SÃO PAULO - A onda de aposentadorias nas universidades faz muito barulho, mas terá reflexos modestos na produção científica brasileira. Só nas universidades federais, cerca de mil professores pediram aposentadoria no ano passado, mas é um erro imaginar que eles vão vestir o pijama e desistir do trabalho a que se dedicam há décadas. Muitos pesquisadores, mesmo aposentados, continuarão vinculando ás suas instituições. Outros buscarão novos empregos em sua área de atuação, em faculdades particulares ou empresas.
"O Brasil é um país carente na área científica e os recursos humanos desta área serão logo assimilados", prevê Sérgio Ferreira, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
No Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos, sete pesquisadores e técnicos pediram aposentadoria em janeiro. Mas o problema não é tão grave quanto parece,
O coordenador da área de engenharia do Inpe. Oscar Pereira Dias Júnior, 47 anos, é o pesquisador mais graduado da lista que se aposentou este ano. Estava no Inpe desde 1972. Vai fazer falta? Não, porque continuará dando expediente no instituto, agora num cargo comissionado, o de assessor da presidência. "Isso aqui é a minha vida. Enquanto me quiserem, continuo trabalhando", afirma Oscar.
O caso do engenheiro do Inpe mostra que, a impulsionar a corrida, não há apenas a iminente mudança na lei da previdência. Os professores que adiantam a aposentadoria estão insatisfeitos com os baixos salários que recebem. A saída antecipada é uma forma de preservar um direito e garantir um novo salário, num novo emprego.
No topo da carreira no Inpe, o engenheiro Oscar Pereira Dias Júnior ganhava apenas R$ 2.400 mensais, muito pouco para um pesquisador com sua experiência. Com a aposentadoria, ele passa a receber dois contracheques.
Realidade nas universidades federais, a corrida ao pijama não atingiu a Universidade de São Paulo (USP). O que separa a USP das instituições federais é um abismo de dinheiro. A USP chega a pagar o dobro do salário para seus professores e sempre consegue atrair recursos para suas linhas de pesquisa.
O governo federal está propondo soluções que combatam a raiz do problema. O ministro da Ciência e Tecnologia, José Israel Vargas, quer reestruturar a carreira dos pesquisadores de institutos como o Inpe, que hoje recebem salário 35% menor que o de um professor de universidades federais.
O ministro da Educação. Paulo Renato Souza, chefe das universidades federais, anunciou, na semana passada, a criação de bolsas para professores com tempo de se aposentar. Eles receberiam um salário adicional e continuariam na ativa, adiando a aposentadoria.
A idéia é boa. Tão boa que o próprio ministério, desde 1991, já oferece bolsas desse tipo. A Coordenação de Apoio ao Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação ligada ao MEC, criou há cinco anos o programa Dedicação Acadêmica, no qual os professores adiam a aposentadoria em troca de uma bolsa de R$ 1.800. Os resultados são positivos. Até o ano passado, mais de 300 professores se beneficiaram do programa.
Um deles foi o presidente da SBPC, o professor de farmacologia Sérgio Ferreira. Um dos mais produtivos pesquisadores de sua área. Ferreira, de 61 anos, podia ter-se aposentado há três. Ele é professor-titular da Faculdade de Medicina da USP, na cidade de Ribeirão Preto, interior paulista.
"Não tenho nenhum motivo para me aposentar", diz Ferreira. "Ganho um salário razoável, a pesquisa a que me decido tem financiamento de várias instituições e ainda tenho a bolsa da Capes para continuar trabalhando."
Ferreira até critica a bolsa que recebe: "A bolsa deveria ser atrelada aos resultados da pesquisa, mas, em vez disso, funciona como uma ajuda institucional." O MEC tem agora a chance de corrigir este equívoco.
O reitor da USP. Flávio Fava de Morais, orgulha-se da ausência de sua instituição no rol das universidades que perdem docentes. "Se a gente deixasse, os professores-titulares, aqueles que têm mais poder e prestígio, atrasariam a aposentadoria, que é compulsória aos 70 anos de idade. Alguns gostariam de ampliar a idade-limite para 75 anos...", diz ele.
Notícia
Jornal do Brasil