Estrutura foi formada por impacto de meteorito na idade Cretácea há milhões de anos; Unicamp pesquisa o fenômeno e há oito existentes no Brasil
Há milhões de anos um meteorito rompeu o céu e atingiu uma área de 12 quilômetros de diâmetro, localizada perto onde atualmente está a rodovia Bauru-Ipaussu, no município de Piratininga. Isso ocorreu no período Cretáceo, quando nessa região do Estado havia grandes répteis pré-históricos. O fenômeno é chamado de astroblema, cicatriz deixada na superfície da Terra por uma cratera de impacto. A estrutura existente na região está entre aos onze atingidas por corpo extraterrestre localizadas em toda a América Latina, oito delas estão no Brasil.
O Instituto de Geociências (IC) da Universidade de Campinas (Unicamp) pesquisa a cratera de Piratininga desde 2006. Isso possibilitou que a cava fosse incluída numa lista de registro desse tipo de fenômeno. O estudo desses meteoritos tem relevância para a ciência. O maior campo de gás do mundo fica na cratera de Chixulub, no México, que tem 170 km de diâmetro e é associada ao evento da extinção em massa ocorrido no limite Cretáceo-Paleogeno, que provocou a extinção dos dinossauros.
“Cabe ressaltar que a idade da estrutura de Piratininga é relativamente estimada no período Cretáceo, pós-magmatismo basáltico Serra Geral e pré-Bauru (135 a 95 milhões de anos), baseada pela janela estratigráfica encontrada na estrutura. A Cratera de Chicxulub é datada também do final do Cretáceo, mas em 65 milhões de anos”, explica o professor-doutor da Unicamp Carlos Roberto de Souza Filho. Na Terra há 174 estruturas geológicas reconhecidas como crateras de impacto genuínas. De acordo com a Revista Brasileira de Geografia Física, no Brasil são cinco crateras comprovadamente formadas por impacto de corpos celestes: Domo de Araguainha (MT/TO) com 40 km de diâmetro, Serra da Cangalha (TO) 12 km, Domo do Vargeão (SC) 12 km, Riachão (MA) 4,5 km e Vista Alegre (PR) 9,5 km.
De acordo com o professor Alvaro Crósta, em entrevista à revista ComCiência, as rochas fragmentadas pelo impacto são excelentes reservatórios para petróleo e gás. Em 1979, a PauliPetro na gestão do governador Paulo Maluf fez duas perfurações na região de Piratininga, mas só jorrou água sulfurosa o que possibilitou depois a instalação de um balneário. A caracterização sísmica da estrutura de impacto de Piratininga foi objeto de pesquisa pelo estudante Rogério Amaro Machado, sob orientação dos professores doutores Rodrigo de Souza Portugal e Carlos Roberto de Souza Filho, no IG da Unicamp.
Procurado pelo JC, Souza Filho declarou que a Estrutura de Piratininga está inserida na Bacia Geológica do Paraná, do qual correm dois sistemas (gerador-reservatório) petrolíferos comprovados, o Ponta Grossa-Itararé e Irati-Rio Bonito/ Piramboia. Por isso, segundo o especialista, já houve perfurações de poços na região, sem encontrar, no entanto, derivados de petróleo. O estudo aponta que a estrutura de Piratininga, conforme diversos autores, trata-se de uma cratera de impacto de meteorito de idade Cretácea. A estrutura tem cerca de 12 km de diâmetro em estágio avançado de erosão e está centrada nas coordenadas 22º30’S e 49º10’W.
