O Instituto Butantan de São Paulo deu mais um passo na busca por uma descoberta que possa ser eficaz no combate ao Alzheimer. Desta vez, os pesquisadores apostam em uma substância extraída da pescada (merluccius productus), seguindo uma tradição, a instituição pesquisa espécies aquáticas há 27 anos, principalmente em sua plataforma científica voltada ao estudo do peixe paulistinha (peixe-zebra).
Desta vez, em parceria entre o instituto e a Universidade São Francisco (USF), os pesquisadores Bianca Cestari Zychar (responsável pela plataforma de Microscopia Intravital), Luís Roberto Gonçalves (diretor do Laboratório de Fisiopatologia) e Juliana Mozer Sciani (bióloga e orientadora colaboradora do do Programa de Pós-Graduação em Toxinologia do Butantan e da USF) descobriram que uma proteína encontrada na pescada é capaz de inibir a principal enzima causadora da doença, a BACE-1.
O grupo de pesquisadores inicia agora estudos mais detalhados, como testes em animais com Alzheimer, para comprovar segurança e eficácia, para depois dar continuidade aos estudos clínicos.
O Alzheimer é uma doença neurodegenerativa multifatorial que mais afeta os idosos. E representa, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 70% dos casos de demência no mundo, com 40 milhões de pessoas afetadas.
Atualmente, existem dois grupos de medicamentos aprovados para tratar o Alzheimer, que ajudam a aumentar a expectativa de vida e a aliviar sintomas e causar efeitos adversos, como náuseas, diarreia, alergias, perda de apetite, dor de cabeça, confusão, tontura e quedas. de acordo com o Instituto Nacional sobre Envelhecimento (NIA) dos Estados Unidos. Nenhum deles cura a doença.
A pescada já era estudada no instituto para outros fins, e o que motivou os pesquisadores foi um estudo asiático sobre os peptídeos da espécie realizado em 2019 e disponibilizado em banco de dados. Peptídeos são biomoléculas formadas pela ligação de dois ou mais aminoácidos.
Em testes in vitro, com neurônios afetados pelo Alzheimer, o peptídeo modificado bloqueou a atividade da enzima BACE-1. Em testes em animais, conseguiu atingir os cérebros dos modelos.
“O peptídeo reduziu a quantidade de beta-amilóides, proteínas tóxicas responsáveis pela doença, mostrando-se um bom candidato ao tratamento”, explica a bióloga Juliana, que trabalha com substâncias de animais marinhos há mais de 10 anos.
Juliana foi responsável por fazer modificações na sequência do peptídeo e simulações, utilizando ferramentas de bioinformática, até chegar à versão com maior potencial contra BACE-1.
O estudo demonstrou que o peptídeo possui alta estabilidade e possibilidade de atingir o alvo, além de ser seguro e sem toxicidade.
Os testes em animais saudáveis foram realizados no Butantan. Duas horas após a administração do composto, ele atingiu o cérebro. Passou pelos pulmões, pâncreas, baço e fígado (onde foi metabolizado), mas não se acumulou em nenhum órgão.
Seis horas depois, o peptídeo concentrou-se no rim para ser eliminado pela urina. Todos os órgãos estavam intactos e sem sinais de inflamação ou danos celulares.
“O estudo se chama farmacocinética e mostra como a substância se movimenta no organismo. Por que tomamos alguns remédios a cada 6 horas e outros a cada 12 horas, por exemplo? Porque foi feita uma análise de como o medicamento está distribuído no organismo, para saber quanto tempo leva para fazer efeito e quanto tempo para sair”, destaca Bianca.
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