Pesquisa conduzida pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) pode levar a criação de uma das primeiras patentes na área médica para uma tribo indígena. À procura de novos fármacos para doenças que afetam o sistema nervoso central, o Centro Brasileiro de informações sobre Drogas (Cebrid), da Unifesp, mapeou mais de 150 plantas utilizadas em rituais de cura na longínqua aldeia dos krahô, no Estado do Tocantins. A Unifesp busca agora parcerias com grandes laboratórios para financiar a pesquisa com os fitoterápicos. "É uma grande oportunidade para a indústria brasileira", afirma Elisaldo Carlini, coordenador do projeto e diretor do Cebrid. O Achê, laboratório localizado em Guarulhos, está em negociação com a Unifesp. "É um grande filão e uma chance de o Brasil se recuperar na área da pesquisa de fitoterápicos", diz o gerente de relações institucionais do Achê, Antônio Carlos de Almeida.
A pesquisa com os krahô começou há cerca de dois anos com o trabalho de campo da bióloga Eliana Rodrigues, que contou com a orientação de Carlini. Neste período, ela visitou mais de dez vezes a tribo e catalogou as espécies de plantas utilizadas por xamãs -curandeiros - em rituais de cura entre os índios. Após a coleta, o Instituto de Botânica do Estado de São Paulo identificou 164 espécies vegetais da floreta brasileira utilizadas com fins medicinais.
Entre as plantas nativas, algumas têm a fama de aumentar a resistência física e são utilizadas pelos krahô em competições nas quais carregam toras nas costas. Outras têm o poder alucinógeno. '"Aparentemente, essas plantas podem curar patologias ou modificar o comportamento, às vezes de humor e cognição", afirmou Carlini. O pesquisador afirma que o projeto pode levar a descoberta de uma droga poderosa. "Podemos descobrir algum medicamento contra o mal de Altzaimer."
O professor na Unifesp afirmou que o material coletado renderia pesquisa para um período de 20 anos. Para direcionar os estudos, os pesquisadores criaram cinco categorias de interesse: analgésicos, controladores de peso; as que atuam sobre a memória, as hipnóticas/ansiolíticas: adptógenas (que aumentam a resistência física). Sete pesquisadores/doutores compõem a equipe. Até o processo final de um eventual medicamento, cada planta pesquisada vai demandar recursos da ordem de R$ 2 milhões em um período de cinco anos. "Se comparado com os investimentos feitos pelos grandes laboratórios multinacionais, este investimento é uma pechincha", afirmou Carlini.
Para preservar os direitos indígenas, a Unifesp mantém o nome científico das plantas e seu possível uso terapêutico em sigilo, pois a informação poderia ser aproveitada indevidamente por laboratórios farmacêuticos e outros grupos de pesquisa interessados em eventuais dividendos econômicos do levantamento já feito.
O coordenador da pesquisa afirmou que unia eventual patente deve ser divida em partes iguais entre os índios, a universidade e o laboratório. A indústria farmacêutica que se interessar a financiar o projeto terá que obrigatoriamente reproduzir as plantas na própria aldeia dos krahô. "Isso terá que constar do contrato'" afirmou. O advogado Dalmo Dalari irá cuidar para que os krahô tenham seus direitos preservados.
A tribo foi alvo da pesquisa por freqüentar uma região que quase não tem contato com a medicina tradicional. A aldeia fica a 12 horas de carro da cidade mais próxima no norte do Tocantins. A região, que fica no cerrado, é a que menos tem merecido estudo dos pesquisadores. Por isso, a Unifesp decidiu buscar na localidade a base para novos medicamentos.
Cirande parte dos fitoterápicos usados pelos krahô são tomados na forma de chás. Parte dos vegetais também pode ser aplicada sobre o corpo dos pacientes ou utilizadas para preparar cigarros, banhos ou inalações. Plantas, folhas e raízes também podem ser consumidas pelos indígenas.
Notícia
Gazeta Mercantil