Professor diz que evidências são fortes
Estrutura de Piratininga ainda é descrita como uma possível cratera de impacto, mas ela consta numa lista de 11 existentes na América Latina
O professor-doutor José Carlos Roberto de Souza Filho, do Instituto de Geociência (IC) da Unicamp, explica que há boas evidências geofísicas de que a Estrutura de Piratininga de 12 quilômetros de diâmetro seja uma cratera de impacto. A pesquisa feita por Rogério Amaro Machado veio acrescentar no que o pesquisador José Haciro descreveu em 1994. Mas para a comprovação são necessárias evidências de metamorfismo de impacto (processos que envolvem transformações sofridas pelas rochas, quando submetidas ao calor) ou cones de estilhaçamento, feições planares e deformação em grãos de quartzo (fração de pedras finas) [a transformação desses minerais pode ocorrer quando há liberação de energia resultante do impacto na superfície terrestre de um objeto do espaço]. O estudo dessas crateras de impacto é importante, porque há possibilidade de serem reservatórios de petróleo. Impactos de meteoritos podem criar várias condições geológicas que podem ser importantes para geração e preservação de hidrocarbonetos (petróleo e gás). Dentre estas condições, a mais importante é a geração de grandes reservatórios com altas taxas de fluxo, decorrente do fraturamento e brechação das rochas impactadas, formando brechas autóctones (natural do mesmo local). Outros produtos de impacto, como brechas alóctones (aquilo que não tem suas origens no lugar onde existe) e depósitos de materiais ejetados também podem apresentar alta porosidade e permeabilidade configurando um reservatório com boas qualidades para o acúmulo de hidrocarbonetos", explica o professor.
JC - Como foi possível chegar ao local dessa possível cratera de impacto de meteorito? As primeiras descobertas remontam à década de 70 quando foi denominada estrutura de Piratininga?
José Roberto - O acesso se dá pela Rodovia SP-225. A estrutura encontra-se em propriedades particulares (fazendas e sítios), desta forma, para ter acesso interno é preciso percorrer estradas rurais. Sim, no final na década de 70, poços perfurados pelo Departamento de Água e Energia Elétrica (DAEE) para captação de água subterrânea próximo ao município de Piratininga revelaram um adelgaçamento anômalo na cobertura basáltica da região. Rochas sedimentares do Grupo Bauru (Período Cretáceo) foram observados repousando diretamente sobre sedimentos Permianos [é o último período da era Paleozóica, após o período Carbonífero e antes do período Triássico do Mesozóico: durante esse período, as massas de terra do planeta formaram um único supercontinente]. As rochas permianas aflorantes no interior da estrutura, por estarem estratigraficamente muito acima da sua posição normal, caracterizam uma janela estratigráfica (ramo da geologia que estuda os estratos ou camadas de rochas, buscando determinar os processos e eventos que as formaram). Na década de 80, poços rasos e profundos foram perfurados próximo à cidade de Piratininga pela PauliPetro, visando determinar as características da estrutura e a sua prospectividade para petróleo. Esses estudos mostraram a existência de uma feição de aspecto circular, com desníveis entre blocos de falhas contíguas, segundo zonas elevadas e rebaixadas em seu interior.
JC - O que a pesquisa feita por Rogério Amaro Machado constatou na caracterização sísmica da estrutura?
José Roberto - Cabe ressaltar que no trabalho do Rogério Machado ele também usou dados aeromagnéticos, além do perfil sísmico, para caracterizar a estrutura. Esses dados foram obtidos junto a Agência Nacional de Petróleo (ANP). Em um dos produtos gerados a partir dos dados aeromagnéticos, denominado amplitude do sinal analítico de ordem (ASA-CMA) é possível observar uma estruturação circular, que coincide com a borda da estrutura observada nos produtos morfológicos (formas que a matéria pode tomar). No interior da estrutura, ocorre um pico anômalo de maior intensidade (alto magnético), localizado próximo ao centro. Esse pico é rodeado por uma anomalia de menor intensidade (média-baixa), que se estende para sudoeste até o contato com um alto magnético de direção que pode estar associado a borda da estrutura. Baixos valores magnéticos compõem um semi-círculo ao redor da anomalia positiva central, que se estende para fora dos limites da estrutura na porção norte e nordeste da imagem. Altos magnéticos locais podem estar presentes, principalmente próximos ao centro de crateras complexas, e têm sido interpretados como devido ao soerguimento do embasamento magnético abaixo da rocha alvo, à neo formação de minerais magnéticos por processo físicos (altas pressões - de choque, maiores que 30GPa e temperaturas superiores a 1000°C) e químicos (processos hidrotermais pós-impacto) Na seção sísmica quatro características se destacam: uma feição bem marcada pelo contraste formando, uma espécie de cunha achatada; falhas normais bem delimitadas a leste, formando terraços e falhas menores no setor oeste, interrupção das camadas a leste até o meio da estrutura e uma verticalização das camadas próximo ao centro da estrutura.
