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Qual é o risco do morcego transmitir doenças infecciosas? Pesquisa em SP busca respostas (41 notícias)

Publicado em 20 de maio de 2024

Por Ramana Rech

Um grupo de pesquisa do Institut Pasteur de São Paulo (IPSP) vai investigar os grupos virais presentes em morcegos da Mata Atlântica. O objetivo é conhecer a diversidade de vírus existentes nesses animais e, depois, buscar responder qual o potencial desses agentes de contaminar outros mamíferos ou mesmo seres humanos.

Liderado pelo pesquisador do IPSP Luiz Gustavo Góes, o projeto tem previsão de durar quatro anos e está sediado na Cidade Universitária da Universidade de São Paulo (US P), em São Paulo. O projeto conta com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e do Institut Pasteur de Paris. O IPSP é uma instituição formada pela fundação francesa e pela USP.

A escolha do animal está relacionada com o histórico dele no surgimento de vírus com contaminação em seres humanos. Na comunidade científica, as pesquisas sobre essa interação começaram a render frutos a partir da década de 1990.

Em 2002, houve o primeiro surto de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), que começou na China. Mais tarde, pesquisadores descobriram que o vírus Sars-Cov, parente do Sars-Cov-2, tinha origem em morcegos. No caso do Sars-Cov-2, vírus que deu origem à pandemia de 2020, essa relação com os morcegos não foi comprovada, destaca Góes.

Ele destaca, entretanto, a necessidade de não estigmatizar esses mamíferos voadores. Os morcegos têm grande importância ecológica e atuam no controle de insetos, o que diminuiu a exposição de seres humanos a vetores de doenças. Também se alimentam de animais considerados praga para a agricultura, o que diminui a necessidade de pesticidas.

As espécies que se alimentam de néctar ou de frutas têm papel fundamental como polinizadores e dispersores de sementes.

O pesquisador já trabalhou em estudos anteriores que tratavam da relação entre esses animais e vírus com potencial de infectar humanos, como em seu pós-doutorado. No trabalho, ele e outros colegas sugeriram que morcegos são um reservatório subestimado de arenavírus. Esses agentes podem causar uma grave síndrome febril hemorrágica em humanos.

Algumas características podem aumentar a predisposição de determinada região de se tornar origem de doenças emergentes. Algumas delas são presença de floresta úmida, desflorestamento, urbanização e aumento de contato entre humanos e animais silvestres.

"Quando a gente olha todos esses fatores, o Brasil é classificado como uma região potencial para o surgimento de doenças emergentes", conta Góes.

Com isso, os pesquisadores poderão levar sua análise um passo adiante por terem acesso a diferentes órgãos, como intestino, pulmão, rins, baço, fígado. Para realizar o diagnóstico de raiva é necessário matar o animal para extrair o conteúdo do cérebro. A ideia é que o não utilizado pelos centros centros de zoonose seja enviado para o laboratório na Cidade Universitária.

Segundo Góes, vírus diferentes têm propensão de infectar órgãos diferentes. Obter acesso a diversos tecidos de morcegos irá viabilizar a busca por vírus emergentes.

O grupo irá analisar o material genético coletado e comparar com o que já existe na literatura e no banco mundial de dados genéticos para verificar se é um vírus novo. Se necessário, os pesquisadores irão fazer as primeiras análises para observar se o vírus tem potencial de infectar outros animais, como seres humanos.

"É um passo inicial para se conhecer o potencial zoonótico desses agentes e tentar traçar se existe um risco de emergência", diz o pesquisador.

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