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Jornal da Tarde

Pesquisa revela perfil do idoso em SP

Publicado em 01 julho 2003

Por ARYANE CARARO
Mulher, com pouco estudo, aposentada, proveniente do meio rural, que trabalhou em atividades predominantemente braçais e é dependente de medicamentos. Esse é o retrato do idoso paulistano, de acordo com pesquisa realizada pela Faculdade de Saúde Pública e apresentada ontem a pessoas que trabalham com a questão dos idosos. Descobriu-se o que muitos já sabiam: "a velhice é feminina", como definiu a coordenadora Maria Lúcia Lebrão. Mas alguns dados surpreenderam os pesquisadores. "Desconhecíamos o grande número de analfabetos e de pessoas que viveram no campo e tiveram acesso deficitário à escola, saúde e vacinação", diz ela. De um universo de 2.143 pessoas, um em cada cinco idosos não sabe ler e escrever, 60% têm no máximo sete anos de estudo e 63% viveram no campo pelo menos por cinco anos. O estudo, feito em 2000 com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), estabelece o perfil da terceira idade na América Latina e no Caribe. Além do Brasil, sete países participaram do levantamento: México, Barbados, Chile, Uruguai, Argentina, Cuba e Costa Rica. "Só tínhamos pesquisas do idoso europeu e americano. Mas nosso velho não é esse que envelheceu em condições melhores e sim o que sobreviveu às adversidades", explica Yeda Duarte, professora da Escola de Enfermagem, que ajudou no estudo. As mulheres são a maioria, com 58% dos cerca de 1 milhão de idosos que vivem em São Paulo. Para cada 100 homens, há 142 mulheres na terceira idade. O número sobe no universo dos que têm 75 anos e mais - vai para 179 ante 100. Cidade do México, por exemplo, tem 129 idosas para cada 100 idosos. "Esperamos que esses dados sirvam de base para políticas públicas", diz Maria Lúcia. Foi por causa do aumento de idosos, e da falta de estrutura para atendê-los, que a pesquisa foi feita. Em 2000, América Latina e Caribe possuíam 42 milhões de pessoas com 60 anos (8% da população). Em 2020, a expectativa é que tenha 82 milhões de idosos - 2 milhões só em São Paulo. Segundo o secretário municipal de Saúde, Gonzalo Vecina Neto, é preciso investir em prevenção e qualidade de vida. "Se nosso objetivo é tomar conta de doenças e doentes, já estamos fracassados." Para Maria Lúcia, é preciso que o governo promova programas de assistência. Segundo ela, mulheres que antes prestavam assistência a idosos em suas famílias estão ingressando progressivamente no mercado de trabalho. "Quem vai cuidar deles?", questiona ela, que defende a criação de centros de convivência para idosos passarem o dia. Não por acaso, 70% deles não recebem ajuda de ninguém nas atividades diárias, por mais que precisem. Além disso, 13% vivem só. "O governo tem que substituir essas mulheres que ficavam em casa." Em meio a tantas notícias ruins, uma boa: o idoso paulistano é solidário: 27% deles desenvolvem alguma atividade voluntária. 'O MAIS DIFÍCIL É A SOLIDÃO' Desde que o marido morreu, há quatro anos, e o filho de 26 anos foi assassinado, a aposentada Dulce Diva Ramos, de 61 anos, mora sozinha em uma casa no Itaim Paulista, zona leste. "O mais difícil é a solidão", diz Dulce que para passar o tempo ouve rádio, vê televisão e faz tricô. Com o dinheiro da aposentadoria ela diz que "consegue viver". Ela também freqüenta um grupo da terceira idade para ficar por dentro dos seus direitos. "Não é que eu seja uma pessoa sozinha. Minhas duas filhas moram na mesma rua que eu e se precisar até posso pedir ajuda." Dulce diz que, apesar dos preconceitos contra idosos, ela não se intimida. Assim como a aposentada, Ivone Sanches Fiorlino, de 72 anos e seu marido da mesma idade moram em um cômodo com cozinha no bairro de Cangaíba, zona leste. O casal vive com a aposentadoria e tem de se virar para comprar comida e manter a casa. "Estou fazendo tratamento de anemia e preciso tomar remédios caros." Para isso, Ivone recorre aos postos de saúde, mas nem sempre consegue os remédios grátis. "Quando não me dão nos postos, o jeito é não tomar", lamenta ela, que admite a dificuldade de ser aposentada. "Não sei mais o lugar em que o atendimento é pior."