Uma prova robusta da existência de matéria escura na região compreendida entre o Sistema Solar e o centro da Via Láctea foi obtida pelo pesquisador Fabio Iocco, do Instituto de Física Teórica (IFT) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e do Instituto Sul-Americano de Pesquisa Fundamental (ICTP-SAIFR). O artigo Evidence for dark matter in the inner Milky Way, assinado por Iocco e colaboradores, que relata o estudo, foi publicado no site da revista Nature Physics nesta segunda-feira (09/02).
“Obtivemos essa evidência medindo a rotação de nossa galáxia com grande precisão. Por meio da rotação, calculamos sua atração gravitacional. E, a partir da atração gravitacional, chegamos à massa. A massa calculada é maior do que aquela constituída apenas pela matéria luminosa (estrelas e gás). A diferença de massas indica a existência de outro componente material na região, a chamada matéria escura”, explicou Iocco à Agência FAPESP.
Iocco é italiano e está no Brasil com bolsa do programa Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes e Auxílio à Pesquisa do mesmo programa.
A hipótese de existir no Universo uma forma desconhecida de matéria – denominada matéria escura pelo fato de sua presença jamais ter sido detectada de maneira direta pelas observações astronômicas – foi formulada nos anos 1970, quando a rotação de gases em torno dos centros de galáxias espirais passou a ser calculada com alta precisão.
Essa medição, no entanto, é difícil de ser feita na Via Láctea pelo fato de estarmos inseridos nela, a aproximadamente meia distância entre a periferia galáctica e seu centro.
“Devido a tal condição, foi, ao longo de todos estes anos, um grande desafio medir a rotação do gás e das estrelas com a precisão necessária. Tal medição é especialmente difícil na região compreendida entre o Sol e o centro da galáxia, onde as estrelas e o gás estão muito concentrados e, assim, contribuem mais para o montante de massa”, disse Iocco.
“Tivemos que compilar dois enormes conjuntos de dados”, detalhou o pesquisador. “De um lado, os indicadores do potencial gravitacional total, da chamada curva de rotação: estrelas, gás e masers [fontes de emissão eletromagnética]. Para isso, compilamos todos os dados registrados na literatura desde os anos 1960. De outro lado, tínhamos a distribuição da matéria visível. Neste caso, como não há, na literatura, pleno acordo sobre a estrutura morfológica da galáxia, levantamos os dados de todos os modelos existentes, em vez de correr o risco de optar pelo modelo errado”.
Segundo Iocco, nenhum desses conjuntos de dados relativos à distribuição da matéria visível é compatível com a curva de rotação calculada. “Esta é uma das razões pelas quais estamos tão seguros de termos provado a existência da matéria escura na região, inclusive dentro do Sistema Solar”, disse.
A composição da matéria escura já foi objeto de muita especulação. Mas o pesquisador prefere não expressar opinião a respeito.
“Isso é algo que não pretendemos responder em nosso artigo. Aliás, nem supusemos a existência de qualquer tipo de matéria escura. Tal evidência veio como resultado dos cálculos. Algum tipo de matéria (isto é, algo que exerça atração gravitacional) e escura (não bariônica, não compacta) deve existir. Os resultados de nossos próximos estudos que empregam os mesmos dados deverão dar respostas mais precisas à distribuição da matéria escura e isso poderá ajudar a determinar a natureza desse componente material, por meio de detecção direta ou indireta”, completou.
Fabio Iocco nasceu em Nápoles, na Itália, e graduou-se na mesma cidade, na Universidade Federico II, onde obteve também seu PhD. Durante o doutorado, permaneceu três anos como pesquisador visitante na Universidade de Stanford, na Califórnia, Estados Unidos. De volta à Europa, trabalhou no Observatório Arcetri, em Florença, Itália, e, depois, em Paris, Estocolmo e Madri, antes de vir para São Paulo.
O artigo Evidence for dark matter in the inner Milky Way (doi 10.1038/nphys3237), de Iocco e colaboradores, pode ser lido no site da Nature Physics em http://www.nature.com/nphys/journal/vaop/ncurrent/full/nphys3237.html
Agência FAPESP