritívoros (alimentam-se de detritos no fundo do mar), estão expostos a grandes quantidades de microplásticos presentes nos sedimentos marinhos. “Esse hábito facilita a análise de bioacumulação de microplásticos em seu organismo, tornando-os modelos ideais para o estudo”.
Microplásticos
Ainda segundo a FAPESP, os microplásticos são pequenas partículas com menos de 5 milímetros de tamanho. Eles são responsáveis por 92,4% dos detritos de plástico marinho e estão presentes por todo o ambiente oceânico, da coluna de água às praias e até no oceano profundo.
Os microplásticos podem trazer graves consequências para a vida marinha e, posteriormente, para os seres humanos que comem frutos do mar. Em resposta a isso, os pesquisadores do Laboratório de Biologia de Camarões Marinhos e de Água Doce da Unesp procuram identificar os níveis de contaminação por microplásticos nos camarões-de-sete-barbas pescados no litoral paulista.
Quem ingere?
A nutricionista de Santos Eloisa Pacheco de Almeida realtou para A Tribuna que um canudinho plástico ou sacola que vai parar no mar, por exemplo, vai se desmanchando em partes cada vez menores.
“Os animais marinhos mais contaminados por essas partículas são os moluscos, como mariscos, mexilhões, ostras, polvos e lulas, mas também são encontrados em crustáceos, como os camarões, e em menor proporção em várias classes de peixes", explicou a especialista.
Segundo ela, pesquisadores, em 2019, analisaram a situação dos peixes dos rios Amazonas e Xingu, encontrando resíduos plásticos em cerca de 30% deles. "Porém, é importante considerar que moluscos são consumidos inteiros, enquanto os peixes maiores apenas uma parte. Do aspecto nutricional, o consumo dessa carne proporciona importantes benefícios à saúde, como vitamina B12, ferro, cálcio, fósforo, iodo, cobalto, ácidos graxos essenciais e ômega 3, diminuindo riscos de doenças cardiovasculares e auxiliando no bom funcionamento do sistema nervoso. Portanto, eliminá-los da dieta seria um prejuízo”, explica.
Riscos à saúde
O médico Bruno Pompeu Marques explicou para A Tribuna que, quando essas micropartículas são ingeridas, elas podem ficar presas nas malhas e na mucosa do intestino, sendo absorvidas pela corrente sanguínea e acabando impregnadas no fígado, pulmão ou outros órgãos. "Essas estruturas químicas, oriundas do microplástico que os animais comeram - e depois nós ingerimos esses animais - ainda têm resultados incertos sobre o mal que podem causar. Há estudos sendo feitos que mostram uma reação do nosso organismo na tentativa de expulsar, eliminar ou isolar essas substâncias nocivas, e é aí que podem começar a surgir células malignas, dando início à formação de tumores, principalmente no trato gastrointestinal", explicou o médico.
Como funciona a pesquisa da Unesp
Primeiramente, a pesquisa avalia o nível de exposição no trato gastrointestinal dos camarões, onde os microplásticos podem ser detectados inicialmente. Outro objetivo central do projeto é compreender se a contaminação por microplásticos afeta também a qualidade nutricional dos camarões, o que pode ter implicações importantes para o consumo humano.
Essa análise corresponde à próxima fase do projeto, que buscará avaliar se os microplásticos detectados nos camarões estão se acumulando em outros tecidos além do trato gastrointestinal, como na musculatura, que é justamente a parte mais consumida pelos seres humanos.