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Diário do Nordeste online

Pesquisa investiga uso de canabidiol para reduzir sintomas de depressão

Publicado em 30 agosto 2018

Os antidepressivos comerciais costumam demorar de duas a quatro semanas para promover efeitos significativos em pacientes deprimidos. Além disso, tais drogas são ineficazes em boa parte dos casos. Encontrar novos antidepressivos de ação rápida e duradoura é o objetivo de uma investigação colaborativa conduzida por cientistas brasileiros e dinamarqueses.

Eles observaram em estudo que uma única aplicação de canabidiol em ratos com sintomas depressivos apresentou efeitos significativos, com remissão de sintomas de depressão no mesmo dia e a manutenção dos efeitos benéficos por uma semana.

O trabalho reforça estudos anteriores de que o canabidiol, um componente da maconha (Cannabis sativa), tem potencial terapêutico promissor no tratamento da depressão de amplo espectro em modelos pré-clínicos e humanos.

Equipe

Resultados foram publicados em artigo na revista Molecular Neurobiology por pesquisadores do grupo liderado por Sâmia Regiane Lourenço Joca, professora na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FCFRP-USP).

A pesquisa, que teve como primeira autora Amanda Juliana Sales, bolsista de doutorado da FAPESP, também contou com o apoio da Fundação por meio de um Projeto Temático, do CNPq e da dinamarquesa Aarhus University Research Foundation.

As pesquisas com canabidiol estão ligadas ao grupo do professor Francisco Silveira Guimarães, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP. Participa ainda Gregers Wegener, professor no Departamento de Clínica Médica da Aarhus University.

"O Brasil é pioneiro no estudo do canabidiol e hoje é muito diferente do que há 30 anos, quando começamos a investigar essa substância. Na época, enfrentávamos preconceito por causa da associação com a maconha", disse Guimarães.

Efeitos psicotrópicos

Apesar de extraído da maconha, Guimarães ressalta que o canabidiol não produz dependência nem efeitos psicotrópicos. “A substância na maconha responsável por tais efeitos é o tetraidrocanabinol (THC) e com o canabidiol ocorre o oposto, ele exerce ação bloqueadora sobre alguns efeitos do THC”, disse.

A investigação dos efeitos do canabidiol visa encontrar fármacos com potencial antidepressivo que atuem mais rapidamente no tratamento, diminuindo o período de latência observado nos antidepressivos convencionais.

Guimarães observa que os antidepressivos disponíveis obtêm resultados em cerca de 60% dos pacientes, de modo que cerca de 40% dos pacientes permanecem sem receber o tratamento adequado, mesmo após tentarem diversas opções por vários meses. “Isso revela a necessidade de encontrarmos novos tratamentos, com melhor potencial terapêutico”, disse.

Recuperação de circuitos neurais

A conclusão do trabalho foi que o tratamento com canabidiol induz efeitos rápidos e sustentados, que permanecem por até sete dias após uma única administração, em animais submetidos a diferentes modelos de depressão (incluindo modelos de estresse e modelos de susceptibilidade genética).

"Ao estudar os mecanismos envolvidos nesses efeitos, observamos que o tratamento com canabidiol induz rápido aumento dos níveis de BDNF [fator neurotrófico derivado do cérebro], uma neurotrofina importante para a sobrevivência neuronal e neurogênese, que é o processo de formação de novos neurônios no cérebro. Também foi observado no córtex pré-frontal dos animais o aumento da sinaptogênese, que é o processo de formação de sinapses entre os neurônios do sistema nervoso central”, disse Sâmia Joca.

Segundo ela, caso o resultado do estudo do uso de canabidiol em ratos venha a ser também observado em humanos, uma vez que o canabidiol já é usado em humanos para outros problemas de saúde, "pode resultar em avanço importante no tratamento da depressão, com possibilidade de ajudar pacientes que sofrem por semanas, muitas vezes com risco de suicídio, até que o tratamento funcione".