Uma pesquisa realizada no Laboratório de Bacteriologia do Instituto está estudando o desenvolvimento de uma vacina em aerossol contra infecções de pneumonia. Desenvolvida por dois pesquisadores, Elaine Miyaji e Tasson Rodrigues, a vacina busca proteger de infecções pela bactéria pneumococo (Streptococcus pneumoniae), causadora de pneumonia bacteriana, otite, meningite e sepse, entre outros quadros. O imunizante é considerado de baixo custo por ser o único contra o pneumococo testado na forma inalatória, sem a necessidade de uso de refrigeração e agulhas. Sua formulação mais simples também reforça o princípio de ser uma vacina barata de produzir, comparada às já disponíveis.
“As formulações atuais são bem caras e complexas e têm proteção específica para alguns sorotipos. A ideia dessa vacina é que isso não ocorra, porque é uma vacina independente de sorotipo e com custo menor por não ter necessidade de purificar cada polissacarídeo dos diferentes sorotipos separadamente”, afirma a pesquisadora do Laboratório de Bacteriologia do Instituto Butantan Eliane Miyaji.
A candidata vacinal é composta por nanopartículas contendo proteínas do pneumococo, composição diferente das vacinas pneumocócicas conjugadas (VPCs), compostas por polissacarídeos de diferentes sorotipos do pneumococo conjugados com proteínas; e das vacinas polissacarídicas (VPPs), que contêm polissacarídeos livres do pneumococo em sua composição. “Enquanto as VPCs e VPPs são focadas em polissacarídeos, que são açúcares, e bastante variáveis, nós focamos em proteínas de superfície do pneumococo que, em tese, são mais conservadas. Essa é uma outra forma de desenvolver uma proteção contra o pneumococo sem depender da inclusão de polissacarídeos de diferentes sorotipos”, explicaram os pesquisadores.
Embora as vacinas atualmente disponíveis sejam bastante eficazes contra a doença pneumocócica invasiva, o uso delas tem levado a uma substituição dos sorotipos prevalentes na população, causando um aumento da incidência de doenças pneumocócicas por sorotipos não incluídos nas formulações vacinais.
Atualmente, o Brasil tem disponível quatro vacinas conjugadas (VPC) que previnem de 10, 13, 15 e 23 sorotipos de pneumococo, sendo que existem mais de 100 sorotipos. Neste sentido, a vacina em aerossol vem como uma possível forma de aumentar a cobertura se comparada às CPCs e VPPs, ou seja, se a hipótese da pesquisa se comprovar, será possível ter uma maior cobertura contra pneumococos sem depender da necessidade da inclusão de mais sorotipos a cada nova composição.
A versão em aerossol teria outra vantagem sobre as demais vacinas: ela atingiria diretamente os pulmões, formando uma barreira contra a bactéria já no local de entrada do organismo.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a pneumonia é a maior causa de morte por doenças infecciosas entre crianças menores de cinco anos, sendo responsável por 14% das mortes nesta faixa etária. Diferentes microrganismos podem causar pneumonia e o pneumococo é responsável por mais da metade dos casos mais graves.
O estudo, feito em parceria com a Liverpool John Moores University (LJMU), do Reino Unido, foi desenvolvido em etapas. Na primeira, Tasson e a equipe do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Butantan produziram os antígenos proteicos. Na segunda, as proteínas foram levadas para o Reino Unido pelo então estudante de pós-graduação, que trabalhou na produção de lipossomos – tipos de nanopartículas formadas por lipídeos arranjados em camadas duplas que formam uma espécie de esfera envolvendo os antígenos – no laboratório do professor de Nanomedicina da Escola de Farmácia e Ciências Biomoleculares da LJMU, Imran Saleem.
A pesquisa da vacina em aerossol do Laboratório de Bacteriologia foi a base do trabalho “Formulação de vacina pulmonar nanoparticulada baseada em lipossomos contendo antígenos proteicos de Streptococcus pneumoniae”, apresentada pelo farmacêutico Tasson Rodrigues no doutorado do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Biotecnologia da Universidade de São Paulo (USP), Instituto Butantan e Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). O estudo, orientado por Eliane Miyaji, venceu o “Prêmio Tese Destaque da USP – 13ª Edição” na categoria Interdisciplinar em novembro de 2024. Tasson também recebeu o prêmio Robert Austrian Research Award in Pneumococcal Vaccinology em 2022.