O(a) senhor(a) vai querer sacola? A resposta a essa pergunta, para o bem do planeta e de toda a sociedade, tem que ser – “não, obrigado(a)”.
Há no mundo, hoje, uma infestação de produtos plásticos e as “sacolinhas inocentes” que recebemos nos supermercados contribuem bastante para isso. Todavia, questiono: a culpa dessa situação seria apenas dos consumidores?
Derivadas do petróleo, mais especificamente do polietileno, as sacolinhas passaram a fazer parte da nossa vida a partir das décadas de 1940/50. Desde então, elas invadiram todos os espaços: praças, prédios, parques, rios, lagos, mares e oceanos, nenhum ambiente está livre delas.
Segundo informações da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos “são consumidos entre 500 bilhões e 1 trilhão de sacos plásticos ao redor do mundo. Destes, menos de 1% é reciclado, pois a reciclagem de sacos plásticos possui custos elevadíssimos”.
Portanto, aquilo que, ao surgir, foi considerado como símbolo de modernidade, praticidade e evolução tecnológica, se revelou, em menos de cem anos, um problema de difícil solução.
Há toda uma cadeia produtiva por detrás da “inocente sacolinha plástica do supermercado”. E não se trata de uma simples cadeia produtiva ou de uma indústria qualquer. Trata-se da cadeia produtiva liderada pela poderosa indústria petroquímica.
A gênese do processo de produção dessas embalagens e de todos os outros produtos plásticos está nessa indústria. Muitas pessoas não sabem disso ou não querem discutir essa questão a partir do ângulo da produção.
A parte que realmente aparece nas discussões, de todo o processo produtivo, é a parte final, em que estão os plásticos descartados; justamente aquela que responsabiliza o consumidor.
Noutras palavras, somos nós que, por termos hábitos consumistas, sem consciência, contribuímos, pelo descarte, para a produção de lixo e, consequentemente, para a poluição ambiental.
Ao assistir o documentário estadunidense The Story of Plastic, que faz parte do movimento Project Story of Stuff (Projeto História das Coisas) e é dirigido por Deia Schlosberg, pude ver pela primeira vez uma abordagem diferente acerca da questão dos plásticos.
No documentário, há uma linha do tempo que mostra todas as fases do processo produtivo que, por certo, começa na indústria petroquímica.
É interessante perceber no filme que, da extração do petróleo até a etapa de distribuição de seus derivados, nós, consumidores, não temos participação nenhuma.
Não podemos, portanto, ser os únicos responsabilizados por toda a cadeia produtiva ou por toda a tragédia ambiental causada por eles. A dura realidade de vê-los boiando nos oceanos, rios e lagos, ou sendo ingeridos por animais precisa ser, no mínimo, dividida com a indústria petroquímica.
Certamente, temos participação no processo de poluição ambiental quando consumimos deliberadamente esse tipo de embalagens plásticas sem o devido cuidado no descarte.
Nesse ponto, alguém poderia argumentar que falta um trabalho de educação ambiental e de conscientização para que a sociedade possa reduzir o consumo ou mesmo melhorar o descarte dos sacos plásticos. Isso já vem sendo feito. Todavia, não basta apenas o trabalho de conscientização, nesse caso específico, é preciso parar a produção.
É preciso entender que o capitalismo é um sistema produtor de mercadorias e que os sacos plásticos se enquadram nessa categoria. Nesse sentido, a indústria petroquímica, como dito, onde está a gênese desses itens, deseja que o consumo aumente de forma exponencial e, para isso, cria demandas desnecessárias.
À guisa de exemplo, não é verdade que os sacos plásticos sejam imprescindíveis e insubstituíveis em uma compra de supermercado ou em qualquer outro lugar. Vivíamos sem eles antes. De todo modo, o discurso e o marketing por detrás das indústrias, de certa forma, dizem que são itens imprescindíveis.
Também não é possível a produção e o consumo desenfreado tendo em mente a reciclagem como solução, visto que nem todos os materiais plásticos podem ser reciclados. A reciclagem se tornou uma espécie de “abracadabra”, de solução fácil, mas há problemas com ela também.
Yuri Vasconcelos, em matéria intitulada Planeta Plástico, publicada pela Revista Fapesp, edição 281, de julho de 2019, reproduz a fala de Gabriela Yamaguchi, diretora de comunicação e engajamento do WWF, segundo a qual:
“Não é possível enfrentar o problema olhando apenas para o pós-consumo. Há plásticos que não são naturalmente recicláveis. Polímeros aditivados e embalagens compostas, feitas de plástico e metal, muito usadas em alimentos, não são reciclados mecanicamente, assim como itens contaminados e de baixo valor”.
A reciclagem energética e a química também são problemáticas. Apesar de toda a tecnologia empregada nesses processos, há resíduos. Há também o problema do descarte da água utilizada no processo químico que, sem o devido tratamento, pode contaminar corpos d’agua, o que também vale para a queima dos resíduos para a produção de energia, que pode liberar gases tóxicos na atmosfera.
Como dito, essa é uma questão de difícil solução. Mesmo assim, entendo e defendo medidas radicais para combatê-la, ou seja, é preciso parar a produção de sacolas plásticas. Isso exigiria o retorno de sacolas reutilizáveis, confeccionadas com matérias-primas vegetais, como as fibras de juta e/ou de malva, sisal, rami, algodão etc., que são a antítese dos sacos plásticos.
As sacolas reutilizáveis e outros tipos de embalagens foram abandonadas não porque são menos práticas ou menos higiênicas, mas sim por uma demanda criada pela indústria petroquímica. Nesse sentido, não se pode discutir apenas o final do processo produtivo, quando as sacolas se tornam lixo, e culpar apenas os consumidores por isso.
Como dito, da extração do petróleo até a etapa de distribuição de seus derivados, os consumidores, não tem participação nenhuma no processo. Os sacos plásticos não são imprescindíveis, como nos fazem crer que são, a natureza, sim, é imprescindível.
Portanto, a defesa do meio ambiente e da vida como um todo perpassa pelo fim da produção de sacolas plásticas e a responsabilidade é de todos.
Foto: Fernanda Carvalho/ Fotos Públicas
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