JC - O que falta para a comprovação que se trata de uma cratera de impacto de meteoro?
José Roberto - Embora a Estrutura de Piratininga tenha boas evidências geofísicas de se tratar de uma estrutura de impacto, para a confirmação de uma cratera de impacto, são necessários evidências de metamorfismo de impacto (transformações sofridas pelas rochas, quando submetidas ao calor/temperatura) e também existência de cones de estilhaçamento, feições planares de deformação em grãos de quartzo e feldspatos, polimorfos de quartzo de alta temperatura e pressão [Para a transformação desses minerais é necessária uma pressão superior a 40 vezes a pressão atmosférica padrão e uma alta temperatura que são características da potente liberação de energia resultante do impacto do meteorito com a superfície terrestre].
JC - Há pedaço ou fragmentos de meteorito encontrado nessa região? Pode esclarecer porque não pode ser considerada uma cratera de impacto baseado apenas em estruturas subterrâneas. O que falta para comprovar?
José Roberto - Não há nenhum fragmento do corpo impactante, isso ocorre devido alguns fatores, como clima tropical, predominante na maior parte do Brasil, o que favorece a ação do intemperismo, a erosão e geração de solos espessos alterando por completamente os fragmentos do meteorito, especialmente se ele for metálico. Além disso, como pode observar, a estrutura foi muito erodida.
JC - Qual a relação desse tipo de solo com a existência de petróleo. Há artigos científicos que fazem essa correlação devido as características antigas do solo. No município de Piratininga houve perfuração de poços na década de 70, mas não houve sucesso?
José Roberto - A Estrutura de Piratininga está inserida na Bacia Geológica do Paraná. Dentro dessa Bacia, correm dois sistemas (gerador-reservatório) petrolíferos comprovados, o Ponta Grossa–Itararé e Irati–Rio Bonito/Piramboia. O sistema petrolífero combina geração do óleo nos folhelhos permianos da Formação Irati com acumulação nos arenitos da Formação Rio Bonito/Piramboia. A formação Piramboia ocorre no Interior da Estrutura de Piratininga e por isso foi perfurado esses poços na região. Porém, não encontrou derivados de petróleo.
Bairro da capital fica em cratera
Um dos casos mais curiosos é a cratera de Colônia, em São Paulo, a pouco menos de 40 quilômetros do marco central da Praça da Sé. A vala produzida possivelmente pelo impacto de um objeto celeste há milhares de anos vem sendo amplamente estudada.
Um artigo publicado no Boletim da Sociedade Brasileira de Geologia sobre "Estudos preliminares de uma depressão circular na região de Colônia: Santo Amaro, São Paulo" foi assinado pelos professores Rudolph Kollert, Alfredo Björnberg e André Davino, da Universidade de São Paulo (USP).
A agência Fapesp divulgou em março de 2016 uma foto aérea da área. A cratera permaneceu ignorada até o início da década de 1960, mas as fotografias de satélites colocaram em evidência sua forma circular.
Igual a cratera de Piratininga, a fenda de Colônia ainda não é apontada como não comprovada. Há dúvidas se foi realmente criada pelo choque de um corpo extraterrestre, porque as estrutura circulares podem também ser resultados de vulcanismo.
