Produzidos no Instituto, testes obtiveram alta eficácia pelo padrão ouro de análises, inclusive quando comparados com um exame já em uso no mercado
Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) atestaram a eficácia de três novos testes sorológicos para Covid-19. Desenvolvidos no próprio ICB, os testes usam o método ELISA (ensaio de imunoabsorção enzimática) para a detecção dos anticorpos contra o vírus SARS-CoV-2, e tiveram sua eficácia comparada com outro teste já em uso no mercado, o Elecsys, da farmacêutica Roche.
Publicado na revista Frontiers in Cellular and Infection Microbiology em junho deste ano, o trabalho foi feito com base em 1.119 amostras do sangue de pessoas que tiveram ou não tiveram contato com a doença. Os testes foram conduzidos no Hospital Universitário da USP ao longo do ano de 2020, portanto mostram um cenário ainda sem vacinas.
Na avaliação, o teste Elecsys, comercializado pela farmacêutica Roche, garantiu 96,92% de sensibilidade (capacidade de detectar casos positivos) e 98,78% de especificidade (capacidade de identificar casos negativos). O desempenho dos demais testes, do ICB, não ficaram aquém. O teste N-ELISA, que avalia uma proteína N completa do coronavírus, registrou 93,94% de sensibilidade e 94,40% de especificidade. Já o teste RBD-ELISA, que utiliza um fragmento da proteína Spike do coronavírus, obteve 90,91% e 88,80% de eficácia nesses dois critérios, respectivamente, enquanto o Delta-S1-ELISA, que utiliza um outro fragmento da Spike, apontou uma sensibilidade de 77,27% e uma especificidade de 76%.
“Mostramos que os testes são eficazes em uma época em que não havia vacinas. Logo, os pacientes não tinham como produzir anticorpos a não ser pela infecção. Isso dá mais assertividade aos resultados. E obtivemos resultados tão bons com o teste N-ELISA que conseguimos imaginá-lo sendo utilizado comercialmente no futuro. Por adotar uma proteína que é utilizada comercialmente, diferente dos nossos outros dois testes, o caminho é potencialmente menos longo”, destaca Robert Andreata-Santos, doutor em microbiologia pelo ICB e primeiro autor do estudo.
Além disso, os testes RBD-ELISA e N-ELISA talvez possam, no futuro, ser usados para diferenciar se o anticorpo foi criado pela vacinação ou pela infecção. “Ser eficaz na detecção de anticorpos contra a proteína RBD, que está presente em todas as formulações vacinais atuais, como também contra a proteína N, relacionada com casos de exposição ao coronavírus, indica que em estudos futuros haverá a possibilidade de diferenciar anticorpos produzidos contra a vacina ou contra a infecção quando utilizados ambos os testes”, afirma Robert Andreata-Santos.
Padrão ouro de análise – Todos os exames foram validados contra o próprio coronavírus por meio do teste de neutralização, considerado o padrão ouro para esse tipo de análise. O soro sanguíneo foi aplicado no teste para distinguir quais amostras neutralizavam e quais amostras não neutralizavam o SARS-CoV-2, sendo que as amostras neutralizadas eram consideradas positivas para Covid-19. Em seguida, esses resultados foram comparados com os resultados dos testes ELISA.
“Utilizamos o padrão ouro porque ele consegue ter sensibilidades e especificidades elevadas já que é capaz de calcular a carga de anticorpos neutralizantes do paciente”, afirma Machado. “Além disso, como o SARS-CoV-2 foi neutralizado, a possibilidade de os anticorpos criados em virtude da infecção pelo coronavírus ou por outro patógeno apresentarem reação cruzada é extremamente reduzida”, complementa Andreata-Santos.
O método também é capaz de identificar se um anticorpo é neutralizante (pode impedir novas infecções), ou se é um anticorpo apenas de ligação (só reconhece uma região do vírus). Desta forma, a metodologia elimina quase todas as dúvidas que podem surgir a respeito dos dados de eficácia dos testes ELISA.
Colaboração extensa – Para realizar todo esse trabalho, foi necessária uma colaboração extensa de profissionais da Universidade. Os docentes Paulo Margarido, Ricardo Fock e Juliana Bannwart, do Hospital Universitário, foram responsáveis pela coleta do soro e avaliação das amostras por Elecsys. Na execução, no processamento e na análise dos testes de neutralização houve a colaboração de diversos laboratórios do ICB. Em suas respectivas competências, contribuíram os grupos de trabalho coordenados pelos docentes Luís Carlos de Souza Ferreira, Edison Luiz Durigon, Silvia Beatriz Boscardin e Cristiane Rodrigues Guzzo.
Com isso, a pesquisa contou com o financiamento de diversas agências de fomento, de forma direta (disponibilizando verba específica para a execução do projeto) ou indireta (dispensando bolsas para bancar a permanência dos pesquisadores nos laboratórios, independente do projeto). Contribuíram com o trabalho a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).