Quatro anos após a epidemia de Zika Vírus no Brasil, a ciência deu um importante passo na busca por fármacos que evitem os transtornos causados pela doença. Ao inibir uma proteína no organismo, o sistema imunológico foi capaz de combater com muito mais facilidade a replicação do agente patológico. Testes feitos no Brasil mostraram que a terapia ainda é capaz de prevenir a microcefalia e outras mal formações em fetos.
Os resultados das análises, que ainda estão conduzidas em laboratório, foram publicados ontem na revista Nature Neuroscience, uma das mais renomadas desse seguimento a nível global.
A equipe de pesquisadores da Universidade de São Paulo usou uma droga experimental capaz de fazer esse bloqueio proteico. Houve resultados também na replicação do vírus da dengue.
Segundo informações da Fapesp, uma das apoiadoras do estudo, o modelo experimental usado é o mesmo que, em 2016, comprovou a relação entre o zika e o nascimento de crianças com crânios menores que o normal.
Fêmeas prenhas de camundongos receberam doses do medicamento antes de serem expostas ao vírus. Toda a gestação foi monitorada e, após o nascimento, os filhotes tinham cérebros com tamanho e peso normais e uma carga viral muito mais baixa que a do grupo não tratado, quase indetectável, tanto na placenta como no sistema nervoso central. Além disso, análises histopatológicas mostraram que não houve redução na espessura do córtex e que o número de células nervosas mortas pelo vírus foi muito menor.
O professor do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB-USP) Jean Pierre Peron, coordenador da investigação ao lado dos pesquisadores Cybele Garcia (Universidad de Buenos Aires, Argentina) e Francisco Quintana (Harvard Medical School, Estados Unidos), considera necessário repetir o estudo com macacos antes de partir para os testes do inibidor proteico em humanos. O problema é que esse estudo com roedores levou quatro anos para ser concluída.
Enquanto o desenvolvimento de um remédio capaz de evitar o nascimento de bebês com mal formações, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) da Bahia reforça o alerta de que neste momento somente o cuidado com os criadouros do mosquito que transmite a doença é capaz de evitar um novo surto ou até mesmo epidemia, a exemplo do que aconteceu no país há quatro anos.
Os cientistas identificaram que circula em território nacional um tipo mais agressivo do zika. Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado em junho, o doutor em bioinformática Artur Trancoso Lopo de Queiroz disse que a doença causada por essa cepa pode causar sintomas mais fortes e ainda não foi possível descobrir se quem já foi contaminado com o primeiro tipo está imune ao segundo.
Além disso, esse tipo recente no Brasil também causa microcefalia. Estão presentes condições para um novo surto, embora os cientistas não batam o martelo a respeito porque a doença carece de respostas que somente futuras pesquisas serão capazes de dar.
DADOS
Segundo informações da Secretaria de Saúde de Mato Grosso do Sul, na epidemia de 2016 houve 1.737 casos de Zika no Estado. Os dados mais recentes foram divulgados dia 1º. Em 2020 já foram 62 pessoas infectadas pela doença, das quais 12 estão em Dourados, oito em Campo Grande, duas em Bonito.
São Gabriel do Oeste, Chapadão do Sul, Três Lagoas, Fátima do Sul e Caarapó têm um caso, cada uma.