Pesquisadores da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp desenvolveram projeto para a construção de um destilador molecular centrífugo de alto desempenho nacional. O equipamento permite a obtenção de produtos de alto valor agregado, a partir de fontes naturais, geralmente termossensíveis, para a fabricação de medica-mentos, cosméticos e produtos alimentícios. As empresas que o utilizam precisam importá-lo da Alemanha ou dos Estados Unidos. Um equipamento para processamento da ordem de150 a 300 kg/h custa em torno de 600 mil dólares, preço que poderá cair pela metade com a nacionalização.
Frutas, sementes, raízes ou outras partes de plantas contêm componentes bioativos que podem ser utilizados para diferentes aplicações comerciais. Conforme a destinação, tornam-se necessários processos industriais sofisticados para extração das matérias-primas naturais.
O óleo extraído do dendê, tradicional ingrediente da cozinha regional brasileira, contém alta concentração de betacaroteno (pró-vitamina A), empregado na formulação de cosméticos, medicamentos homeopáticos e filtros solares. Os tocoferóis (vitamina E e antioxidante natural) e os fitoesteróis (capazes de inibir a absorção e acúmulo de colesterol no organismo) são encontrados em subprodutos do refino de óleos comestíveis, como ode soja, e são amplamente utilizados em margarinas ou como antioxidantes em produtos de beleza. O óleo de algodão, por exemplo, pode ser utilizado para a produção de monoglicerídios, usados pela indústria alimentícia como emulsificante.
Os vegetais não são, contudo, as únicas fontes dessas ricas substâncias: da gordura gerada no beneficio da lã de ovelha pode-se obter álcoois de lanolina, matéria-prima para a indústria de cosméticos.
PROCESSO
A extração desses componentes bioativos pode ser realizada pelo processo de destilação molecular. O equipamento, quer pela ação da força centrífuga, quer pela ação da gravidade (processo denominado filme descendente), separa moléculas complexas, como as vitaminas, de misturas obtidas a partir de fontes naturais.
O processo, que envolve, basicamente, as etapas de evaporação e condensação do material destilado, ocorre em câmaras a vácuo, que permitem às moléculas se desprenderem da mistura e se movimentarem de um extremo ao outro do destilador para formar o concentrado ou o destilado vitamínico final.
Há situações em que se pode destilar, simultaneamente, até duas frações de interesse comercial distintas, observa a professora e fundadora do Laboratório de Desenvolvimento de Processos de Separação (LDPS) da FEQ, Dra. Maria Regina Wolf Maciel, coordenadora da equipe de 12 pesquisadores envolvidos nessa linha de pesquisa, entre alunos de graduação, de pós-graduação e de pós-doutorado. Exemplo: além do betacaroteno, extrai-se do óleo de dendê o biodiesel, um substituto potencial do óleo diesel tradicional, e já há estudos em andamento no LDPS para obtenção do combustível a partir do óleo de mamona.
"A grande vantagem é poder extrair, com o destilador molecular, produtos de alto valor agregado de substâncias que, normalmente, são descartadas ou exportadas como produtos de baixo valor", enfatiza a pesquisadora, que há treze anos dedica-se ao desenvolvimento de know-how na área.
Nos casos em que o Brasil exporta matéria-prima para a produção desses insumos, há um cruel desequilíbrio comercial, lembra ela, visto que o produto retorna ao país já processado e custando muito mais caro devido ao alto valor tecnológico embutido no preço.
Baixas temperaturas - O projeto do destilador made in Brazil já recebeu financiamento da ordem de R$ 200 mil da Fapesp (Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo). Envolveu estudos exaustivos, desde o funciona-mento dos equipamentos existentes no mercado aplicados a produtos naturais, modelagem do processo até o desenvolvimento do modelo virtual "Dismol", capaz de simular, em computador, a operação do aparelho.
O empenho do grupo da Unicamp permitiu não só o domínio da tecnologia necessária para a montagem e teste de um protótipo nacional como também possibilitou o aperfeiçoamento de componentes dos sistemas disponíveis, entre os quais o condensador, revela o Dr. César Benedito Batistella, membro da equipe.
De acordo com ele, as elevadas temperaturas com que os destiladores convencionais operam podem decompor substâncias termicamente mais sensíveis, como álcoois de lanolina e essências derivadas da agroindústria, inviabilizando o processo produtivo.
"O melhoramento introduzido pelo grupo do LDPS vai permitir operar em temperaturas do condensador ideais para cada produto e também do evaporador significativamente mais baixas, assegurando a preservação ao máximo do material, sem prejuízo do desempenho da destilação", esclarece o pesquisador.
A pesquisa da Unicamp já atraiu o interesse de grupos nacionais e estrangeiros, e o assunto vem merecendo divulgação em papers internacionais. A montagem e teste do protótipo, próximas etapas do trabalho, aguardam, agora, a liberação de recursos da ordem de R$ 80 mil e o desenvolvimento de fornecedores nacionais para os componentes. Os pesquisadores esperam alcançar um índice de quase 100% na nacionalização do equipamento e baratear seu custo em cerca de 50%.
Notícia
Jornal da Unicamp