No portfólio de produto, lupas que ajudam a ampliar não só textos e imagens como também abrem um mundo de novas descobertas para quem enxerga com dificuldade. Um dos primeiros, considerado o principal no inicio da empresa, é a prancha de leitura com lupa. Um equipamento inovador no cenário mundial que tem dois elementos básicos: uma lupa e um conjunto de trilhos metálicos. Uma forma de permitir movimentação para leituras horizontais. O deslizar em cima da prancha é voltado para deficientes visuais leves. É neste mercado que a Bonasion investe pesado. Um empresa que nasceu no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia, uma incubadora situada dentro da Cidade Universitária da USP, em São Paulo.
História que começou na década de oitenta quando Fernanda Bonatti se formou em medicina e em seguida fez residência em otorrinolaringologia. Na mesma época, José Américo Bonatti se especializou em oftalmologia e anos mais tarde se tornou doutor na área. Casal de apaixonados por pesquisa, mas que quis colocar em prática projetos feitos na academia. O pontapé inicial veio em 2004, quando Fernanda se formou na segunda graduação, dessa vez em Arquitetura e Urbanismo. Curso com currículo amplo e uma das disciplinas foi o design. O trabalho de Conclusão de Curso foi feito baseado nas duas formações e desenvolveu um equipamento para deficientes visuais. “Convivia com meu avô, que era deficiente visual, e percebia que os produtos destinados a esse público eram sempre os mesmos, isto é, havia espaço para 'invenções', para o desenvolvimento de produtos que atendessem melhor às necessidades dessas pessoas”, recorda.
A prancha de leitura com lupa foi aprovada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, a Fapesp. Em paralelo, um outro produto foi desenvolvido, a lupa de apoio. Os empreendedores tinham uma ideia, um mercado a ser explorado, o local de trabalho, o apoio financeiro, só faltava o CNPJ e o inicio da produção. Pendências fáceis de resolver. Fernanda conta que desde que a Bonavision iniciou as atividades no inicio de 2005, está colocando no mercado brasileiro cerca de um produto por ano. “Todos eles com características inovadoras, sempre pensando no tripé: qualidade técnica associada à durabilidade, segurança e atendimento dos requisitos desejados. A ergonomia é outro ponto fundamental para a usabilidade dos produtos e, por fim, o design, já que os produtos para deficientes podem ter alta qualidade estética e serem bonitos”, explica.
INOVAÇÃO CONSTANTE
Se a inovação foi o que norteou a criação da Bonavision, o lema se repetiu ao longo dos anos. Manter o foco em produtos que se diferenciem dos demais produzidos no mercado foi a forma encontrada pelos empreendedores para crescer. A concorrência é grande, tanto de produtos nacionais quanto de importados, porém, para Fernanda, poucos itens são realmente inovadores. “As empresas nacionais não inovam, praticamente copiam os produtos importados. A nossa estratégia é criar, sempre com muita pesquisa feita com os usuários e profissionais que lidam com os deficientes visuais, tais como os médicos oftalmologistas, os ortoptistas (perito na avaliação da função binocular e do funcionamento visual, da reabilitação dos distúrbios da binocularidade e da deficiência visual), além de professores”, afirma.
MUDANÇAS
A formatação do negócio se adaptou conforme o crescimento. Na visão da empreendedora, uma empresa pequena tem suas vantagens, dentre elas, está a capacidade de mudar rapidamente quando necessário. “Procuramos sempre aperfeiçoar os produtos ao longo do tempo. Às vezes, uma pequena mudança faz uma diferença importante para o usuário. É preciso ficar sempre atento às necessidades desta pessoa, que podem ser expressas claramente por ela ou então obtidas por meio da observação em pesquisas”, justifica Fernanda. Atualmente a empresa continua como associada ao Cietec, mas não recebe mais o nome de “incubada”. Agora a Bonavision é “graduada”. É assim que são chamadas as empresas que cumprem todas as fases de incubação. Processo que foi de extrema importância para o casal Bonatti. “Eu e meu marido viemos do meio acadêmico e científico e não tínhamos experiência com o mundo empresarial”, diz Fernanda que recebeu cursos de gestão empresarial, formação de preços e marketing, além de consultorias com profissionais do próprio Cietec e com os parceiros, como o SEBRAE.
A palavra-chave para os bons resultados obtidos pela empresa é a “sinceridade”. O envolvimento com o cliente é verdadeiro e personalizado. “Ficamos sinceramente felizes quando constatamos que o produto cumpriu o seu objetivo, o seu propósito”, diz ela.
A verdadeira sensação de dever cumprido vem quando Fernanda e o sócio observam a alegria de uma criança ao desenhar uma bonequinha e sorrir ao ver o resultado na tela. Outro momento de orgulho é ouvir de um idoso que agora ele consegue ler os livros prediletos, resolver palavras cruzadas ou conferir a conta de água sem ter que pedir a ajuda do porteiro do prédio. Situações que para muitos podem parecer rotineiras, mas para quem enxerga com dificuldade, são uma realização pessoal. Todos os clientes gostam de sinceridade e, por isso, a ordem é sempre orientar para a compra de produtos que sejam adequados de acordo com o parecer de um oftalmologista. “Preferimos esclarecer todas as dúvidas antes da compra. É mais fácil do que ter de receber um produto de volta porque não serviu”, analisa Fernanda.
LOGÍSTICA
A produção é praticamente toda terceirizada. Os projetos e o desenvolvimento são feitos internamente. Os fornecedores escolhidos a dedo colocam em prática e, por fim, a Bonavision faz o controle de qualidade. Estrutura adequada às características: empresa pequena, produção intermitente, escala baixa e planejamento minucioso de cada detalhe. Os planos para o futuro não param, mas o que não muda é a vontade dos empreendedores em não perder a vocação científica. Esta característica influencia o rumo da empresa e as escolhas. “Embora o Brasil tenha um número considerável de pesquisadores que publicam artigos científicos relevantes no meio acadêmico internacional, é desejável que essas pesquisas não fiquem somente na fase de publicação. É preciso, quando for possível, que elas se revertam em produtos, em benefícios concretos para a sociedade”, explica Fernanda que completa: “É esse o conceito de ‘ciência aplicada’, e é isso que nós fazemos e pretendemos continuar a fazer no futuro."