Conforme a publicação da Fapesp, somente em 2013 uma pesquisa conduzida pelo geólogo Victor Velázquez Fernandes reuniu evidências que pode ser cratera de impacto cujo corpo celeste caiu há aproximadamente 20 milhões de anos e provocou um buraco de 3,6 quilômetros de diâmetro, com cerca de 300 metros de profundidade. Ela está localizada na região de Parelheiros. Nessa área denominada de Vargem Grande (não confundir com Vargem Grande Paulista município da Grande São Paulo) há várias habitações e grande carência de equipamentos urbanos.
Estrutura não tem mais fragmentos
Clima tropical ajudou a desintegrar e decompor as rochas após milhões de anos da estrutura de Piratininga, segundo explicações de especialista
A estrutura da possível cratera de impacto de Piratininga é difícil de ser avistada para quem circula pela rodovia SP-225. Não há nenhum fragmento do corpo impactante. De acordo com o professor Carlos Roberto de Souza, da Unicamp, o clima tropical, predominante na maior parte do Brasil, favorece a ação do intemperismo (conjunto de processos mecânicos, químicos e biológicos que ocasionam a desintegração e a decomposição das rochas), além da erosão e geração de solos espessos alterando por completo os fragmentos do meteorito, especialmente se ele for metálico.
A estrutura de Piratininga trata-se de uma cratera de impacto de meteorito de idade cretácea, pós-magmatismo basáltico Serra Geral e pré-Bauru (135 a 95 milhões de anos). Trata-se do mesmo período de quando caiu o meteorito que formou a cratera de Chicxulub, no México. O impacto teria sido responsável pela extinção em massa dos dinossauros.
É possível, no entanto, com aparelho de GPS centrar nas coordenadas 22º30'S e 49º10'W para traçar um círculo imaginário para verificar onde fica o diâmetro de 12 quilômetros da estrutura de Piratininga, localizada próxima da praça de pedágio da rodovia SP-225. Parte dela, à direita no sentido Bauru-Espírito Santo do Turvo, está a antiga estação de Alba, do antigo trajeto da estrada de ferro da Companhia Paulista, aberta em 1924, como prolongamento do ramal de Agudos, e foi a primeira das estações desbravadoras do sertão da Paulista. Em 1976, entretanto, com a inauguração da então chamada variante Bauru-Garça, feita pela Fepasa, Alba foi desativada em 1 de maio de 1976 e perdeu os trilhos.
O restante da cratera fica numa região com plantio de pinos. O geólogo Rogério Amaro Machado descreve no estudo "Caracterização Sísmica da Estrutura de Impacto de Piratininga" no Trabalho de Conclusão de Curso apresentado na Unicamp que a borda da estrutura tem contorno circular; parte externa na forma de uma depressão anelar com sedimentação pós impacto pouco espessa; sedimentação mais espessa sobre blocos abatidos e parte interna da estrutura falhada e soerguida. As evidências incluem estruturas em grão de quartzo encontrados na zona central da estrutura. O autor do estudo esteve na área e observou que está bastante modificado por processos erosivos.
Amaro cita que usou a geração de produtos aeromagnéticos (levantamentos são realizados para a determinação das variações de comportamento magnético da crosta terrestre, o que pode ser interpretado, como variações físicas e químicas dos materiais geológicos) e sísmicos para fazer a caracterização da subsuperfície da estrutura de Piratininga.
O método sísmico, também apresentou uma resposta positiva para a caracterização em subsuperfície da estrutura de Piratininga. Na seção sísmica foi possível observar algumas características típicas de crateras de impacto como (feição elíptica bem marcada pelo contraste litológico (formação, idade, coberturas, e todas as suas alterações desde o seu surgimento); falhas normais bem delimitadas mergulhando para o interior da estrutura associadas a terraços; interrupção no perfil das camadas estratigráficas (ramo da geologia que estuda os estratos ou camadas de rochas, buscando determinar os processos e eventos que as formaram) guias e uma verticalização das camadas próximo ao centro da estrutura.