O Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) aprovou em sua reunião de agosto diretrizes novas para a política de propriedade intelectual gerada em projetos de pesquisa financiados integral ou parcialmente pela agência. Até aqui, a fundação coloca como condição para a concessão de financiamento ser a titular exclusiva da propriedade intelectual (PI) eventualmente gerada. No caso de licenciamento de patentes, pela regra em vigor, a Fapesp compartilha os benefícios, na proporção de um terço para si; um terço para o pesquisador; e um terço para quem o emprega — em geral, as universidades e institutos de pesquisa. Esse tem sido também o padrão da fundação nos projetos de pesquisa voltados para a inovação tecnológica, que ocorrem com a participação de empresas.
A partir da implementação das novas diretrizes — ainda não completada —, a titularidade da propriedade intelectual fruto dos projetos de pesquisa acadêmicos passará a ser da universidade ou do instituto de pesquisa que emprega o pesquisador. No caso de projetos em parceria universidade-empresa, um convênio entre ambas pode estabelecer o compartilhamento da patente, marca ou modelo de utilidade. A empresa poderá ter a titularidade exclusiva, se ressarcir a outra parte. Em todos os casos — puramente acadêmicos ou em parceria — a Fapesp, mediante convênio com a universidade ou instituto de pesquisa, exigirá participação nos eventuais benefícios auferidos pela comercialização da PI.
As novas regras também explicitam que a Fapesp continuará a apoiar as instituições de pesquisa que desejem seu auxílio para buscar proteção da propriedade intelectual. Nesses casos, se e quando houver benefícios advindos da comercialização da PI, a agência quer ser ressarcida de suas despesas antes da distribuição das eventuais receitas. O fato de a Fapesp não mais exigir a titularidade em todos os casos não significa que a agência não possa tê-la, quando as instituições de ensino superior e de pesquisa considerarem necessária sua participação. As diretrizes deixam margem à negociação caso a caso.
As regras vigentes até aqui levaram a Fapesp a depositar 83 pedidos de patente entre 1999-2003, segundo os dados mais recentes divulgados pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) (veja tabela). No setor acadêmico, é a segunda maior patenteadora no período, e a sexta maior do País.
As razões da mudança
Disseminar a cultura de valorização da PI, e contribuir para a difusão do conhecimento, foram os motivos principais da mudança da política, de acordo com o diretor científico da Fapesp, Carlos Henrique de Brito Cruz. Outro objetivo foi adequar as regras da Fapesp à lei de patentes vigente no Brasil desde 1996, onde se estabelece que a PI pertence ao empregador. Leia a entrevista, concedida por e-mail a Inovação:
Que razões levaram a Fapesp a mudar as regras de proteção da PI?
Primeiro, a estratégia da fundação de estimular o desenvolvimento de uma cultura de valorização da propriedade intelectual nas instituições de ensino superior e pesquisa
Para que proteger a propriedade intelectual no setor acadêmico?
O objetivo mais geral é contribuir para a difusão do conhecimento; e não a geração de receitas extraordinárias. É importante explicitar essa diferença, pois é comum que instituições universitárias e de pesquisa se iludam com a possibilidade de receitas advindas de patentes, perdendo de vista seu compromisso fundamental com a geração e difusão do conhecimento. É fato bem documentado que pouquíssimas universidades no mundo ganham mais dinheiro com patentes do que o que gastam em seu registro e defesa. Mesmo assim, deve fazer parte dos objetivos das instituições registrá-las, sempre que isso seja do interesse da difusão do conhecimento.
Que vantagens a nova política trará para projetos de pesquisa conjuntos com empresas, como os do Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE)?
A primeira vantagem está na regularização dos registros e dos acordos, explicitando-se os direitos da instituição que abriga o projeto. Ao lado disso, a Fapesp passará a exigir o estabelecimento de um convênio formal entre a instituição e a empresa parceira para a liberação do financiamento. Com isso, valoriza o envolvimento da instituição como um todo na supervisão e viabilização do projeto em parceria, que deixa de ser assunto exclusivo do pesquisador; e estimula que se evite o uso de intermediários desnecessários.
A Fapesp aparece em sexto lugar entre os maiores patenteadores do País, no período 1999-2003, segundo o INPI. Que avaliação o senhor faz de a fundação estar nessa posição?
Nessa mesma lista, a Unicamp aparece como maior patenteadora do Brasil. É um resultado que demonstra a vitalidade invejável da comunidade acadêmica paulista na atividade de pesquisa e na transformação de resultados de pesquisa em possíveis aplicações. O resultado demonstra também que a atividade de patenteamento acompanha a produção científica competitiva internacionalmente — e não compete com ela. Este é um fato conhecido nas boas instituições de pesquisa internacionais: aquelas que publicam mais e melhores artigos em revistas de circulação internacional também produzem mais patentes relevantes. É um resultado da intensificação da conexão entre ciência e tecnologia. Finalmente, e por um prisma menos positivo, o resultado expõe a fraqueza das indústrias no Brasil em produzir propriedade intelectual competitiva, exatamente porque elas não conseguem, devido a importantes restrições presentes no ambiente econômico nacional, contratar mais cientistas para fazer pesquisa como seus empregados.
O que será feito do estoque de patentes da fundação? Alguma patente da fundação foi comercializada?
A Fapesp tem o objetivo de criar oportunidades para a comercialização deste acervo de PI. Isso requer experiência e também o aumento do acervo. Esse esforço, que já está sendo feito, será intensificado com a colaboração das agências de inovação das instituições. Há pelo menos uma patente da Fapesp licenciada e, embora os royalties sejam pequenos, é um interessante exemplo: trata-se de uma patente sobre revestimento superficial para endurecimento de superfícies.
O que vai acontecer com o Núcleo de Patentes e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec)?
O Nuplitec continuará prestando serviços à pesquisa paulista, pois a Fapesp vai continuar, e pretende mesmo intensificar, o apoio às instituições de ensino superior e pesquisa em São Paulo no registro de sua PI. As maiores instituições têm escala suficiente para organizar agências de inovação ou escritórios de patentes e transferência de tecnologia, mas muitas outras carecem desta escala e se beneficiam do Nuplitec.
Quando a nova política entrará em vigor?
Estão sendo redigidas as novas versões dos Termos de Outorga e uma minuta padrão de convênio com as instituições de ensino superior e pesquisa