Diretor científico da Fapesp ressalta que compras públicas poderiam ser usadas como estímulo à ciência e tecnologia
Entrevista: Carlos Henrique de Brito Cruz
Disponibilizar no mercado novos produtos, processos ou serviços criados a partir de idéias da ciência e da tecnologia. Essa é a definição de inovação tecnológica feita pelo professor Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que aponta a falta de integração entre universidades e empresas como o principal problema no Brasil.
Segundo ele, as recentes medidas do Governo Federal para o setor são esvaziadas pela política econômica, que desestimula as empresas a investirem em Pesquisa e Desenvolvimento.
Brito Cruz ressalta que algumas das providências recentes ainda demorarão para mostrar efeitos, como o programa de subvenção à P&D empresarial e a Lei 11.196, que prevê beneficios fiscais relevantes para investimentos nessa área:
Agenda São Paulo: Qual o papel das universidades na promoção de inovaçao?
Carlos Henrique de Brito Cruz: Formar pessoas capazes de criar inovação tecnológica para quando forem trabalhar como pesquisadoras nas empresas.
ASP: E o papel das empresas?
CHBC: Entender o mercado e aproveitar as oportunidades para criar inovação. Isso requer atividades internas de pesquisa e desenvolvimento.
ASP: Esse mecanismo funciona em São Paulo?
CHBC: Sim, mas há desafios importantes a resolver. Por causa de várias restrições da economia brasileira, as empresas não conseguem intensificar as atividades de pesquisa e desenvolvimento e garantir assim competitividade com as concorrentes do resto do mundo.
ASP: Quais os instrumentos de que dispõe o governo estadual para articular as ações de universidades, institutos e setor privado?
CHBC: São três iniciativas principais. A Fapesp tem o programa PITE, que apóia projetos de pesquisa em parceria entre universidades, institutos de pesquisa e empresas; e o PIPE, de apoio a projetos de pesquisa inovativa em pequenas empresas. O Governo do Estado tem o Programa Estadual de Parques Tecnológicos.
ASP: Quais as dificuldades enfrentadas para essa maior articulação?
CHBC: Sem pesquisadores nas companhias, torna-se quase impossível uma articulação efetiva com instituições acadêmicas. Essas políticas devem procurar atrelar a pesquisa acadêmica com a pesquisa industrial, e não substituir uma pela outra. Para promover articulação é preciso haver pesquisadores na empresa, capazes de dialogar e trabalhar em parceria com seus colegas na academia. Além disso, não é possível supor que o governo estadual compense as deficiências do Brasil com políticas próprias, por isso é preciso ter políticas articuladas entre Estados e União.
ASP: Quais as iniciativas da política de inovação paulista?
CHBC: Uma delas é o programa da Fapesp para financiar pesquisa inovativa em pequenas empresas, o PIPE. Já são 500 apoiadas pelo programa, que receberam até R$ 500 mil cada uma para produzir inovação. Algumas delas já conseguiram desenvolver projetos inovadores e crescer baseado nisso.
ASP: Existem outras formas de financiamento no Estado?
CHBC: Outro programa é o Sistema de Parques Tecnológicos, da Secretaria de Ciência e Tecnologia. Trata-se da organização de cinco parques tecnológicos e mais alguns arranjos produtivos, com o objetivo de criar ambientes favoráveis para atrair e viabilizar centros de pesquisa e desenvolvimento ligados a empresas nacionais ou estrangeiras. Um dos resultados pode ser observado em São José dos Campos, onde a parceria entre Embraer, Instituto de Pesquisa Tecnológica e Istituto Tecnológico da Aeronáutica desenvolveu um centro de pesquisa sobre estruturas leves, inaugurado há duas semanas. O Estado de São Paulo também investe em universidades de pesquisa, que atrai para as proximidades dessas instituições a instalação de empresas de base tecnológica e centros de pesquisa.
ASP: Como o senhor avalia a atual política de inovação?
CHBC: Algumas ações são positivas, mas ainda existem desafios importantes, como a necessidade de um sistema mais bem articulado entre universidades, Fapesp e Secretaria da Ciência e Tecnologia.
ASP: O BNDES cumpre seu papel no estímulo à inovação?
CHBC: A partir de 2006, mudou a política operacional para focalizar também a questão da inovação tecnológica. O novo programa oferece recursos para empréstimo com juros bem subsidiado para empresas desenvolverem atividades de pesquisa próprias. Tem também o Funtec, que oferece dinheiro não reembolsável para instituições públicas firmarem parcerias com empresas na á rea de pesquisa.
ASP: É possível utilizar as compras públicas pra promover inovação?
CHBC: Esse é um dos instrumentos que nem o Brasil nem o Estado de São Paulo utilizam com intensidade, mas é importante porque ajuda a viabilizar investimentos, principalmente em setores estratégicos. A Embraer, por exemplo, foi criada a partir de compras públicas e encomendas da Força Aérea.
ASP: Quais são os exemplos nacionais e internacionais?
CHBC: As três práticas mais comuns são o apoio estatal à P&D acadêmica e industrial, a busca das indústrias por mercados internacionais e o setor acadêmico com referenciais de qualidade internacionais. A melhor política estatal para inovaçãoé a da Bahia onde criaram uma Secretaria de Ciência e Tecnologia em 2001, uma fundação de amparo à pesquisa, a Fapesb, e desde então praticam uma estratégia bem dirigida.
ASP: Como São Paulo e a Fapesp vêem a nova aposta federal na biotecnologia e nanotecnologia? O que pode ser feito nessa área?
CHBC: Há muitas oportunidades em São Paulo na área de Biotecnologia. A Fapesp expôs isso quando organizou o programa Genoma em 1999 e desde então apóia muito a área. Mais da metade da produção científica em nanotecnologia no país vem da USP [Universidade de São Paulo] e da Unicamp. Esta última tem um dos melhores casos de licenciamento de patente na área de nanotecnologia jamais feito no Brasil, um pigmento para tinta branca desenvolvido pelo Instituto de Química.
ASP: Qual a situação atual do Sistema Nacional de Inovação (SNI)? Qual a influência direta em São Paulo?
CHBC: Esse Sistema está em desenvolvimento, mas em velocidade menor do que a de alguns de nossos competidores, como China e Índia. No Brasil, o investimento em P&D retrai levemente desde 2001, tendo caido de 1,1% do PIB (2001) para 0,92% do PIB (2004). Se na área de Ciência, Tecnologia e Inovação o Governo Federal tem criado políticas imaginativas e positivas, estes avanços são esvaziados pela política econômica que desestimula o investimento e torna o ambiente hostil à inovação. O resultado é que nem a nível nacional ou Estadual, as empresas conseguem aumentar seus esforços de P&D.
Notícia
Jornal de Jundiaí